Uma das mais comoventes histórias de amor e afinidade entre pai e filha é a de Carlos Drummond de Andrade e sua Maria Julieta. Os dois eram tão próximos, que, quando ela morreu de câncer, em 1987, o poeta sobreviveu apenas alguns dias à sua perda. Outra história bonita é a de Oscar Niemeyer e sua Anna Maria. Filha única, como Maria Julieta, Anna Maria trabalhou com o pai em muitos projetos, inclusive Brasília. A relação dos dois foi abençoada por uma circunstância tão rara que chega a ganhar ares bíblicos: quando a filha morreu, em 2012, aos 82 anos, o pai, aos 104, estava ao seu lado.
A mais bela canção de ninar que um bebê pode ter a sorte de ouvir, Acalanto, foi escrita por Dorival Caymmi para a filha Nana, no início dos anos 40. Em uma época em que pais pouco se ocupavam das crianças, Caymmy coloca um homem a embalar sua pequena enquanto a mãe descansa. Já na canção As Minhas Meninas, dos anos 80, Chico Buarque dá forma lírica ao sentimento de posse que muitos pais alimentam em relação às filhas mocinhas quando elas começam a ficar independentes: "Olha as minhas meninas/ As minhas meninas/ Pra onde é que elas vão?/ Se já saem sozinhas/ As notas da minha canção". Mas é obrigado a admitir que toda essa aflição é inútil: "As meninas são minhas/ Só minhas na minha ilusão". Moderno mesmo é o pai da canção Lado a Lado, que abençoa o amor da filha por outra mulher. A música, com letra de Alcy Cheuiche, foi incluída no álbum Todas as Letras, de Kleiton e Kledir: "Se tu gostas dela, minha bela, o que eu posso te dizer?/ Me emociona ver vocês, as duas/ O amor precisa acontecer".
Na próxima semana, o escritor e jornalista Bernardo Kucinski autografa em Porto Alegre o quase-romance K - Relato de uma Busca (2011), uma das mais poderosas histórias escritas no Brasil a respeito do amor de um pai por uma filha - e também um dos relatos mais impactantes sobre o período da ditadura militar no país. No livro, o velho comerciante judeu K, que escapou dos nazistas emigrando para o Brasil, é mais uma vez atropelado pela História quando a filha Ana Rosa, professora universitária, é sequestrada e morta pela repressão. Em sua quixotesca jornada em busca de informações a respeito do paradeiro da filha, K é constantemente enganado, humilhado, ameaçado - mas não se deixa abater. Sua fibra e sua coragem, inspiradas na história real do pai do escritor, refletem a força de um laço amoroso indestrutível: "O pai que procura pela filha desaparecida não tem medo de nada".
Cheuiche e Kucinski estarão autografando na Feira do Livro de Porto Alegre no mesmo dia, 11 de novembro, e no mesmo horário, 20h.
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