Sete de setembro é uma data importante – tem Gre-Nal na Vila do IAPI.
Gaiatos protestarão por essa minha primeira frase, e sei por quê: porque chamei o IAPI de vila. Tempos atrás, havia pichações nas paredes cor de creme queimado dos prédios do IAPI, reclamando:
"Vila, não. Bairro!".
Tinham razão, os protestantes. O IAPI não é apenas o conjunto de prédios idealizado pelo engenheiro Edmundo Gardolinski nos anos 1940. O IAPI é uma vasta região da cidade que apanha toda a Plínio Brasil Milano da Carlos Gomes para baixo, até os fundos da Sertório. A antiga Bi-Joia e o Hospital Lazarotto ficavam na Volta do Guerino, sim, só que a Volta do Guerino está dentro do IAPI, submetida a ele. O Estádio do Zequinha é do Passo D'Areia? Decerto que sim, mas o Passo D'Areia também está dentro do IAPI, apesar do que afirmam os mapas da cidade.
Minha irmã e minha mãe sempre reclamavam, quando eu falava que morava no IAPI.
– IAPI, não: Passo D'Areia! – corrigiam elas.
Achavam que ser do Passo D'Areia era ser "fino". Por favor! Ser do IAPI é muito mais bacana. O IAPI é o primeiro condomínio da América Latina e, se você for lá hoje, para assistir ao Gre-Nal, verá que continua sendo um condomínio. É igualzinho a esses condomínios fechados, com uma única diferença: é aberto.
Vá lá nesta quinta, insisto. O Gre-Nal começa às 11h, no maior campo de várzea do Rio Grande do Sul, o Alim Pedro, onde o degas aqui dava lançamentos de 60 metros, no melhor estilo RR: Roberto Rivellino.
Contam que o maior craque que já calçou botina no Alim Pedro foi o Sérgio Kaminski, do São Paulinho. Não sei. Não vi o Kaminski jogar, mas conheço a lenda. Esse time dele foi histórico, ganhou o campeonato metropolitano e enfrentava os juniores de Grêmio e Inter de igual para igual.
Mas o que queria dizer é que, se você for ao IAPI hoje, verá uma comunidade viva, que usufrui a sombra das árvores, a pista de areia em torno do campo, as encostas do morro, as calçadas. Vá e veja, em frente ao Alim Pedro, a Biblioteca Pública Romano Reif. Li todos os livros dessa biblioteca, quando era guri.
Nesta mesma avenida eram realizados desfiles de blocos e escolas de samba durante o Carnaval. O locutor apregoava pelos alto-falantes afixados nos postes:
– Carnaval é aqui! É na Vila do IAPI!
Eu pensava: vila, não: bairro!
Seguindo à direita, você encontrará a casa em que morou Elis Regina. À esquerda, passando pela Amovi com sua cancha de areia e cimento, onde o nosso time de salão derrotou a seleção do CLJ da Igreja Nossa Senhora de Fátima, há uma escadaria famosa por homiziar jovens que precisavam de privacidade a fim de fazer coisa errada. Lá, a Alice e a Ariadne faziam coisa errada: escondiam um maço de cigarros num buraco entre os degraus. Às vezes me chamavam para vê-las fumar. Era lindo. Dava uma emoção assistir àquelas duas beldades com um cigarro entre o indicador e o dedo médio, soprando a fumaça para cima e me perguntando, com ar de rebeldia superior:
– Quer experimentar, David?
Nunca aceitei – medo de pegar câncer.
Mais acima, continuando à esquerda, tem o Bar do Comum, que é chamado assim porque... bem, é um bar comum. Mas nem tanto. Nos sábados à tarde, o Comum torna-se sede de uma roda de samba que precisa ser conhecida pelo Maurício Saraiva. Aí ele vai conhecer o que é o samba de raiz em uma vila de raiz. Vá à vila hoje, Maurício. Represente-me. Vá você também, leitor de outros bairros menos afortunados. Vá ver o Grenalzinho e sentir a vida bucólica do subúrbio, ouvir o canto dos passarinhos e encontrar a gente que mora na mais bela vila de Porto Alegre.
Ah. Vila, não: bairro.