A Inglaterra resolvia muito bem os seus problemas de superlotação dos presídios nos velhos tempos do império onde o sol jamais se deitava: mandava os excedentes para a Austrália.
Dezenas de milhares de homens e mulheres sofreram com o degredo, às vezes por crimes irrisórios, como o não pagamento de dívidas.
A vida dos pobres na Inglaterra não era nada fácil. E como havia pobres por lá. Se você leu algum livro de Charles Dickens, certamente se assombrou com a miséria das ruas de Londres.
Dickens era traumatizado com a pobreza, talvez por ter visto seu pai ser arrastado para a cadeia, exatamente, por dívidas.
Na mesma época em que Dickens escrevia febrilmente seus romances, a segunda metade do século 19, outro morador da Ilha também escrevia com gana, só que obras de não ficção: o alemão Karl Marx, que vivia, aliás muito mal, na cidade industrial de Manchester.
Marx conseguia sobreviver porque, como ocorreria mais tarde com certo presidente do Brasil, era ajudado por um amigo, o filósofo alemão Engels. Esse Engels era filho de um industrial rico e também havia morado em Manchester, onde se assustara com a condição de vida precária dos operários. Engels & Marx formaram uma dupla, tornaram-se o Batman e o Robin do comunismo, escrevendo, sobretudo, com base na desgraça do proletariado inglês.
Se eles atravessassem o Canal da Mancha, encontrariam situação bem parecida na França. Dickens fez isso inclusive na literatura, ao escrever o ótimo Um Conto de duas Cidades. A vida dos miseráveis da França era de servidão e dor. Não foi por outra razão que, antes de Marx e Engels, os franceses protagonizaram uma revolução que pretendia enforcar o último rei com as tripas do último padre.
Mas não era só na Inglaterra e na França. Era em todo o mundo. As pessoas sentiam fome, mas viam-se atiradas em masmorras por roubar uma maçã, uma mulher atravessava a vida usando um único vestido, comer carne era privilégio dos ricos e a maioria da população de todos os países era analfabeta.
A situação melhorou no século 20, mas algumas comidas e algumas roupas continuavam fora do alcance da classe trabalhadora.
Meu avô, que trabalhava como sapateiro, orgulhava-se de jamais ter deixado faltar comida em casa. Era uma obsessão dos descendentes dos colonos imigrantes do Rio Grande do Sul. Como seus pais haviam fugido da fome na Alemanha e na Itália e como passaram necessidades no Brasil, nada era mais valorizado do que a mesa farta. Comia-se muito. Não raro, seis vezes ao dia. Em restaurantes, jamais. Restaurante era coisa de rico.
Hoje, não existe comida que seja proibitiva a um operário. Hoje, o estafeta usa roupas não muito diferentes das do magnata. Hoje, a maioria das populações do mundo sabe ler e escrever.
Outro dia, li em algum lugar que o sucesso de um governo se mede pela redução da taxa de mortalidade infantil e que, nas administrações do PT, esse índice foi reduzido drasticamente. É verdade. Nos governos da ditadura militar também: de 131 mortes por mil nascimentos em 1965 para 113 em 1975. Mais: no mundo inteiro, a mortalidade infantil, entre 1990 e 2015, caiu de 12,5 milhões para 5,9 milhões.
Será que todos os governos do mundo têm sido bem-sucedidos?
Como se explica essa melhora nas condições de vida das pessoas se, agora mesmo, aparece uma pesquisa que aponta que os oito homens mais ricos do mundo têm mais dinheiro do que metade da população do planeta?
Tamanha desigualdade não é inédita, massacrante e a causa de todos os males?
O que está de fato acontecendo?
Vamos pensar. Amanhã, voltamos a falar no assunto.