Minha primeira reação à cavadinha do zagueiro colorado Robert Renan no pênalti decisivo contra o Juventude, que decretou a eliminação do Inter, foi de perplexidade. Considerei o ato uma afronta, um desleixo. Ele literalmente entregou a bola para o goleiro adversário como se fosse um aquecimento, esqueceu que estava definindo a classificação para uma final, para um título que seu time não ganha há sete anos.
Eu o odiei com todas as minhas forças, gastei o estoque de meus desaforos, esfolei meus pés na cadeira, queria mandá-lo embora para sempre.
Transformou-se imediatamente num novo vilão, num anti-herói, numa persona non grata lá em casa.
Minha segunda avaliação da cena trágica também se mostrou agressiva: caracterizei o gesto como a manifestação de soberba e inconsequência de um jovem de 20 anos, de salto alto. Ele desceu de paraquedas no Beira-Rio, incapaz de entender a importância do momento para sua torcida, para aqueles 40 mil torcedores aflitos. Ele ainda não tinha chão no estádio, quilometragem no clube. Descolado da história da rivalidade com o Grêmio, encontrava-se sob os efeitos nefastos de uma contratação recente.
Afinal, não se brinca numa hora dessas. Melhor errar com força, como Mercado fez, do que telegrafar a cobrança com suavidade irritante.
Depois, revendo o lance, diminuí um pouco a minha cólera. Já achei que ele tentou imitar a frieza de Enner Valencia, que bate o pênalti com um desembaraço budista. Já o qualificava como um infeliz discípulo.
Na manhã seguinte, em mais uma reprise, porque a penalidade virou meme nas redes sociais, especialmente pela flauta gremista, eu entendi que ele foi apenas ingênuo.
Ele repetiu exatamente sua cobrança que deu certo na Supercopa da Rússia, inclusive no mesmo canto.
Atuando pelo Zenit, ele realizou também uma cavadinha que garantiu o título na temporada 2023-2024, contra o CSKA Moscou.
Ou seja, nervoso e inseguro na semifinal, ele manteve o seu truque, recorrendo à batida que garantiu o troféu antes. Não quis inovar. Seguiu a sua fórmula de sucesso. Ainda que parecesse um deboche, representava sua tradição.
O que ele não atinou é que goleiro Gabriel, do Juventude, conhecia sua fama. O chute colocado da conquista para a equipe de São Petersburgo viralizou internacionalmente na época — assim como seu erro viralizou agora.
Por isso, Gabriel nem se deslocou demais do centro das traves. Ofereceu o lado esquerdo e calculou que a bola viria fácil, manhosa, deixando-o saltar à vontade em direção a ela.
A ingenuidade de Robert Renan é perdoável. Não o crucifiquem. Ele merece outra chance.
Não perdoo o Inter que, pelo jeito, sequer treinou cobrança de penalidades para desafio mata-mata. Talvez por arrogância. Se tivesse treinado, avisaria Renan que a sua mágica era manjada. Coudet confessou que não sabia do histórico do zagueiro. Nem nos treinos? Não, pois certamente não existiram.
O Inter vive me desmoralizando. É só escrever que acredito nele que vem desgraça pela frente. É muito difícil ser escritor colorado. É muito difícil, na verdade, ser colorado.