A Justiça Federal condenou a concessionária CCR ViaSul e a União a pagarem uma indenização de R$ 20 mil para um homem e uma mulher que tiveram o carro atingido por uma pedra quando se deslocavam pela Freeway em direção a Porto Alegre, em 2022. A decisão do juiz Fábio Vitório Mattiello, da 4ª Vara Federal de Porto Alegre, foi publicada na terça-feira (14). Cabe recurso junto ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).
A ação foi movida contra a União, a CCR ViaSul e a Empresa de Transportes e Circulação do Município de Porto Alegre (EPTC). Segundo a denúncia, o casal trafegava de carro pela Avenida Castelo Branco quando, sob a ponte do Guaíba, já no trecho da BR-290 (Freeway), em janeiro de 2022, uma pedra atingiu o para-brisas do veículo.
A designer Paola Szulczewski, 30 anos, estava na carona da Duster Oroch conduzida pelo marido, Felipe Fortes, 30, quando aconteceu o ataque. O casal residia em Canoas, na Região Metropolitana, mas seguia para a Capital para buscar os dois filhos que estavam na casa dos avós. Por volta das 21h30min, cruzaram pela antiga ponte do Guaíba, quando a pedra atingiu o capô do veículo e, na sequência, colidiu contra o para-brisas, estilhaçando o vidro dianteiro.
O casal estacionou o veículo na margem da via e fez contato com a Polícia Rodoviária Federal (PRF). O registro foi realizado no local pela Brigada Militar. À época, Paola disse que outros motoristas também pararam no acostamento, relatando terem sido alvo dos mesmos criminosos, entre eles uma ambulância e um motorista de aplicativo.
Paola comenta que mesmo com a decisão favorável, que deve cobrir os prejuízos sofridos, o trauma e a falta de segurança na via permanecem. Além disso, ela lembra de outros casos semelhantes que ocorreram na mesma época, resultando, inclusive, em uma morte.
— Agora estamos há um ano morando em Florianópolis, mas a gente fazia sempre esse trajeto. No último feriado ainda passamos pelo local e toda vez que passamos por ali ficamos preocupados, porque não tem nenhuma grade de proteção, continua igual — comenta.
Advogados apontam falta de segurança
Os advogados do escritório Barbosa & Schröder, que representam as vítimas, afirmam, em nota, que esta foi uma "importante decisão judicial em favor da sociedade, que sofre tanto com a insegurança" e que "a manutenção e administração de vias públicas é de responsabilidade do Estado, que deve propiciar condições seguras de tráfego aos cidadãos". Eles acrescentam que "os graves incidentes ocorridos não foram fatos isolados."
Eles também dizem que esperam "que esta decisão sirva como caráter pedagógico, de forma que o órgão administrador da rodovia implemente medidas efetivas que eliminem os riscos a todos que trafegam naquele trecho da rodovia BR-290."
Em juízo, a União defendeu que a manutenção das estradas federais é de responsabilidade do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). Já a EPTC argumentou que não cabe à instituição a segurança da rodovia federal, sendo responsável somente pelo controle e fiscalização do trânsito da Capital.
Sobre a decisão
Em sua análise, o juiz reconheceu que a EPTC não teria legitimidade para responder por esta ação. Mattiello observou que as provas confirmaram que o fato ocorreu em trecho sob concessão da CCR ViaSul e que o veículo pertencia aos autores da denúncia.
“Considerando que o serviço da concessionária consiste em viabilizar a mobilidade e circulação de pessoas e bens, sua responsabilidade se limita ao oferecimento de condições adequadas de trafegabilidade, sendo oportuno afirmar que a segurança da rodovia é um dos elementos essenciais para resguardar um trânsito de veículos ordenado”, salientou o juiz na decisão.
O magistrado pontuou que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que as concessionárias respondem por acidentes causados por animais na pista, pela existência de corpos estranhos na rodovia que foi a origem de acidente automobilístico e, inclusive, por atropelamento de pedestres que atravessavam a rodovia.
Matiello ressaltou que, no caso em questão “os autores sofreram uma violência praticada por terceiros, consistindo em crime de dano consumado, mas que poderia ter ocasionado lesão corporal e até mesmo a morte das vítimas”.
Ele também lembrou que episódios semelhantes aconteceram anteriormente e que a “concessionária tomou ciência da ocorrência de tais acontecimentos - os quais ocorreram com certa frequência e, inclusive, envolveram o óbito de vítimas - e não adotou precauções mínimas para evitar a repetição de tais delitos, como patrulhamento e fiscalização, colocação de câmeras de segurança, ou, até mesmo, a instalação de telas de proteção para, ao menos, dificultar a ação criminosa, entendo que assumiu a responsabilidade por negligência. Em outras palavras, o ato praticado pelos criminosos não era imprevisível, nem inevitável, de molde a afastar o dever de indenizar”.
Dessa forma, a CCR e a União foram condenadas ao pagamento de R$ 1.840 como indenização por danos materiais e R$ 10 mil a cada uma das vítimas por danos morais. Cabe recurso ao TRF-4.
Contrapontos
Procurada pela reportagem, a CCR Via Sul informou que não comenta decisões judiciais.
O DNIT informou que o trecho onde os fatos ocorreram não está sob sua administração e que, pelo fato de ser uma rodovia concedida, os questionamentos deveriam ser encaminhados à ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres). A reportagem contatou o órgão e foi informada, em nota, que deveria contatar a concessionária e que "a agência é responsável por regular as atividades de exploração da infraestrutura rodoviária federal e fiscaliza a execução dos contratos de concessão das rodovias federais entregues à iniciativa privada, entre outras atribuições".
O texto diz também que "a agência se solidariza com a vítima e orienta que os usuários que se sentirem prejudicados ou que queiram fazer sugestões, denúncias ou reclamações, que façam o registro por meio da Ouvidoria da ANTT, para um direcionamento da fiscalização e demais medidas legais cabíveis. O registro pode ser feito pelos canais: WhatsApp (61) 99688-4306, telefone 166 ou pelo e-mail ouvidoria@antt.gov.br".
A EPTC se manifestou por meio de nota, informando que "não tem competência para fiscalizar o trânsito no local onde ocorreu o incidente. No entanto, a Prefeitura colabora com os órgãos competentes em ações regulares para minimizar os riscos deste tipo de ocorrência." O texto diz também que o órgão "possui uma câmera de monitoramento com alcance para o trecho e colabora com as polícias para identificar atitudes suspeitas." A nota acrescenta que "o Departamento Municipal de Limpeza Urbana (DMLU) faz limpezas regulares nos canteiros no entorno da BR-290 na chegada à Capital para a retirada de pedras ou objetos que possam ser arremessados nos veículos em atitudes criminais".