Toda morte é um despertador da nossa morte.
O fim trágico do zagueiro Juan Manuel Izquierdo, do Nacional-URU, que morreu na terça-feira (27), acometido por um mal súbito, não sai da minha cabeça em replay infinito.
O jogador de 27 anos teve uma parada cardiorrespiratória associada à arritmia cardíaca aos 39 minutos da etapa final do embate contra o São Paulo, no Morumbi, válido pelas oitavas de final da Conmebol Libertadores.
É uma cena que não apareceu durante a transmissão. Ele se encontrava no meio de campo e começou a trotear, perdendo o equilíbrio até cair no gramado. Caminhou para o lado, cambaleante, sem entender o que estava ocorrendo.
Você nunca espera que isso vá acontecer com um atleta jovem de alta performance, que é submetido a treinos e baterias de exames periódicos.
Uma pequena arritmia havia sido detectada em Izquierdo há dez anos num eletrocardiograma, quando atuava no Atlético Cerro. Nada grave na época, mas que foi roubando secretamente o seu coração.
O apagar das luzes chega justamente no melhor momento da carreira do zagueiro, que regressou valorizado ao Nacional após passagem de sucesso pelo Liverpool, modesto clube uruguaio com o qual se consagrou campeão nacional em 2023.
E também experimentava o melhor momento da sua vida pessoal, celebrando o filhinho de alguns dias, novo irmão da filhinha de dois anos.
Há duas semanas, o defensor assistia ao parto da esposa Selena.
Há duas semanas, postava foto em suas redes sociais com o traje hospitalar, segurando o recém-nascido com olhar altivo, doce e derramado para seu menino.
Duas semanas depois — quem diria? —, ele não está mais entre nós. Seus colegas, seus familiares jamais imaginariam que se mostrava sob recôndito perigo.
Apenas duas semanas se passaram entre a sua maior alegria e a sua partida precoce e repentina.
Seu filho não vai conhecer o pai, não vai conviver com ele. Assim como sua filha pouco se lembrará do colo paterno. Reinará a lacuna do sorriso protetor. É uma orfandade que abate uma família.
A existência é um delicado e tênue sopro. Tentamos ignorar a nossa finitude, jurando que teremos muito tempo pela frente, mas ela grita com os exemplos ao nosso redor.
Em qualquer adeus, não haverá justiça. Será sempre imprevisível, de uma hora para outra. Não disporemos de chance de fazer as malas ou discursar para quem amamos. Deixaremos um rastro de dor e lágrimas.
Não dá para se adiar, não dá para se fiar em promessas, não dá para se sentir à salvo e imune, não dá para fugir das visitas aos médicos: nunca saberemos quando será a última vez.
Toda morte é um despertador da nossa morte. Eu já marquei meu cardiologista para segunda-feira. Não vou mais me sabotar ou me tratar como uma exceção. Exceções falecem. O check-up completo deveria ser obrigatório.