Os sete homens presos na manhã desta terça-feira (14) seriam, de acordo com as investigações da Operação Accelerare, lideranças neonazistas brasileiras, articuladas nacionalmente e sob conexões com os dois mais atuantes grupos extremistas da atualidade no mundo. Um deles articula células ultranacionalistas em países da Europa. Outro, centraliza o discurso radical de ultradireita nos Estados Unidos, tendo participação em atos antidemocráticos como a invasão ao Capitólio, sede do congresso norte-americano, após a derrota eleitoral de Donald Trump em 2021.
— São homens jovens, com idades entre 20 e 40 anos, supremacistas brancos, que seguem as ideologias fascista e nazista, propagam misoginia, racismo, separatismo e outras expressões de ódio e preconceito — descreve a delegada Tatiana Bastos, coordenadora das investigações no Rio Grande do Sul.
Segundo a delegada, os sete presos também atuariam como disseminadores de material ideológico e recrutadores de jovens no Brasil. Além do aliciamento e da cooptação de "soldados extremistas", os investigados ainda são suspeitos de praticar ameaças contra autoridades públicas e ativistas de direitos humanos que enfrentam os discursos de ódio nas redes sociais.
Tatiana Bastos explica que a identificação dos perfis e papeis exercidos na rede criminosa ocorreram após apreensão de computadores e celulares nas duas primeiras etapas da Accelerare, a partir do primeiro semestre deste ano.
— Com a análise dos conteúdos e da comunicação feita por estes dispositivos, conseguimos mapear uma verdadeira rede com milhares de conexões nacionais e internacionais, com tentáculos na deep web, criação de fóruns clandestinos para doutrinação política extremista e até encenação ritualística de práticas e simbologias — conta a delegada.
Conforme Tatiana, em alguns dos fóruns clandestinos, os participantes envergam fardas militares alusivas ao período de dominação fascista e nazista na Europa, executando cumprimentos característicos dos movimentos ultranacionalistas que provocaram a Segunda Guerra Mundial.
— É algo extremamente preocupante. Por isso desencadeamos esta operação, que é a maior ofensiva contra a articulação extremista já realizada pela polícia gaúcha. Isso ocorre em um momento no qual o cenário mundial de conflitos acirra sentimentos de adesão à barbárie, trazendo ameaça real a minorias e grupos étnicos, como a comunidade judaica no Brasil. Nosso trabalho busca inibir este tipo de adesão e desarticular as lideranças que podem promover tal violência — pontua.
Ação em quatro Estados aponta amplitude da rede neonazista
A ação deflagrada nesta terça-feira, de acordo com os investigadores, demonstra a amplitude da rede neonazista no Brasil. Dos nove mandados de prisão, sete foram efetivamente cumpridos em Porto Alegre, Novo Hamburgo, Canoas (2), Capão da Canoa e Pantano Grande, no RS; e em Fortaleza (1), no Ceará. Dois outros seriam efetivados em São Paulo, mas os alvos não foram localizados.
Além das prisões, mandados de busca e apreensão reforçam o caráter de articulação das células neonazistas. Materiais como fardas militares, armas e simulacros referenciais da Segunda Guerra, livros, panfletos e manuais foram capturados em Curitiba, no Paraná; em Ribeirão Pires, Araçoiaba da Serra e na cidade de São Paulo, no Estado paulista; e também nas cidades gaúchas de Gravataí, Guaíba, Venâncio Aires, Novo Hamburgo, Canoas, Pantano Grande e Capão da Canoa.
O material será submetido a perícia e exames para identificação do uso para disseminação ideológica. Contudo, os investigadores consideram preponderante a nova leva de apreensão de equipamentos de comunicação e informática, pela qual esperam estabelecer novas conexões e identificar outras células e lideranças atuantes no país.
Em Fortaleza, livraria servia de fachada para produção panfletária
Durante a execução dos mandados, a polícia chegou a uma unidade da rede que seria responsável pela produção de manifestos ideológicos distribuídos entre as células e utilizados na doutrinação dos soldados extremistas.
— Esta unidade funcionava em uma livraria legalizada, localizada na capital cearense, que serviria de fachada para ocultação, impressão e distribuição de literatura neonazista — indica a delegada Tatiana Bastos.
Para a delegada, o aprofundamento das investigações sobre esta livraria poderá apontar um dos centros de propagação do ideário extremista no país.
— Acreditamos que a apreensão feita no local representa apenas uma parte do conteúdo produzido e distribuído entre os grupos. Esperamos encontrar mais material a partir dos desdobramentos da ação efetuada nesta terça — revela a delegada.