No afã de oferecer uma luz no fim do túnel para empresários do setor varejista, o ministro da Economia, Paulo Guedes, prometeu que o governo ajudaria a implantar testes em massa na população brasileira para identificar, através de testes sorológicos, quem já teve covid-19 com o intuito de planejar a retomada da economia.
Estima-se que mais de 80% das pessoas infectadas não vão saber que tiveram a doença por não apresentarem os sintomas. O ministro arriscou até um número: 40 milhões de testes por mês.
No dia 4 deste mês, em videoconferência para representantes do setor varejista, o ministro afirmou que estava em tratativas com um fornecedor da Inglaterra para a compra em grande escala dos kits. Essa quantidade seria suficiente para rastrear um quinto da população brasileira.
— São 40 milhões de testes por mês. Ou seja, você tem um passaporte da imunidade. Veja bem. Isso não é agora. Agora estamos em isolamento. Já estamos planejando uma saída, como sair lá na frente, do período de isolamento. Primeiro estamos nessa primeira onda.
A promessa no ministro, porém, parece longe de ser viável. A própria Inglaterra, de onde viriam os testes, não submeteu a sua população a essa escala de testes. De acordo com a BBC, até agora o país tem feito, em média, 10 mil testes por dia. Pressionado, o governo britânico prometeu ampliar para 100 mil o número de identificações diárias de pacientes sintomáticos. Ainda assim, uma marca muito distante de 40 milhões. O número parece ainda mais distante quando olhamos para outros países que enfrentam a pandemia.
— Nem o mundo fez 40 milhões de testes — assegura o médico hematologista Gustavo Faulhaber.
Provavelmente o único país do mundo com capacidade para produção na casa dos milhões seria a China. Ainda assim, não num prazo tão curto.
— A China não venderia isso tudo em um ano talvez — reforça o hematologista, professor da UFRGS e diretor da Unimed.
Faulhaber explica que existem dois tipos de testes mais comuns: o PCR, que detecta o vírus ativo, e o teste rápido, cuja o resultado sai imediatamente e muitas vezes tem imprecisão.
Paulo Guedes deu a entender que seriam feitos no Brasil os testes rápidos com o objetivo de identificar quem já teve contato com o vírus e, desta forma, criar uma espécie de "passaporte de imunidade", já que, teoricamente, os pacientes que enfrentaram a doença não são reincidentes.
Ainda não se tem certeza de que a reinfecção não pode ocorrer, portanto ainda é cedo para afirmar que quem teve a doença está imune. No momento atual, é imprescindível que tenhamos acesso aos testes diagnósticos, os testes de PCR, que identificam o material genético (RNA) do vírus e são mais sensíveis.
A detecção precoce e abrangente tem levado à redução do avanço da pandemia em alguns países, já que, dessa forma, é possível isolar os casos confirmados enquanto estes ainda estão transmitindo a doença. O diagnóstico precoce também permite que medidas de cuidado médico sejam empregadas antes de um avanço rápido da doença, o que pode aumentar a chance de sobrevivência.
— A ideia do passaporte é interessante, mas, para ser factível, teríamos que ter meses de epidemia em escala catastrófica para termos um número viável de passaportes — diz Faulhaber.
Portanto, um cenário irreal para o futuro próximo do país.