Os estudantes do 8º ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental Marquês do Herval entram na sala de aula e perguntam:
– Professora, qual é a senha (para acessar a internet)?
Na instituição de Santa Rosa, no Noroeste do Estado, assim como em quase todas as outras escolas da cidade de 74 mil habitantes, a lousa cada vez mais cede espaço à internet. Desde 2017, o poder público, as universidades, os empresários e os empreendedores estão unidos pelo mesmo objetivo: manter um programa envolvendo inovação e tecnologia para todos os professores e alunos das redes pública e privada.
Por meio da Agência de Desenvolvimento de Santa Rosa, uma ação pioneira na região e que engloba representantes voluntários de diferentes setores da sociedade, o movimento Conecta surgiu um ano antes da ação educacional ser formalizada. Segundo o presidente da Agência, o Pró-Reitor da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijuí), campus Santa Rosa, Marcos Paulo Scherer, a entidade passou a se preocupar em aproximar do mercado de trabalho e do empreendedorismo os estudantes e as instituições de ensino. Ao longo de 2016, diferentes setores da sociedade reuniram-se para encontrar uma solução à questão. Esse movimento originou o Conecta Educação, cuja proposta até hoje é usar ferramentas tecnológicas de aplicativos para mudar a forma de pensar e fazer educação. E desde o Ensino Fundamental.
– Estamos inserindo metodologias ativas e conceitos de empreendedorismo na Educação Básica, onde os estudantes são mais propositivos e criativos. Também mudamos o modelo de ensino e aprendizagem para aprendizagem e aprendizagem, onde professores e alunos aprendem juntos. É o que fará a transformação a médio e a longo prazos – explica Scherer.
No primeiro ano da iniciativa, quando 200 professores foram capacitados, a agência arrecadou na própria comunidade os R$ 50 mil necessários para o pagamento de uma instrutora especializada em educação digital. Em 2018, ainda contando com doações, 300 professores foram envolvidos na proposta, que atingiu 2 mil estudantes. Neste ano, o letramento digital chegou a 350 docentes, impactando 2,5 mil alunos.
A mobilização de todas as redes de ensino acabou atraindo os olhares do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), que, a partir de 2020, terá um convênio com a agência para expandir o programa. Além das competências tecnológicas em sala de aula, o Conecta Educação passará trabalhar questões socioemocionais e empreendedorismo nas escolas. Com a parceria, Scherer projeta chegar a 400 professores e envolver outros municípios da microrregião, em um projeto que impactará as atividades de 3 mil estudantes.
Na aula da professora de Ciências Paula Franciele Klock, da Marquês do Herval, depois de inserirem a senha e estarem devidamente conectados, os alunos são convidados a ingressar numa plataforma online na qual participarão de um jogo interativo sobre o sistema cardiovascular. A competição exige agilidade na hora de optar por uma das quatro respostas à questão mostrada no telão.
Os participantes respondem a partir dos próprios celulares. Quem não tem o equipamento recebe um dos três smartphones disponibilizados pela professora – dois deles ela recebeu por meio de doações.
– A tecnologia veio somar muito no aprendizado dos alunos. E também para nós, professores. A gente consegue trabalhar com eles de uma maneira que tenham mais interesse pelo conteúdo. Eles buscam, pesquisam, conseguem produzir trabalhos e compartilhá-los entre os colegas e também comigo. O conteúdo acaba se tornando muito mais significativo para a vida deles porque, quando a gente aprende e gosta, a gente leva para a vida – comenta a professora.
A segunda startup
Outro ponto a ser destacado em Santa Rosa é a existência de três incubadoras funcionando nas instituições de Ensino Superior do município. Scherer também considera importante para a região outras duas incubadoras localizadas em cidades a menos de 30 quilômetros de distância: Três de Maio e Horizontina.
O presidente da agência aponta o sucesso nacional de cinco startups que começaram os negócios nas incubadoras santa-rosenses. Aliás, o movimento não é recente no município. A primeira incubadora foi criada há uma década, no campus da Unijuí, onde os incubados pagam R$ 250 mensais para manter a empresa no local.
É lá que estão incubados pela segunda vez o casal Danieli Rodem e Dirlean dos Santos, sócios-diretores da Avansee, uma empresa especializada em equipamentos que garantem as condições ambientais ideais para o desenvolvimento de plantas e animais em estufas e locais de cuidados de porcos, aves e bois. Sonhadores, os dois sempre se sentiram empreendedores.
Casados há 15 anos, Danieli foi doméstica, auxiliar de produção de uma fábrica e, hoje, é administradora formada, e Dirlean, técnico em mecânica que está cursando Engenharia Elétrica. Em 2016, os dois iniciaram a incubação da primeira empresa, a Hex Sistemas Eletrônicos e Automação, onde criam, desenvolvem, automatizam, implementam e comercializam soluções eletrônicas em produtos e processos industriais. Com a experiência da Hex, perceberam que havia mercado para um produto ainda a ser criado.
Dirlean, então, desenvolveu sozinho o equipamento de controle do ambiente para estufas e criadouros de animais. No ano passado, com outros dois sócios, investiram R$ 100 mil na criação da segunda startup.
O primeiro equipamento já está instalado numa fazenda da cidade e serve como mostruário da empresa. A ideia do casal é deixar a incubadora até o final deste ano já com as duas empresas desenvolvidas e com clientes.
– No mercado da inovação, se você ficar parado pode até desenvolver algo hoje, mas o negócio não vai dar certo amanhã. Aprendemos diariamente o quanto não estávamos preparados para sermos empreendedores sozinhos. A gente sempre acreditou no sonho, na nossa capacidade e no que poderíamos oferecer ao mercado. Mas a incubadora foi crucial nessa fase inicial – detalha Danieli, responsável pela parte administrativa e pela montagem dos equipamentos na Avansee.
Scherer, o presidente da Agência de Desenvolvimento de Santa Rosa, acredita que as incubadoras foram o início do processo de mudança de visão de mercado recorrente na cidade. De acordo com as perspectivas dele, o movimento Conecta dará os primeiros resultados em oito anos, quando os jovens atingidos hoje pela nova proposta em sala de aula estarão no mercado de trabalho e na universidade.
– Talvez, aquele resultado de planejamento lá atrás, com as incubadoras, ampliará o resultado a partir de agora. Ou seja, estamos numa cidade que não para, planeja, prepara e se prepara para o futuro. Não temos como ganhar nada de ninguém e não vamos ficar esperando ganhar nada de ninguém. Nós mesmos vamos fazendo o nosso desenvolvimento acontecer – finaliza Scherer, confiante.
Ambiente de inovação – Santa Rosa
O que é? O município tem três incubadoras, uma agência de desenvolvimento e aposta no letramento digital dos professores da rede de ensino.
Qual a importância? A Agência de Desenvolvimento é a pioneira na região a unir poder público, universidades e empresários e empreendedores. Ela fomenta os negócios inovadores da região e foi responsável por criar o movimento Conecta Educação, de onde surgiu o projeto de letramento digital. As três incubadoras existentes nas universidades têm, pelo menos, cinco startups que trabalham com produtos que alcançam todo o Brasil.
Quantas pessoas participam do projeto? Em 2019, o letramento digital atingiu 350 professores e 2,5 mil alunos. Em 2020, a meta será incluir outras cidades no projeto e ampliar para 400 docentes e 3 mil estudantes.
Outras informações: adsantarosa.org.br.