Quatro estudantes do Colégio Marista de Santa Maria, na região central do Rio Grande do Sul, desenvolveram um inseticida à base de bergamota que auxilia no combate ao Aedes aegypti, mosquito causador de doenças como a dengue. Com orientação da professora de Química Josiéli Demetrio Siqueira, o projeto contou com a parceria da vigilância sanitária de Santa Maria, que forneceu amostras de larvas do inseto para testes.
O desenvolvimento da pesquisa que resultou no inseticida começou em julho de 2021. Na época, a professora Josiéli convidou seus alunos para outro projeto na área ambiental, chamado de Tertúlias Ecológicas. Quando as estudantes Ana Carolina Souza, Anthônia Bellochio Goulart, Mariana Gadret e Valentina Fraga, que na época estavam no 1º ano do Ensino Médio, manifestaram interesse, o grupo de estudos já estava com número máximo de participantes. Com isso, a docente teve a ideia de convidar as adolescentes para ingressar em outro grupo de pesquisa, que resultou no Bergacida.
De acordo com Valentina, uma das alunas envolvidas no projeto, a ideia de desenvolver o inseticida partiu de uma observação do grupo sobre o descarte incorreto de resíduos orgânicos na própria escola, até que chegaram na casca de bergamota. A partir disso, professora e estudantes começaram a pesquisar os benefícios do resíduo e chegaram a fontes bibliográficas que apontam efeitos bactericida e antifúngico da casca da fruta.
— A gente já tinha feito essa indicação das cascas de bergamota, e aí eu levei a proposta para as alunas. A partir disso, elas desenvolveram o projeto. Então, na verdade, para mim, é gratificante saber que elas foram atrás, investiram tempo e esforços e fizeram todo passo a passo — contou Josiéli.
Depois da pesquisa sobre as propriedades das cascas de bergamota, o grupo passou a verificar o efeito no combate a larvas e pupas (estágio anterior ao larval) de Aedes aegypti. As alunas instalaram pontos de coleta das cascas na própria escola, e o projeto começou a se desenvolver.
— Até chegar ao inseticida, foram realizados muitos testes, muitos mesmos. O projeto tem mais ou menos um ano, e a gente chegou à proporção adequada do produto, que resultou no ph 5 há mais ou menos um mês — explicou a estudante e integrante da pesquisa Ana Carolina.
Segundo Josiéli, o colégio apoiou todo processo. A iniciação científica faz parte do componente curricular da instituição, com os alunos desde o 1º ano do Ensino Médio inseridos em algum projeto de pesquisa que deve ser desenvolvido ao longo do ano letivo.
— Nós também temos um laboratório de iniciação científica focado em pesquisas que duram mais de um ano, como o caso do Bergacida. Para esse tipo de projeto, a gente tem um horário extra, além das aulas que os estudantes ficam para realizar os testes, para fazer a a inscrição para as feiras — explicou a professora.
Reconhecimento
O Bergacida é um dos projetos finalistas da Feira Brasileira de Jovens Cientistas, que ocorrerá de 23 a 26 de junho. De acordo com Anthônia Bellochio Goulart, uma das integrantes da pesquisa, essa etapa representa a concretização dos esforços do grupo e o reconhecimento do potencial do trabalho.
— Vamos ver os próximos passos. A gente está com muitas expectativas — disse Anthônia.
Ana Carolina relembra que ela e as colegas já se inscreveram em outras feiras científicas, mas é a primeira vez que são classificadas. Para ela, a persistência é um dos segredos:
— A gente tentou algumas feiras ano passado, mas não ganhamos. Dava muito desânimo, porque a gente sabia que nosso trabalho merecia. Ver o que conquistamos hoje é bem gratificante. Demorou, mas chegou.
Da teoria à prática
A professora e as alunas entregaram a versão final do projeto para a prefeitura de Santa Maria na quinta-feira (2). Segundo Josiéli, a equipe de vigilância sanitária se mostrou disponível para continuar apoiando a iniciativa e para promover ações de divulgação com a comunidade.
— A vigilância sanitária e o governo já têm seus próprios métodos para combater o mosquito, como o uso de determinados inseticidas. Eles não podem simplesmente aderir a novos produtos como o Bergacida, mas a nossa ideia é propor uma parceria para divulgação do componente, que pode ser feito pela própria população — explicou Valentina.
Para a aluna, um dos benefícios do inseticida frente a outros é que ele é de baixo custo e, com isso, o combate ao mosquito pode ser uma iniciativa que atinja toda população e não fique concentrada somente nas mãos do governo.
Relação do grupo
Para Anthônia, a pesquisa mudou completamente seu olhar sobre algumas questões, principalmente com relação ao descarte de resíduos.
— Eu passei a ver o mundo de uma forma diferente, porque muitos materiais são descartados incorretamente. A casca da bergamota é um exemplo. Se as pessoas percebessem que tudo que é descartado pode ser reutilizado, contribuiríamos com o meio ambiente e conseguiríamos solucionar muitos problemas.
Ana Carolina destaca o crescimento pessoal que teve nesse período. Para ela, as trocas que teve com as colegas e a professora foram muito enriquecedoras e inesquecíveis.
— Durante esse um ano eu cresci muito como pessoa, porque eu tinha muita dificuldade em trabalhar em equipe. Também aprendi a não desistir, porque uma hora vai dar certo — enfatizou Ana.
Outra integrante da pesquisa, Mariana, explica como se sentiu ao participar de um projeto que contribui com o meio ambiente:
— Eu acho muito gratificante saber que estou fazendo minha parte. Que a gente teve uma iniciativa para tentar ajudar o planeta e é algo muito simples de ser reproduzido por outras pessoas.
Redes sociais
As estudantes criaram recentemente um perfil no Instagram para divulgar a pesquisa e as conquistas obtidas com o projeto. No perfil, vão ensinar como qualquer pessoa pode fabricar o produto à base da casca da fruta.
— No Instagram, colocamos várias informações superlegais, como fazer o Bergacida. Também contamos um pouco da nossa história e como está sendo a repercussão e os desdobramentos da pesquisa — explicou Anthônia.
Como fazer
O Bergacida pode ser feito em casa, por qualquer pessoa. O composto é de baixo custo e utiliza os seguintes ingredientes:
- Cascas de cinco bergamotas;
- Meio litro de água;
- Cinco colheres de sopa de vinagre de álcool.
O primeiro passo é ferver as cascas em meio litro de água por aproximadamente 10 minutos. Depois de deixar a mistura esfriar, é preciso adicionar as colheres de vinagre de álcool. Para utilizar o composto, basta colocar a mistura em um borrifador e aplicar em locais que podem conter larvas e pupas do mosquito.
De acordo com a professora Josiéli, o inseticida tem validade de 20 dias.
Produção: Filipe Pimentel