Acordei com um suspiro de cansaço antecipado. Cerimônias de abertura de qualquer coisa são estressantes. Sei bem como funcionam. Todas aquelas danças.
É bonito ver uma mulher dançando, mas uma só. Uma única mulher dançando, como uma Salomé, pode valer a cabeça de um João Batista. Ou, se ela dança como uma Mata Hari, pode desvendar os segredos do exército francês. Ou, ainda, se é uma Aline Riscado, pode fazer com que você beba mais cerveja, e isso é bom.
Uma só mulher dançando é um espetáculo particular e insinuante. Coreografias, não. Coreografias me cansam.
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Depois do café, revigorado pelos scrambles, considerei que o cansaço antecipado talvez fosse produto da minha idade provecta. Sim, porque, olhe para o dia azul e amarelo do Rio, sinta o ar fino do inverno carioca. Está tudo bem, sim senhor. Otimismo, é disso que precisamos!
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É que vi muitas cerimônias de abertura na vida. Aqui mesmo, no Rio, assisti a algumas, e a melhor de todas foi a do Pan, em 2007. O presidente do comitê pan-americano tomou o microfone para discursar. Falou em espanhol um "hoje" puxado: "hooooy". Os torcedores acharam que ele os estava cumprimentando e responderam:
– Ooooooi... Gostei daquilo. Uma cerimônia de abertura pode ter boas surpresas, afinal.
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Na saída do hotel, encontrei Carlos Kastrup. Você não conhece Carlos Kastrup. Eu também não conhecia. Ele faz parte da equipe de levantamento de peso do Brasil, esporte que é mais popular entre búlgaros, bielorrussos e ucranianos. E mais: hoje, já cinquentão, Kastrup não participa de competições. Ele tem uma escola de levantamento de peso em Teresópolis e atua como árbitro. Na Olimpíada, exercerá funções auxiliares.
Mas, então, por mil chopes cremosos no Leblon, por que estou falando de Carlos Kastrup?
Porque Carlos Kastrup me disse uma frase forte:
– Eu tenho tudo.
Fiquei admirado. Um homem que tem tudo! Aí ele listou um pouco do seu "tudo": pressão alta, hérnia de hiato, apneia do sono, diabetes, lesão no peitoral, gastrite... Ah, e em 1982, Carlos Kastrup quebrou a perna em quatro lugares ao tentar cabecear a bola num jogo de futebol, ficou um ano sem andar e nunca mais conseguiu levantar 250 quilos, como fazia quando jovem.
Cheguei a pensar em dizer algo para consolá-lo, mas, antes que pudesse pronunciar um "puxa", ele emendou:
– Mas nada disso importa. O que importa é que estou vivo.
Balancei a cabeça, em concordância. Esse é o verdadeiro espírito olímpico. Nada de me impacientar com coreografias. Nada de resmungar. Otimismo!
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Com esse sentimento, enfrentei uma das mais longas filas da minha existência, na entrada do Maracanã. Um dos voluntários, com evidente sotaque inglês, mandava-nos encostar em uma tela:
– In the fence! In the fence!
Disse tanto aquilo, que irritou uns jornalistas estrangeiros. Eles o xingaram, mas ele não se intimidou. Continuou nos mandando para a cerca.
Eu, graças à minha nova atitude otimista, não me incomodei.
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Finalmente, instalado nas arquibancadas do Maracanã, tive de assistir à Regina Casé mandando a assistência pronunciar o "som da Terra". O "om". E gritou ao microfone:
– Ommmmm...
E repetia:
– Ommmmm...
E de novo:
– Ommmmm...
Poucas pessoas disseram om de volta.
Chata, essa Regina Casé.
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Algumas pessoas da assistência ensaiaram um "fora Temer", mas foram abafados pela vaia. Não era hora de política, era hora de coreografias.
Começou a primeira coreografia. Uns caras dançando com papel alumínio, imitando as ondas do mar.
Foi bem bonito, se você quer saber.
Aí chegou a hora do hasteamento da bandeira. E sabe quem cantou o Hino Nacional? O Paulinho da Viola! O grande Paulinho da Viola! Foi a mais bela interpretação do Hino Nacional Brasileiro em todos os tempos. E, em seguida, minha vizinha Gisele Bündchen, a Garota de Horizontina, transformou-se na mais deslumbrante, estonteante, elegante, esfuziante Garota de Ipanema com a qual poderiam um dia sonhar Tom e Vinícius. E a equipe dos refugiados foi ovacionada, e um atleta de Andorra tentou sambar, e havia uma linda loirinha na equipe da Bósnia-Herzegovina, e até Brunei Darussalam desfilou com alegria. Todos estávamos alegres, no Maracanã.
Como já disse, assisti a muitas cerimônias de abertura. Vi Copas do Mundo, vi Olimpíadas. Pois garanto: nenhuma foi tão linda quanto a do Rio de Janeiro. Pensei que podemos, sim, fazer um bom e justo país. Fiquei até um pouco emocionado. Talvez devido à idade provecta, talvez por morar longe do Brasil, não sei, só sei que vale a pena viver um dia otimista.
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