Os botos de Laguna, no litoral catarinense, que ganharam fama internacional por ajudarem pescadores artesanais a localizar os cardumes de peixes, e que deram à cidade o título de Capital Nacional do Boto Pescador, correm risco de extinção. Este ano, cinco animais foram encontrados mortos e o principal motivo é emalhe em redes ilegais de pesca. Eles ficam presos nos equipamentos ilícitos, principalmente na saída do rio. Ao ficarem presos, não conseguem subir até a superfície para respirar e morrem por afogamento. Órgãos ambientais, pesquisadores e poder público buscam maneiras de fortalecer a fiscalização.
Pesquisadores da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc) que monitoram a espécie Tursiops truncatus no complexo lagunar afirmam que, hoje, existem entre 48 e 50 animais na região. O índice de mortes em 2017, assim como no ano passado, chegou à taxa de 10% e acendeu o alerta. Se nada for feito, a população de botos pode ser dizimada em 10 anos, o que traria perdas não somente para o meio ambiente, mas para quem depende da pesca com o boto para sobreviver.
– A espécie existe em outros lugares do Brasil e do mundo, então não vai se extinguir. Mas a atividade da população de Laguna e as espécies concentradas na cidade podem acabar – alerta o professor de Engenharia de Pesca e Biologia Marinha, Pedro Volkmer de Castilho.
Falta trabalho em conjunto
A Polícia Ambiental da Laguna, responsável pelas ações de fiscalização da colocação de redes, diz não ter condições de fazer um trabalho ostensivo por falta de efetivo. Assim, a fiscalização é feita por meio de denúncias, segundo o sargento Robson Vieira. Ele aguarda o reforço no número de policiais, prometido para o final do ano. Atualmente, quatro profissionais especialistas em fiscalização de pesca percorrem toda a área de abrangência, que vai da região de Imaruí até a cidade de Jaguaruna.
– Alguns pescadores não respeitam a legislação e colocam a rede atravessada de margem a margem do rio, fazendo com que não haja oportunidade de fuga para o animal – explica o sargento.Pelo menos cinco órgãos estaduais e federais poderiam ter trabalhos mais efetivos em relação à preservação do boto. Laguna ainda não tem planejamento para proteger a espécie. A Fundação Lagunense de Meio Ambiente reconhece a falha, mas diz que vai trabalhar para unir todos os órgãos e traçar um plano de ação.
O Ibama em SC diz que não tem ações para o problema, mas reforça que fiscaliza a pesca ao longo do ano em todo o litoral. A Fundação de Meio Ambiente (Fatma) do Estado afirma não ter responsabilidade, mas participa do Programa de Monitoramento da Bacia de Santos. O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), diz que realiza monitoramento em todo o território da APA da Baleia Franca, que vai do Sul da ilha de Florianópolis até o Balneário Rincão.
Pesca artesanal está ameaçada sem os animais
O hábito da pesca colaborativa é repassado de mãe para filho. A morte de duas fêmeas neste ano, além de impactar o nascimento de novos botos, ameaça o futuro da prática. Quem depende dela para garantir o sustento fica preocupado com a falta de cuidados na preservação.
– Quando um deles morre, já faz falta. Tem um sumido aí que era um botinho que nos ajudava muito. Agora parece que estão fiscalizando mais, mas não precisaria perder os bichinhos para agirem – lamenta Paulo Rodrigues dos Santos, que pesca há 15 anos nos Molhes da Barra.
Para o presidente do Sindicato da Pesca de Laguna (Sindipesca), Gilberto Fernandes da Silva, o diálogo é uma maneira de conscientizar o pescador que atravessa a rede, mas é difícil mudar o pensamento. Em visita recente a Brasília, ele esteve com o diretor do Departamento de Registro, Monitoramento e Controle da Aquicultura e Pesca, Mário Palma, e levou algumas demandas do setor, entre elas a preservação do boto.