A migração natural das aves é a principal explicação para o aparecimento do vírus da gripe aviária em solo gaúcho. Os primeiros focos da doença no Estado foram localizados na Estação Ecológica do Taim, após testes realizados em cisnes-de-pescoço-preto encontrados mortos no local. A ave silvestre tem o nome científico de Cygnus melancoryphus e é conhecida pelos deslocamentos regulares no Cone Sul.
A espécie silvestre em que se fez o diagnóstico do vírus no Rio Grande do Sul é a mesma que teve a confirmação no Uruguai, em fevereiro deste ano.
— Foi o que nos acendeu o alerta. Quando chegou a notificação do Taim, de imediato fizemos o link com o caso na Laguna Garzon, no Uruguai — afirmou a diretora do Departamento de Vigilância e Defesa Sanitária Animal da Secretaria Estadual da Agricultura, Rosane Collares.
A hipótese de que o vírus tenha chegado através da migração da espécie de regiões do Uruguai e da Argentina é compartilhada pelo professor do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), Leandro Bugoni. Como já havia casos detectados no país vizinho, era esperado que o vírus estivesse circulando na região.
— Essas aves se deslocam do Sul em direção ao Estado no outono e passam o inverno aqui. O Taim é uma área importante para a troca das penas das aves. Os cisnes perdem todas as penas das asas ao mesmo tempo e ficam sem condições de voo. Então, precisam de áreas protegidas com bastante alimento nesse período em que ficam vulneráveis — analisa Bugoni.
Rosane reforça o ponto migratório na propagação da doença com um detalhe encontrado pelas equipes de vigilância. Dentre os cisnes mortos no Taim, um deles possuía uma anilha de identificação dos Estados Unidos, registrada há dez anos, dando o indício de que os animais haviam passado por outros locais.
Apesar do cisne-de-pescoço-preto ser encontrado durante o ano inteiro na região, a maior parte da população encontrada no Taim nesta época migra das regiões mais ao Sul. O professor da Furg explica que o animal é uma espécie de grande porte, que pertence ao grupo dos patos, marrecos, cisnes e gansos, e é um dos grupos mais afetados pela cepa da gripe aviária.
A detecção do vírus no Estado coincide com o deslocamento da espécie de regiões mais ao Sul, como a Patagônia, até o Taim. Entretanto, Bugoni alerta que não é possível afirmar com certeza qual a origem do vírus.
Além dos possíveis impactos econômicos e sanitários da presença do vírus da gripe aviária, há uma preocupação ambiental.
— Do ponto de vista ambiental, a presença de vírus circulando e infectando animais é um processo normal. Mas, quando atinge uma população que já tem um número reduzido, por diferentes causas, uma doença severa como essa pode ter um impacto populacional grande — analisa o pesquisador.
A Estação Ecológica do Taim tem cerca de 33 mil hectares e fica entre os municípios de Rio Grande e Santa Vitória do Palmar. A área é considerada um santuário de aves aquáticas e abriga mais de 250 espécies, muitas delas suscetíveis ao vírus da gripe aviária. O cisne-de-pescoço-preto, ave mais atingida até agora pelo vírus, é considerado desde 1985 como a ave símbolo do município de Rio Grande.
Para os especialistas, é esperado que a doença chegue a outras espécies.
Fora do Rio Grande do Sul, outros dois casos em aves silvestres foram confirmados. No Rio de Janeiro, em animais Thalasseus acuflavidus (trinta-réis-de-bando) na Ilha do Governador, e no Espírito Santo, em aves Sterna hirundo (trinta-réis-boreal), no município de Piúma.
Segundo o Ministério da Agricultura, a doença já foi identificada em seis espécies silvestres: Thalasseus acuflavidus (trinta-réis de bando), Sula leucogaster (atobá-pardo), Thalasseus maximus (trinta-réis-real), Sterna hirundo (Trinta-réis-boreal), Megascops choliba (corujinha-do-mato) e Cygnus melancoryphus (cisne-de-pescoço-preto).