Com uma agenda de reuniões com as delegações francesa, alemã e norueguesa, os governadores da Amazônia aproveitam a COP25 do Clima, em Madri, na Espanha, para alavancar a cooperação direta entre doadores internacionais e governos locais.
Para facilitar a interlocução direta, sem passar pelo governo federal, no domingo (8), eles chegaram a articular junto a parlamentares uma carta defendendo o protagonismo dos estados amazônicos no repasse das verbas negociadas na COP25, incluindo a regulamentação do mercado de carbono.
No entanto, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, não assinou o documento, que citava uma "autorização para que o Consórcio Interestadual (da Amazônia) e os Estados associados possam captar junto ao mercado internacional".
— Já não precisamos de autorização. Podemos receber doações e só precisamos informá-las ao governo federal — disse à reportagem o governador do Amapá e presidente do Consórcio Interestadual da Amazônia Legal, Waldez Góes (PDT).
Ele explica que o documento ajudaria a fazer essa conversa com os interlocutores internacionais, "porque há uma cultura de diplomatas manterem as conversas entre os representantes nacionais".
A reportagem acompanhou uma reunião do governador com o francês Pierre-Henri Guignard, enviado especial da Aliança pelas Florestas, criada em setembro pelo presidente da França, Emmanuel Macron.
— Para além do apoio à conservação, precisamos de apoio da comunidade internacional para agenda de oportunidades para quem vive na Amazônia, muitas vezes com fome e sem saneamento básico — disse Góes.
— A Aliança também deve prover recursos para essa agenda de alternativas — respondeu Guignard na reunião, citando como exemplo a substituição do uso do carvão vegetal por energia solar.
O encontro também contou com o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e o conselheiro para assuntos globais da Embaixada da França no Brasil, Kevyan Sayar.
Em um referência sutil ao governo de Jair Bolsonaro, que não chegou a ser citado, as duas partes reafirmaram que a amizade entre Brasil e França é maior que as "questões políticas".
— Foi muito complicado fazer um envio rápido quando a Bolívia aceitou ajuda para combater as queimadas. A Aliança quer facilitar isso — acrescentou Guignard. A Aliança pelas Florestas pretende conectar países doadores com detentores de grandes florestas, especialmente da Amazônia.
— Ao falar com a gente (do consórcio da Amazônia), estão falando com toda a Amazônia, 61% do território brasileiro. E o diálogo pode ser mais produtivo — disse Góes durante a reunião.
Ao longo da COP-25, que vai até sexta (13), governadores e parlamentares da Amazônia devem se reunir também com a Alemanha e a Noruega. Os dois países são os doadores do Fundo Amazônia, bloqueado desde maio.
Segundo assessores do Ministério do Meio Ambiente da Noruega, o diálogo com o governo federal brasileiro também deve seguir, mas os noruegueses reafirmam que, assim como os alemães, não veem nenhuma solução imediata para o Fundo Amazônia.
Os dois países devem caminhar juntos nas análises e manifestações sobre o futuro do Fundo, ainda segundo fontes ministeriais da Noruega.
Os governos estaduais têm protagonizado a busca por cooperação internacional desde que o governo Bolsonaro passou a dificultar a relação com os países doadores, com o bloqueio do Fundo Amazônia e a recusa de doação dos franceses para o combate às queimadas na Amazônia.
No entanto, a vontade dos governos locais de receber os repasses é anterior ao governo Bolsonaro. Eles junto a ONGs, empresas e municípios já pleiteavam que as verbas do Fundo Amazônia não ficassem concentradas no governo federal.
Enquanto o governo federal têm suas aparições reduzidas na COP-25, em um ano sem estande oficial e sem eventos internacionais capitaneados pelo Brasil, os governos estaduais da Amazônia buscam angariar apoio político no evento Amazon-Madrid, que acontece entre terça-feira (10) e quarta-feira (11) paralelamente às negociações da COP.
Além de Góes, participam da COP-25 os governadores Hélder Barbalho (MDB-PA) e Gledson Cameli (PP-AC), além dos vices-governadores Wanderlei Barbosa (PHS-TO) e Otaviano Pivetta (PDT-MT).
*A jornalista viajou a convite do Instituto Clima e Sociedade (ICS).