Reconduzido ao cargo para um novo mandato, o procurador-geral de Justiça do Rio Grande do Sul, Fabiano Dallazen, ficará à frente do Ministério Público (MP) por mais dois anos com o desafio de tornar a instituição mais eficiente sem elevar gastos. A ordem é fazer mais com menos, com foco em temas que tenham impacto direto em assuntos de interesse público.
Qual deverá ser a marca da sua segunda gestão?
A prioridade primeira será a consolidação de uma cultura de gestão estratégica, para que a gente enfrente as dificuldades financeiras e orçamentárias do Estado e do país. É preciso produzir mais, entregar melhores resultados ao cidadão nas áreas prioritárias (segurança, saúde, educação, sustentabilidade e proteção social de vulneráveis), sem aumento da estrutura física. Para isso, vamos investir em gestão e tecnologia. O Ministério Público vai poder trabalhar e produzir mais desde que tenha uma cultura de estabelecimento de prioridades e gestão dos seus recursos humanos e materiais.
Isso significa que, em alguns casos, o MP se ocupa com assuntos que não dão resultado?
O Ministério Público tem uma gama muito grande de atribuições. Na área criminal, por exemplo, desde controle externo da atividade policial, investigações, atuação durante o processo, execução penal na fiscalização dos processos e dos presídios, política pública de segurança. Na área especializada: consumidor, urbanismo, meio ambiente, patrimônio público, patrimônio cultural. A verdade é que temos de estabelecer prioridades, que são aquelas com maior reclamo e aquelas em que a gente pode produzir impacto social maior. A nossa prioridade não é produzir número. Então, determinados processos em que não é tão necessária a presença do Ministério Público ficam de fora dessa prioridade para que a gente possa concentrar esforços e recursos nessas áreas e, principalmente, em uma atuação extrajudicial preventiva, desafogando o Poder Judiciário e produzindo uma solução para o conflito sem ficar anos e anos em uma disputa judicial.
O senhor pode dar um exemplo de como o MP será mais eficiente?
Posso dar vários. No ano passado, tivemos mais de 1,5 mil recomendações e firmamos mais de 2 mil termos de compromisso. São acordos feitos com a outra parte em ações quanto ao patrimônio público, em ações ambientais, consumidor. São acordos antes da judicialização. Tivemos 2,3 mil acordos completamente cumpridos, que foram firmados em outros anos. Isso significa 3 mil ações civis públicas a menos em 2018 no Poder Judiciário. E o problema que seria levado para ser discutido nessas ações foi resolvido com diálogo e o estabelecimento de um cronograma de prazos, cedendo alguma coisa. Quem acaba ganhando é o cidadão, porque a resolução fica mais rápida. Em todas essas áreas, seja com entidades privadas, empresas, prefeitos ou outros órgão do poder público, essa forma de resolução do problema extrajudicial e preventiva é mais barata e mais rápida. Portanto, mais eficiente. O poder público precisa ter eficiência e, para isso, precisa entregar um resultado com menor custo e em menor tempo ao cidadão.
O cenário estadual é de dificuldade financeira e necessidade de enxugamento nos gastos públicos. Qual é a contribuição do MP?
O Ministério Público, quando fala da sua autonomia financeira e administrativa, da qual a gente não pode abrir mão, vem implementando uma gestão austera há um bom tempo. Os números mostram que estamos diminuindo a nossa participação na receita corrente líquida do Estado e, mesmo assim, produzindo a cada ano melhores resultados. Então, a gente vem colaborando sucessivamente com essa austeridade. O Ministério Público nunca se negou. A prova disso é que nos últimos quatro anos, praticamente em três deles, se criou um acordo apenas para o crescimento vegetativo com o congelamento nas verbas de custeio e crescimento. Com muita gestão e sem aumentar o número de membros e servidores, apenas com reposição, estamos conseguindo produzir bons resultados para a sociedade. Então, podemos concordar e trabalhar como a gente vem fazendo até o limite em que não prejudique o serviço que a instituição presta ao povo gaúcho.
A Operação Pulso Firme foi uma das ações mais marcantes do MP na área criminal nos últimos anos no Rio Grande do Sul. É possível fazer outra operação nos mesmos moldes para atingir o topo da pirâmide das organizações criminosas?
Não podemos cair na tentação, e a história nos mostra, de radicalizarmos, enfraquecermos as instituições ou buscarmos outras vias que não a política.
FABIANO DALLAZEN
Procurador-geral de Justiça do Rio Grande do Sul
A questão agora talvez não seja no sentido de fazer uma grande operação, mas, pontualmente, aquelas lideranças que forem sendo formadas possam ser isoladas. Isso vem acontecendo. O segundo grande passo é a criação de um regime disciplinar diferenciado no sistema penitenciário do Rio Grande do Sul, para que a gente possa, aqui mesmo, isolar as lideranças das nossas facções.
Como seria feito isso?
Ou você constrói uma área separada dentro dos novos presídios ou pega um dos presídios que tem hoje e naquela área monta uma estrutura que quebra completamente a comunicação dos presos e permite aquelas questões do regime disciplinar diferenciado: menos tempo de sol, comunicação com familiares absolutamente restrita, comunicação com o mundo externo muito limitada e monitorada. É um regime de exceção aplicado àqueles presos. Não são todos os detidos. Mas você veja, o Rio Grande do Sul tem 40 mil presos. Desses, 28 foram para presídios federais. São as grandes lideranças que têm de ser cortadas completamente seu contato com o mundo externo. Poderíamos fazer isso e manter esses presos isolados aqui mesmo. Esse seria um grande passo. E a descapitalização, que a gente vem trabalhando com a Polícia Civil para coibir a lavagem de dinheiro.
Em seu discurso de posse, o senhor fala em moderação. Como avalia o papel do Ministério Público no contexto de polarização do país?
Hoje, mais do que nunca, precisamos de uma política séria e de instituições fortes. Não podemos cair na tentação, e a história nos mostra, de radicalizarmos, enfraquecermos as instituições ou buscarmos outras vias que não a política. A democracia requer instituições fortes e uma política séria. As instituições têm de ter compromisso com os valores da Constituição: liberdade de expressão, religiosa, de imprensa. A aplicação desses valores dentro de uma democracia tem de ser feita com moderação. O radicalismo, muitas vezes, acusa os moderados de serem fracos, a verdade para ser ouvida não precisa ser violenta. Ela tem de ser pelo convencimento, pelo diálogo, pela ponderação, para que a gente possa avançar. Então, me parece que hoje a amplificação pelas plataformas digitais desse debate raso e pouco racional não pode suplantar o que está na lei, na razão e na essência da democracia. E as instituições têm de preservar isso, sob pena de perecimento das instituições e da própria democracia.