Muitos artistas e produtores culturais vêm se referindo a 2016 como o ano da "resistência" – uma palavra de ecos heroicos, sem dúvida, mas que comporta sentidos diversos e até mesmo opostos. Resiste-se fincando o pé no chão ou nadando contra a correnteza, mas também entrando em movimento e adaptando-se a um novo ecossistema. Talvez uma boa palavra para manter em mente em 2017 seja "adaptação", no sentido darwinista do termo: o esforço de harmonizar-se ao ambiente para sobreviver e, com sorte, evoluir.
São vários os exemplos de iniciativas culturais que nos últimos tempos tiveram que fazer uma escolha entre a adaptação e a extinção. A Jornada de Passo Fundo foi uma delas: cresceu tanto nos tempos de fartura, que, nos moldes como estava, tornou-se economicamente inviável e foi cancelada em 2015. Em setembro deste ano, porém, a UPF confirmou a volta do evento em 2017 – menor, mais conectado com a região, mas não menos relevante. Na semana passada, foi a vez de a Bienal do Mercosul anunciar um ano de interrupção e o retorno em 2018, com um orçamento bem menor do que o das edições anteriores, mas com empenho redobrado para que a comunidade cultural gaúcha aproprie-se da mostra de forma ainda mais intensa.
Como essas, são muitas as iniciativas que têm ajudado a soprar para longe o baixo-astral que parece estacionado sobre os céus do Rio Grande do Sul. A partir da mobilização de um pequeno grupo de artistas com vontade de fazer as coisas acontecerem, o Vila Flores movimentou o 4º Distrito como nunca nos últimos meses. Eventos como FestiPoa Literária, Fantaspoa ou Cine Esquema Novo já nasceram no "esquema novo" dos orçamentos enxutos e das soluções alternativas para atrair público e patrocinadores.
Claro que é triste ver o fim da TVE e da FM Cultura, principalmente pela forma precipitada e desinteligente como se desenrolou todo o processo, e encerrar uma longa história de serviços prestados à cultura local. Acima de tudo, é dramático ver tanta gente perdendo o emprego em tempos de crise. Mas, neste momento, a maior homenagem que poderia ser prestada a esse legado de pluralidade é extrair da inédita mobilização da comunidade cultural gaúcha a energia para construir alternativas que preencham, pelo menos em parte, a lacuna aberta pela extinção da Fundação Piratini. A tecnologia com certeza oferece possibilidades que não existiam há 40 anos, quando a TVE foi criada, e novos modelos de financiamento podem ser testados. A hora é de pôr a mão na massa. Resistir, adaptar-se, sobreviver.