A atuação do fenômeno El Niño, caracterizado pelo aquecimento da água do Oceano Pacífico subtropical, é apontada como a principal causa para a chuva acima da média histórica registrada em setembro em várias cidades do Rio Grande do Sul. Por conta do fenômeno climático, Porto Alegre registrou durante o mês passado o maior volume de água desde 1916, quando teve início a série histórica. De acordo com o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), no período, choveu 447,3mm na Capital.
A marca é o triplo da média para o mês de setembro, que é de 147,8mm. O recorde anterior foi registrado em maio de 1941, com 405,5mm. O meteorologista Marcelo Schneider, coordenador do 8º Distrito de Meteorologia do Inmet, explica que cidades da Campanha e do Norte apresentaram volume expressivo de chuva. Em alguns casos choveu mais do que o dobro da média do mês, como em Caçapava do Sul (680,6mm), São Gabriel (546,4mm) e Serafina Corrêa (539,4mm).
Schneider destaca que a chuva do início de setembro se concentrou na bacia do Rio Taquari, na região Norte e na Serra. O que provocou uma enxurrada sem precedentes e um rastro de destruição e mortes – ao menos 50 óbitos foram registrados e outras oito pessoas seguem desaparecidas no RS por conta da chuvarada do início do mês.
— A gente já vinha destacando desde abril e maio que o impacto do El Niño haveria de ser forte. A influência dele começaria já no final do inverno. Até agosto tivemos chuvas irregulares, em alguns lugares até abaixo, mas começou o efeito da primavera, quando o El Niño é mais forte, de setembro até novembro, com uma corrente de ar quente úmida da Amazônia que vem e se encontra com o ar frio do Sul — destaca.
Professora da Faculdade de Meteorologia da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), Eliana Klering afirma ressalta, ainda, que na Região Metropolitana muitas cidades registraram volumes de chuva quatro vezes superior à média histórica de setembro, assim como o Vale do Taquari, que sofreu a influência do El Niño e, consequentemente, modificação na dinâmica dos ventos.
— Já tinha essa ideia de que a chuva seria bem acima da média nesse mês de setembro. E isso acabou se confirmando — afirma.
O hidrólogo Pedro Camargo, da Sala de Situação do governo do Estado, afirma que, como setembro teve precipitações acima da média em praticamente todas as regiões, o nível dos rios foi fortemente impactado.
— O que aconteceu no Vale do Taquari foi por conta de uma chuva muito volumosa, praticamente na Metade Norte, na bacia do Rio Taquari. A gente teve depois muita chuva no Centro, Oeste, com muita resposta no Rio Ibirapuiptã, no Rio Santa Maria, em Alegrete, Rosário do Sul e Dom Pedrito — afirma.
Fenômeno El Niño impacta no aumento da temperatura média
O meteorologista da Climatempo, Guilherme Alves, afirma que o fenômeno El Niño impactou no aumento da temperatura média em setembro na comparação com o mesmo período do ano passado. De acordo com o Departamento de Controle do Espaço Aéreo (Decea), em Porto Alegre, a temperatura média ficou em 19,3°C, enquanto em setembro do ano passado foi de 17,6°C.
Alves afirma que esse cenário é em decorrência do efeito do El Niño.
— Essa circulação do El Niño, consequentemente, leva essa alteração nas temperaturas no Brasil como um todo. E no Sul também afeta — destaca.
Maiores temperaturas em setembro no RS
- 37,2 °C - Campo Bom/RS - em 17/09/2023
- 36,4 °C - São Luiz Gonzaga/RS - 83907 - em 23/09/2023
- 35,8 °C - Porto Alegre/RS - em 17/09/2023
- 35,7 °C - Santa Rosa/RS - em 23/09/2023
- 35,5 °C - Torres/RS - em 18/09/2023
Menores temperaturas em setembro no RS
- -0,1 °C - Vacaria/RS - em 15/09/2023
- 1,5 °C - Quaraí/RS - em 14/09/2023
- 1,6 °C - Bagé/RS - em 05/09/2023
- 1,6 °C - Bom Jesus/RS - em 15/09/2023
- 1,8 °C - Cambará do Sul/RS - em 15/09/2023
La Niña e outros fenômenos climáticos
O hidrólogo da Sala de Situação do governo do Estado, Pedro Camargo, destaca ainda o contraste pelo qual o RS passa, uma vez que foram quase quatro anos sob efeito do La Niña. O fenômeno provoca o resfriamento da água do Oceano Pacífico Equatorial, o que acaba por interferir nos padrões de chuva, provocando seca e estiagem.
— Agora a gente passou por El Niño e está sentindo os efeitos. A gente tem um período que foi intensificando a temperatura das águas. Já tem um mês que estamos em El Niño. De modo geral, a primavera já tem um aumento de intensidade e volume de chuvas no Estado. Com esse feito do El Niño tem efeito ainda maior — frisa.
Além dos efeitos do El Niño, o meteorologista do Inmet, Marcelo Schneider, ressalta outros componentes climáticos que têm influência no RS e em parte do Brasil.
— No sul do continente, na parte da Antártica, que a gente chama de oscilação Antártica, teve uma condição favorável à manutenção da passagem de frentes frias que chegaram em setembro, principalmente no Sul. Chegando próximo do RS, cria esse contraste favorável a chuvas em parte do Estado ou do sul do Brasil. E outro componente é o Oceano Índico, que a gente chama de oscilação de polo do Oceano Índico, que está numa componente positiva que é favorável à intensificação do El Niño — afirma.