Imagine que você deixa seus quatro filhos passarem o final de semana com o pai deles, num gesto de confiança, e, quando você vai buscá-los no início da semana, todos estão mortos.
Uma escadinha entre irmãos, quatro degraus de sonhos, de esperança e da pureza da infância destruídos sumariamente: três meninas, de 11, seis e três anos de idade, e um menino de oito.
O crime brutal, que tem o pai de 28 anos como suspeito, aconteceu no bairro Piratini, em Alvorada (RS), na região metropolitana de Porto Alegre. A Brigada Militar foi acionada na noite de terça-feira (13).
Não se trata de perder um filho, uma dor que já seria monumental, mas perder a família inteira.
Quatro vezes o coração materno esvaziado num único golpe. Quatro vezes o ventre roubado num único ato.
Tudo por vingança da separação. Tudo por discordar do divórcio. Tudo por orgulho. Tudo por uma banalidade. Tudo por implicância. Tudo por ciúme da independência feminina. Tudo por dominação. Tudo por machismo. Tudo para dar uma lição.
Isso não é vingança, vingança é retribuir um mal. Nenhum mal que fosse feito antes pela outra parte alcançaria tal dimensão.
A chacina é incomparável. Não pode ser considerada vingança — é uma monstruosidade. Não pode ser considerada como troco — é a falência de uma existência.
Não há como devolver a vida dos quatro filhinhos.
O pai provou que não era pai, não se importava nem um pouquinho com a sua ninhada. Ele apenas queria a mulher de volta, como sua posse, seu patrimônio. Então, para mostrar que ela jamais seria feliz sem ele, para castigar a sua ousadia de sair de perto, ele tirou dela o que ela tinha de mais precioso: os filhos. Jamais cogitou estar tirando também de si. Não era pai para sentir falta, sentir saudade, sentir pena, sentir culpa. Não era nem gente, pois atacou covardemente menores frágeis e indefesos.
O que me atormenta são os instantes antes do fim. Fico pensando na reação incrédula das crianças, que não previram a maldade do seu pai, que juraram ser uma brincadeira, um fingimento, até não restar mais ar para pedir socorro, força para suplicar piedade.
Por certo, acreditaram que o pai estava ajeitando o travesseiro para elas dormirem melhor, enquanto, na verdade, ele o pegava para sufocá-las, para calá-las, para nunca mais.
Em alguns momentos, mesmo sendo um poeta e trabalhando diariamente com as palavras, não tenho o que dizer. Só emerge de dentro de mim asco, repulsa, vergonha de ser homem.