Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande (Furg) registrou pela primeira vez a presença de gelo marinho no extremo sul da América do Sul, em vales rochosos da Cordilheira Darwin, no Chile. A descoberta foi publicada na revista científica Annals of Glaciology, editada pela Universidade de Cambridge, na Inglaterra.
A pesquisa iniciou após a observação de uma placa de gelo por um passageiro de avião em 2015. Ele fotografou o gelo e enviou ao Centro de Estudios del Cuaternario, Fuego-Patagonia y Antártica (Cequa), instituto de pesquisas chileno que é parceiro da Furg. O estudo contou com o apoio da Marinha do Chile, que sobrevoou a área e, com o apoio de pesquisadores, fez novos registros do mesmo local.
— Estávamos na hora certa e no local certo. O estudo começou a ser feito após uma foto de um passageiro sem pretensão nenhuma. O estudo que concluímos é de extrema importância para a oceanologia das Américas — afirmou o professor de oceanologia da Furg e um dos responsáveis pelo projeto, Arigony-Neto.
Além da observação no local, o estudo conta com imagens de satélite. O trabalho foi desenvolvido pelo oceanólogo Charles Salame para sua tese de doutorado no Programa de Pós-Graduação em Oceanologia (PPGO) da Furg. O pesquisador fez um recorte temporal de 2000 a 2017, cruzando as informações da estação meteorológica mais próxima à cordilheira. Concluiu, graças às imagens de satélite, que a partir de 2015 o gelo marinho tem aparecido no inverno em 12 dos 13 vales rochosos que compõem a Cordilheira de Darwin.
O registro pode ter relação com o aquecimento global. As geleiras, bastante presentes na Terra do Fogo, estão derretendo mais rápido. Isso leva a um adoçamento da água salgada do oceano. Devido à menor densidade, a água doce do gelo derretido flutua sobre a água mais salgada e por isso, há a formação de gelo marinho em temperatura mais alta do que seria necessário em condições de salinidade normais.
Os resultados da pesquisa geram novos questionamentos, como, por exemplo, a regularidade da formação do gelo marinho na Terra do Fogo. Outra questão é em relação à interferência do fenômeno no ecossistema local. Essas perguntas poderão ser respondidas nos próximos anos.
Furg
A Furg se tornou, nos últimos anos, referência em estudos marítimos na América Latina. A universidade tem um grande histórico de pesquisas em oceanografia e também contribui com a logística para a realização de estudos no continente Antártico. Resultado de convênio com a Marinha do Brasil, a Estação de Apoio Antártico (Esantar-RG) realiza apoio com os seus pesquisadores para as missões no continente gelado há mais de 38 anos. A universidade é responsável pela guarda, controle, manutenção e distribuição dos materiais enviados para a Antártica. Anualmente pesquisadores da Furg auxiliam de Rio Grande os profissionais que vão até a estação.
Em outubro do ano passado, a Furg e a Marinha renovaram por três anos o convênio para que a universidade siga operando atividades logísticas do Programa Antártico Brasileiro (Proantar).