Envolto em idas e vindas na legislação e falta de consenso, o emplacamento obrigatório de máquinas agrícolas deve começar a valer a partir de 1º de janeiro de 2015. O maior impacto será sobre o trator, principal veículo usado no campo.
Enquanto o setor contesta e tenta adiar o prazo, a indústria se adapta às mudanças, apesar de algumas regras serem genéricas demais e pontos como a fiscalização, por exemplo, não estarem especificados.
Consultor de agronegócio, Carlos Cogo pondera que há ganhos e perdas com as novas regras. Observa que, com o emplacamento, será possível dimensionar e controlar a frota agrícola, o que permitirá, por exemplo, distribuir melhor verbas federais e até facilitar seguros e financiamentos.
Por outro lado, Cogo lamenta o aumento de custos para o agricultor e observa que, mesmo valendo só para máquinas compradas a partir de 2015, é inevitável que, gradualmente, os produtores sejam atingidos pela medida, pois a evolução rápida da agricultura exige investir em equipamentos para
garantir produtividade e renda:
- O emplacamento é interessante e tem benefícios, mas a questão das despesas extras é crucial. O setor não precisa de mais custos.
Autor de projeto de lei que isentava a obrigatoriedade e foi vetado pela presidente Dilma Rousseff, o deputado federal Alceu Moreira (PMDB-RS) entende que a norma onera o produtor, ainda mais diante da possibilidade de os Estados cobrarem IPVA. Para ele, o governo não resolve a questão por ter interesse na arrecadação extra.
Como alternativa, o deputado sugere um decreto legislativo cassando os efeitos da resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) ou o ingresso do mesmo projeto de lei a partir de fevereiro, quando assume a nova legislatura. No Estado, a Assembleia marcou para quinta-feira uma audiência pública para discutir o tema.
A última opção é pressionar o governo com protestos, ação cogitada por entidades como a Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado (Fetag-RS), que pediu formalmente ao Contran a prorrogação do prazo por 180 dias para que a próxima legislatura do Congresso reavalie.
A posição é compartilhada pelo presidente do Sindicato das Indústrias de Máquinas e Implementos Agrícolas do Estado (Simers), Cláudio Bier. Segundo ele, o custo para as empresas adaptarem as máquinas deverá refletir nos preço de venda.
- Essa determinação é um absurdo, pois a maioria dos agricultores tem lavouras nos dois lados de uma estrada e terá de pagar emplacamento para atravessá-la.
Vice-presidente da Câmara Setorial de Máquinas e Implementos Agrícolas da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Pedro Estevão Bastos ressalta que, além da burocracia, o aumento de custos implica menos investimentos.
Favorável às novas regras, a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) entende que o registro contribuirá para proteger o trânsito e garantir segurança jurídica para agricultores, bancos e seguradoras.
Indústria já se adapta
Enquanto as mudanças dividem opiniões, a indústria está se adequando. O grupo AGCO, fabricante de máquinas das marcas Massey Ferguson e Valtra, começou a instalar em outubro itens obrigatórios nos tratores, como faixas refletivas e mais de um retrovisor. Desde novembro, todas as máquinas saem da fábrica adaptadas às normas.
Gerente de assuntos regulatórios do AGCO, Luis Renato Souza explica que, nos tratores sem cabine, a estrutura para fixar a placa passou de opcional a indispensável. Mas frisa que a maior dificuldade foi se adaptar ao pré-cadastro das máquinas no Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).
Souza afirma que a empresa também se estrutura para dar assistência a quem queira ajustar o trator para cumprir a resolução. Como a maioria dos itens exigidos já fazia parte do produto e os adicionais têm valor baixo no conjunto, ele diz que a mudança não aumentará o preço de venda.
Quase três anos sem definição
- Em 2012, a resolução 429 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) definiu que os tratores devem ser registrados e licenciados, incluindo uso obrigatório de placa traseira, a partir de janeiro de 2013, sob pena de multa e até apreensão.
- Em julho de 2013, nova resolução prorrogou o prazo para 1º de janeiro de 2015. O Contran não especificou, porém, como será a fiscalização nem
a abrangência da regra para os veículos fabricados antes da data.
- Paralelo a isso, o deputado federal Alceu Moreira (PMDB-RS) ingressou com projeto de lei na Câmara, ainda em 2012, que isentava "veículos automotores destinados a executar trabalhos agrícolas" de emplacamento, licenciamento e IPVA.
- Aprovado na Câmara e no Senado, o projeto foi vetado em maio deste ano pela presidente Dilma Rousseff, que alegou ser muito amplo o termo definido pelo deputado, podendo abrir margem de interpretação para que contemple outros veículos.
- No fim de maio, Dilma editou medida provisória prevendo que o emplacamento e licenciamento só deveria valer para máquinas fabricadas a partir de 2014.
O texto ainda previa que motoristas habilitados na categoria B (carros) também pudessem conduzir tratores.
- Apesar de se sobreporem às resoluções do Contran, as novas regras só valeram até o fim de setembro, quando a medida provisória expirou porque não foi votada pelo Congresso.
- O veto da presidente ao projeto de lei de Moreira foi mantido pelo Congresso no fim de novembro. Com isso, voltaram a valer as normas do Contran, como exigência de habilitação nas categorias C, D e E para operar as máquinas.
- Em nota, o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) informou que a resolução só se aplica às máquinas agrícolas fabricadas a partir de 1º de janeiro de 2015, sendo facultativa às que foram feitas antes desta data.