Há uma história de Hélio Dourado que contei e recontei e contei outra vez durante os mais de 15 anos em que fui editor de Esportes da Zero Hora. Virou meio que folclore na editoria. Quando chegava algum repórter novo, o Jones Lopes da Silva perguntava em voz alta, para que todos ouvissem:
– Já contou a ele a história do Hélio Dourado?
Então eu contava.
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O ano era 1977, o lugar era o vestiário do Estádio Olímpico. Telê Santana, técnico do Grêmio, dava preleção antes de um Gre-Nal, que, como todos os Gre-Nais, seria decisivo. De repente, Hélio Dourado, o presidente do clube, irrompeu naquele ambiente de intimidade dos profissionais. Todos silenciaram, olhando para ele. Telê Santana parou de falar e perguntou:
– O senhor quer falar alguma coisa, doutor Hélio?
E Hélio Dourado, rascante:
– Quero!
– Pois não – disse Telê, afastando-se para lhe dar espaço.
Hélio Dourado fitou gravemente os jogadores do Grêmio, que o fitaram de volta, em grande expectativa.
Hélio Dourado tomou fôlego.
Esperou cinco segundos. Dez. Ninguém falava. Ninguém respirava.
Aí ele gritou:
– GRÊMIO TESÃO!
E foi-se embora.
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Quando contava esse episódio, eu imitava o jeito de falar de Hélio Dourado, com a língua levemente presa. O Jones ria muito, mas ria era de mim, porque ele vivia repetindo que eu vivia repetindo minhas histórias, e com razão – vivo repetindo minhas histórias.
Mesmo assim, este caso diz muito do gremismo de Hélio Dourado. Havia, de fato, tesão no relacionamento dele com o Grêmio. Poucos dirigentes amaram tanto o clube, se dedicaram tanto ao clube e fizeram tanto pelo clube, como ele.
Hélio Dourado foi um marco. O Grêmio mudou de patamar, graças a ele. Hélio Dourado está para o Grêmio como Fernando Carvalho está para o Inter. E ele fez tudo junto – time, estádio, quadro social, o Grêmio melhorou em todos os aspectos ao mesmo tempo, com Hélio Dourado.
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O time que ele montou em 1977 foi histórico, e não apenas porque derrotou o melhor Inter de todos os tempos, com Falcão, Manga, Valdomiro e outros. Aquele time foi histórico porque jogava demais. Vá ao Youtube. Veja alguns lances de Gre-Nais da época. Telê Santana preparou jogadas ensaiadas que nunca mais foram vistas nos campos do Rio Grande. O ataque era de Seleção: Tarciso, André e Éder. No meio havia um regente: Tadeu Ricci. E a defesa era formada por Homens com agá maiúsculo, que sabiam o que fazer, quando fazer, como fazer: Eurico, Ancheta, Oberdan e Ladinho.
Enquanto aquele time vencia no gramado, novas paredes do estádio eram erguidas em torno dele. O Olímpico se tornou monumental. E o Grêmio se credenciou para conquistar o Brasil, a América e o Mundo. As três estrelas que o Grêmio ostenta na camiseta foram pintadas por Hélio Dourado. Como ele conseguiu fazer tanto? O próprio Hélio Dourado revelou o seu segredo: é porque ele fazia as coisas com tesão.