Mauri Adriano Panitz
Engenheiro civil especializado em Transportes e Trânsito, funcionário aposentado do DNER e ex-diretor técnico da Secretaria dos Transportes/RS
A falta de uma boa política para os transportes, durante três décadas, transformou o acidente de trânsito numa grave epidemia social. Foram décadas que tiveram como consequência mais de 15 milhões de acidentes, 5 milhões de feridos e um milhão de mortos. Considerando o volume de veículos alocados às vias públicas, é mínima a proporção dos envolvidos em acidentes fatais, pois a cada acidente correspondem dezenas de milhões de veículos, que a cada ano passam ilesos no sítio do acidente. Por isso, concordamos plenamente com a assertiva do presidente Jair Bolsonaro, de que a fiscalização eletrônica de velocidade nas rodovias brasileiras é uma "Indústria da Multa", pois a fiscalização de trânsito destina-se a servir e proteger e não a assaltar o usuário.
A polêmica criada na mídia por palpiteiros de plantão e recém-chegados na matéria foi a motivação deste artigo, que escrevi para esclarecer, técnica e conceitualmente, os dois atributos nela envolvidos: a velocidade e a segurança viária. Antes de tudo, cabe lembrar que a seleção de uso de um modal de transporte é função da sua utilidade, definida pelos atributos: economia, conforto, velocidade e segurança viária.
Portanto, a velocidade é um atributo e não uma ameaça no modal rodoviário. A segurança viária não oferecida ao usuário é risco de morte, eis que as nossas rodovias lembram uma paisagem lunar, pelas falhas técnicas, que apresentam na conservação, na sinalização e no trânsito sem a permanente fiscalização ostensiva.
O longo período de governos corruptos fez com que a malha rodoviária nacional ficasse abandonada e seus milhões de usuários, expostos a riscos crescentes, de 4% para mais de 30%. Esse estado de abandono teve como causa a Constituição Federal (CF-88), que desvinculou os impostos financiadores do setor dos transportes, desde 1945.
Milhões de multas por excesso de velocidade são produzidas industrialmente, em níveis distantes dos níveis de velocidade perigosa que causam acidentes. Os excessos de velocidade de 1 a 2 quilômetros além do limite regulamentado são riscos negligenciáveis, pois não representam perigo para ninguém. A norma legal prevê a execução de estudo de velocidade obrigatório nos projetos de segurança viária através de controladores de velocidade fixos e móveis, os quais demonstram que 85% dos motoristas circulam nas rodovias em velocidade inferiores aquela regulamentada.
O longo período de governos corruptos fez com que a malha rodoviária nacional ficasse abandonada. Enquanto isso, Os excessos de velocidade de 1 a 2 quilômetros além do limite são riscos negligenciáveis: não representam perigo.
Essa norma legal não tem sido respeitada, pelo menos desde 4 de novembro de 2004, quando a Assembleia Legislativa criou uma Comissão Especial de Pardais e Lombadas Eletrônicas, de cuja equipe técnica fizemos parte. Nas conclusões aprovadas por unanimidade pelos deputados, pág. 75, consta o seguinte relato: "A utilização de limites de velocidade é uma das estratégias mais usadas para este gerenciamento da operação da rodovia. Entretanto, tais limites são frequentemente definidos de maneira arbitrária, sem estar baseada em estudos técnicos, que levem em conta as condições operacionais, a expectativa dos condutores e dados de acidentes de trânsito. (...) Por esse motivo, se constata uma tendência dos condutores darem pouca atenção a esta sinalização, a menos que seja imposta uma rigorosa fiscalização".
Qualquer falha na sinalização anula todas as infrações, segundo o artigo 90 do CTB, e a falta do policiamento ostensivo favorece e induz as infrações de velocidade, que avolumam o "Caixa da Campanha de Arrecadação Injusta e Ilegal".
Mas essas "autoridades fiscalistas" bem sabem que seria um fracasso a arrecadação somente das infrações de excessos em desabaladas velocidades escandalizadas na mídia, que não representam menos de 1% do total das infrações por excesso de velocidade.