A crescente profissionalização do agronegócio torna cada vez mais presente o chamado "juridiquês" na rotina do campo. Temas como Código Florestal, Cadastro Ambiental Rural (CAR) e demarcação de terras envolvem aspectos legais que, muitas vezes, desafiam os produtores. Com isso, cresce a procura por profissionais do Direito especializados na área rural.
Um dos professores que ministrará a especialização em Direito Agrário e Ambiental no Instituto de Educação do Agronegócio (I-UMA) em Porto Alegre, cujas inscrições vão até sexta-feira, Albenir Itaboraí Querubini Gonçalves analisa os desafios e entraves envolvendo alguns destes assuntos em entrevista ao Campo e Lavoura.
Leia as últimas notícias de Campo e Lavoura
A seguir, confira os principais trechos.
O prazo para o Cadastro Ambiental Rural expira em maio, e o Rio Grande do Sul está na lanterna. Quais as principais consequências para quem descumprir o prazo?
Muitos produtores rurais desconhecem o cadastro e sua importância. Ainda há os que não têm dinheiro nem apoio técnico especializado para fazê-lo. Se o prazo expirar e o cadastro não for feito, seria como declarar o Imposto de Renda fora do prazo. Há sanções previstas, como as que dizem respeito à base de cálculo do Imposto Territorial Rural (ITR), por exemplo. Mas o principal efeito será em maio de 2017, quando a ausência de registro vedará o acesso ao crédito. Por isso, é muito importante que o cadastro seja feito no prazo.
A demarcação de terras divide opiniões. No Estado, há produtores que, mesmo com escritura, têm de sair da propriedade. Como mediar isso?
A Constituição procurou estabelecer em 1988 uma nova ordem de justiça social. E vemos uma série de demandas reprimidas, como a questão indígena. Alguns conflitos ainda surgirão por se tratar de um debate histórico, e talvez não haja solução imediata. Mas creio que são questões que demandam mais vontade política do que aspectos jurídicos. Não se pode desconsiderar direitos adquiridos dos produtores, que se estabeleceram por décadas na propriedade. Por outro lado, a Constituição reconhece o direito indígena à terra para atividades culturais. Está faltando gerência do governo nesta questão.
É possível fazer reforma agrária sem conflitos jurídicos? Como avalia o papel das desapropriações no processo?
A reforma agrária é um conjunto de medidas e tem de se dar concomitantemente com políticas agrícolas. A ideia é mudar a estrutura para que se tenham mais propriedades produtivas, sejam pequenas, médias ou grandes. Há três eixos da função social da propriedade: econômico, ambiental e social. Como a tecnologia favorece a melhor exploração das terras, dificilmente existirão hoje áreas consideradas improdutivas. A questão é buscar outros caminhos. Penso que o foco da política agrícola e da reforma agrária deva ser instrumentos como a compra e a venda de terras, opções de financiamento, facilitação da exploração por contratos agrários. A desapropriação deve ser a última ferramenta a ser usada, porque é uma intervenção por mau uso da propriedade.
Como vê a evolução das leis trabalhistas para garantir o cumprimento dos direitos de quem atua no campo?
Ao longo do tempo, a gente vê uma série de medidas tomadas e maior atuação dos órgãos de proteção ao trabalhador. Hoje, é inaceitável empreendimentos agrários investirem milhões em insumos e equipamentos e manterem funcionários mal remunerados ou em condições impróprias e insalubres. A informalidade deve ser reprimida. Nesse viés, a tendência é de maior valorização do trabalhador, diante da necessidade de mão de obra qualificada no campo para produzir mais e melhor.