Nos últimos dias conheci e escutei vários episódios do podcast Against the Rules (“Contra as regras”), de Michael Lewis. A temporada que estou ouvindo lida com os experts. Mais precisamente com a contradição: por que uma sociedade tão capaz de gerar informação e expertise subitamente se recusa a ouvir os experts que produz. Sobretudo durante uma crise.
Curiosamente, parece que a maioria das pessoas não sabe inclusive reconhecer os verdadeiros experts em um assunto. Vem à mente o exemplo da pandemia recente. Um episódio fala sobre isso. Sobre um grande segmento da sociedade ter decidido escutar experts autodeclarados, que traziam informações não apenas falsas, mas perigosas, e isso ter resultado em tantas mortes. Apesar de os EUA terem construído um plano expert durante o governo Bush de como enfrentar uma pandemia, plano este aperfeiçoado no governo Obama, decidiram não o seguir quando a emergência chegou.
Mas o episódio que mais me interessou desenvolve a tese de que os verdadeiros experts nem sempre estão no nível governamental, ou gestor de crise, como imaginamos. Para gerir algo, imaginamos que um expert será designado, seja ele qual for. Mas isso normalmente não acontece. Cargos governamentais e de gestão são preenchidos por outros diversos critérios, que muitas vezes não incluem a expertise. E, quando uma crise se instala, embora esses sejam chamados a liderar, dar entrevistas etc., com frequência têm pouco ou nenhum conhecimento sobre como resolver o problema.
Nos anos 1990, uma startup em San Diego lutava para convencer investidores de que podia montar um sistema de cobrança de procedimentos médicos. Parece mentira, mas clínicos, hospitais e planos de saúde não se entendiam. Muito menos os usuários. Os sistemas eram tão complexos que ninguém compreendia as regras. Contas deixavam de ser pagas, e o atendimento era tão ineficiente que chegava a ser um entrave econômico – hospitais e seguradoras faliam sem entender o porquê. A Athena Health (nome da startup) entrevistou milhares de pessoas tentando desvendar o problema. Ninguém sabia explicar. Após muitos anos, com a ajuda de Sue Henderson – uma mulher que os colegas consideravam o oráculo das cobranças, uma contadora nata, que trabalhava num porão –, desenvolveram um software que desatou esse nó cósmico-econômico. Hoje são uma grande empresa.
Para a resolução de crises, criaram uma regra: nunca fale com o gestor, ou a pessoa logo abaixo dele; vá direto ao nível 6. A ideia é que as pessoas que mais conhecem um problema estão em geral seis níveis abaixo dos gestores, e são elas que sabem como solucioná-lo. Isso nos faz pensar: por que não valorizamos mais pessoas nível 6 em nossas estruturas de trabalho? O que dizer de líderes que não sabem ouvir a base ou não têm contato com o dia a dia do negócio? A mim parece que todos sabemos reconhecer experts, e sabemos seu valor. Nos falta a coragem de ser menos seduzidos por palavras bonitas e dizer: estou perdido; por favor, mostre o caminho.