Depois de assistir à migração de fumageiras do Estado para Santa Catarina em meados do anos 2000, o Rio Grande do Sul volta a atrair o interesse dessas empresas.
O investimento mais recente é da CTA-Continental, que havia se transferido parcialmente para Araranguá (SC), em 2008, e que nesta semana teria anunciado o retorno da usina de beneficiamento de tabaco para Venâncio Aires, onde fica a matriz da empresa. Quem confirma a informação é o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias do Fumo, Alimentação e Afins da Região Sul de Santa Catarina, que recebeu uma nota da CTA-Continental nesta sexta-feira. A empresa ainda não se manifestou sobre o assunto.
Outra empresa a fazer movimento de volta é a Universal Leaf, uma das maiores empresas do setor no mundo. Oito anos depois de transferir parte das operações de Venâncio Aires para Joinville (SC), a fumageira selou o movimento de regresso centralizando as operações novamente em solo gaúcho, em Santa Cruz do Sul, fechando a unidade catarinense aberta em 2005.
Antes, ao menos mais uma fumageira havia transferido operações para o Estado vizinho. Em 2010, a Alliance One, que fechou fábrica em Santa Cruz do Sul e seguiu com outra em Venâncio, deslocou parte da produção para Araranguá. A empresa mantém suas atividades por lá.
Entre 2007 e 2009, quem se movimentou geograficamente, mas rumo ao Rio Grande do Sul, foi a Souza Cruz. Com investimento de R$ 300 milhões, transferiu o centro de pesquisas e o complexo gráfico do Rio de Janeiro para Cachoeirinha, onde já tinha uma fábrica.
Quando anunciou a transferência da unidade de Venâncio Aires, município brasileiro que mais produz tabaco, para Santa Catarina, a Universal Leaf Tabacos afirmou que enfrentava dificuldades para resgatar seus créditos de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) gerados pela exportação ao governo gaúcho.
Ainda que as indústrias resistam a detalhar estratégias, muitas contornaram o problema se instalando em Santa Catarina. Com isso, a empresa não teria mais geração de créditos em operação interestadual e receberia, por garantia do governo catarinense, restituição parcial do ICMS de exportação.
Embora o cenário tenha melhorado em termos tributários, a Universal Leaf Tabacos se limitou a informar, em nota, que o retorno ao Estado é uma medida de centralização, que vai permitir a "utilização mais eficiente dos ativos" que tem no Brasil.
Para o Rio Grande do Sul, a volta dos investimentos da Universal Leaf traz diversos benefícios, entre os quais, um aumento na produção de 45 mil toneladas de tabaco (que antes eram processadas em Joinville), geração de 500 empregos temporários na próxima safra e retorno de cerca de 50 funcionários efetivos.
A indústria fumageira - que inclui cigarreira, beneficiadoras e fabricantes de equipamentos para o setor- representa quase 75% da arrecadação de Santa Cruz do Sul, o chamado Valor Adicionado Fiscal (VAF).
No topo das empresas, a Philip Morris é responsável por 45,55%. A Universal Leaf Tabacos ocupa a segunda colocação, mesmo antes de concluir a transferência, representando 10,6% da arrecadação municipal. Como o Estado também fica com parte do ICMS, o governo comemorou a consolidação do setor fumageiro em solo gaúcho. No entanto, o secretário da Agricultura, Luiz Fernando Mainardi, reforçou que o fortalecimento da cultura deve caminhar junto com a diversificação.
A diversificação e a proteção da saúde do produtor foram tema de discussão, nesta semana, da 4ª Reunião do Grupo de Trabalho para os artigos 17 e 18 da Convenção-Quadro da Organização Mundial da Saúde, realizado em Pelotas. O evento reuniu representantes de 18 países.
ENTENDA O CASO
- O problema que estimulou a migração das fumageiras para fora do Estado se iniciou em 1996, com a Lei Kandir - que liberou do pagamento de todos os impostos as exportações de mercadorias, inclusive produtos primários e industrializados semielaborados. No início dos anos 2000, o Rio Grande do Sul passou a restringir o aproveitamento de créditos tributários acumulados na aquisição da matéria-prima em outros Estados.
- No momento em que o tabaco de outros Estados chega ao Rio Grande do Sul, a fumageira paga 12% de imposto ao local de origem para transferir esse tabaco ao território gaúcho. A partir dessa operação, é gerado um crédito de ICMS a recuperar no mesmo valor, e que pode ser abatido em outras compras feitas pela empresa.
- Até o início dos anos 2000, as indústrias tinham aval para negociar esses créditos com outras empresas. As fumageiras os vendiam e conseguiam o retorno do valor pago fora do Estado. No entanto, as negociações foram restringidas pelo governo gaúcho e os créditos passaram a ficar acumulados, e algumas empresas deram início à migração de unidades.
- Em reação a essas perdas, o governo gaúcho começou a aumentar as autorizações de transferências de saldo credor de ICMS para fornecedores e terceiros, por meio de termo de acordo entre as empresas e o Estado, assinado mediante o compromisso das empresas em manter ou aumentar o número de funcionários e de ampliação da planta produtiva, conforme a delegada da Receita Estadual Mônica Figueiredo.
- Flávio Lucas Goettert, vice-presidente de assuntos fiscais do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco, recorda que o ápice ocorreu em 2006 e 2007, quando as empresas tinham créditos acumulados equivalentes a mais de R$ 300 milhões.
- De acordo com Goettert, em 2006 houve a negociação total da dívida e depois cada caso começou ser tratado individualmente. A partir de então, afirma, as negociações e as novas gerações de créditos passaram a ser específicas de empresa para empresa, mas não houve novos grandes acúmulos de ICMS, até pelo deslocamento de unidades para SC.