Em Porto Alegre, os admiradores de Churchill se reunirão na quarta-feira (30) para reverenciar o político. Será o primeiro encontro no Brasil e começa à caráter, com chá, às 17h. A Winston Churchill Brasil vai promover palestras na sequência e um jantar. E, claro, charutos.
Em 2019, quando ainda era vivo e trotava pelo mundo dando palestra, o polêmico filósofo britânico Roger Scruton veio a Porto Alegre para uma conferência. Fui responsável por recebê-lo e ciceroneá-lo pelo prédio-sede da UFRGS. Com pouco tempo disponível, pensei em não o incomodar muito. Perguntei sobre seus livros e, depois, com muito cuidado, sobre o fenômeno do seu Partido Conservador, que foi de Winston Churchill na década de 1940, passando por Margareth Thatcher até chegar a Boris Johnson. Scruton respondeu com uma frase direta e balançando a cabeça, em desaprovação:
— Os Tories (Partido Conservador) estão se esfarelando.
Foi a última vez que o ouvi — ele morreu seis meses depois. Quem teve Churchill e termina com Boris Johnson tem de lamentar mesmo. Churchill não foi bom, foi extraordinário, genial — antes de essa palavra ser banalizada. Churchill foi resistente e bom líder (O Esplêndido e o Vil, de Erik Larson), foi corajoso quando os britânicos mais precisaram (Churchill, a Biography, de Roy Jenkins) e certeiro no momento certo (Dia D, de Anthony Beevor).
Em 1940, com o parlamento britânico em crise, Hitler tomando conta da Europa com invasões dos países vizinhos e os ingleses na iminência de ter o país ocupado pelos nazistas, Churchill assumiu como primeiro-ministro em meio à tempestade perfeita e rechaçando o acordo de paz de seu antecessor, Neville Chamberlain, com o Führer. Foi quando Churchill proferiu a famosa frase para classificar o antecessor:
— Entre a desonra e a guerra, escolheste a desonra. E terás a guerra.
Churchill sustentava que a Inglaterra iria, mais cedo ou mais tarde, ser invadida. E provocou:
— Este homem vil (Hitler), este monstruoso aborto de ódio e derrota, está decidido a realizar a completa destruição da nação francesa e a desintegração de toda a sua vida e o seu futuro.
Churchill alertava que, depois da França, seria a vez de a Inglaterra aguentar a invasão nazista. Ele era um político desacreditado pelos outros parlamentares. Mas soube unir os britânicos no momento mais grave da Segunda Guerra: quando os aviões Messersmitt alemães bombardearam Londres e cidades próximas. Trinta e cinco milhões de máscaras de gás foram distribuídas aos britânicos. Com razão, entraram em pânico. Mas, à noite, ouviam pela rádio BBC os épicos discursos de Churchill: ele soube transmitir confiança a uma nação alquebrada.
James Humes, que escreveu um livro sobre as capacidades de Churchill e Abraham Lincoln, identificou no líder britânico as qualidades perfeitas de um orador — pelo menos 21 qualidades, entre elas capacidade de gesticular, de se portar, presença e oralidade. Churchill entendia as dificuldades dos londrinos e mesmo com os bombardeios ficou na residência oficial do primeiro-ministro, no número 10 da Downing Street. Foi aconselhado a se retirar para Chequer, casa de campo oficial. Negou-se, para dar um exemplo, e ficou em Londres. Os britânicos viram ali um ato de coragem.
Desde cedo, o primeiro-ministro se convenceu de que não ganharia a guerra sem a ajuda dos EUA. Por isso, gastava tempo precioso ao viajar para Washington e tentar convencer Franklin Roosevelt a entrar no conflito. Foi Churchill quem ajudou a conceber a estratégia de usar força bruta para invadir a França pela Normandia e expulsar os nazistas do país, dando início à liberação da Europa, naquele que ficou conhecido como o Dia D — considerado o mais importante do século 20. A ousadia dele foi recompensada: Hitler começou a perder a guerra ali. Acabou derrotado pelos soviéticos na frente oriental, e aí tudo degringolou para os alemães. Esse é um legado de Churchill: ele evitou a expansão dos nazistas pela Europa.
Churchil era inteligente, imprevisível e excêntrico. Mantinha reuniões com a secretária enquanto tomava banho. Praticamente não tomava decisões sem consultar sua esposa, Clementine, ou, como a chamava, Clemmie. E, quando as tomava, surpreendia a todos, como quando se autonomeou ministro da Defesa. O apego ao bom charuto, ao uísque e ao conhaque vieram da vida aristocrática, como almirante da marinha britânica e, depois, político, o “mais importante primeiro-ministro do século 20”.
Mas nem tudo é exaltação. Existem muitos contorcionistas da história que tentam colar o rótulo de racista para tentar desmerecer Churchill. É muita ingenuidade pegar a história hoje e tentar enquadrar nela uma figura histórica de outro período. Temos a liberdade de discordar, que bom. Na virada dos séculos 18 para o 19, Churchill passou como soldado por países da África e da Ásia e passou a acreditar que a Inglaterra possuía uma raça superior. Gravíssimo. Mas é difícil interpretar esse fato do passado sob a nossa realidade. Churchill abandonou essa ideia depois — ainda bem. Hoje sabemos que não há diferença entre origens. Eis um exemplo: na esplanada do parlamento, em Londres, há estátuas variadas de alguns políticos, e a mais procurada para fotos é a de Churchill.
O encontro
O primeiro encontro nacional da Winston Churchill Society Brasil, a partir das 17h de quarta-feira, no Theatro São Pedro, em Porto Alegre, reunirá participantes de todo o país com palestras e um jantar de confraternização. As inscrições já estão esgotadas. Saiba mais em winstonchurchill.org.br.