Bem-vestido, ele se aproxima e puxa conversa. Elogia os produtos, fala que sempre está pela Redenção. Pede três cachorros-quentes e se senta para comer. Na sequência, pede que a comerciante que o atendeu leve um dos lanches para a esposa dele, enquanto ele come. Diz que a companheira precisou ficar no carro com o filho recém-nascido, que está doente. Enquanto a vendedora vai até o veículo indicado, onde estaria a esposa – na verdade, apenas um carro estacionado, vazio –, o homem age rápido. Em menos de um minuto furta dinheiro, bolsa e celulares.
É assim que atua um criminoso que tem agido no Parque Farroupilha, também conhecido como Redenção. Os alvos são comerciantes mulheres que trabalham em carrocinhas de cachorro-quente próximas ao Monumento ao Expedicionário, entre um recém-inaugurado posto avançado da Guarda Municipal e o Posto Bom Fim, da Brigada Militar. Chegaram à reportagem dois relatos de casos semelhantes, possivelmente cometidos pelo mesmo ladrão, ocorridos ao longo do mês de outubro.
Uma das vítimas, uma imigrante angolana que começou a trabalhar no local há três meses, foi lesada em R$ 1,6 mil. Elizabeth Fernanda Chaves, 42 anos, conta que o valor seria usado para pagar contas, comprar insumos e para enviar a parentes que ainda residem no continente africano.
— Ele levou minha bolsa que ficava dentro do carrinho de cachorro-quente em um esconderijo. No interior dela tinha dinheiro que eu ia utilizar para pagar prestações de lojas, que mesmo sabendo da minha situação seguem cobrando juros — explica a comerciante.
— Pensei que ele estava precisando de ajuda, falou que a esposa estava no carro com o bebê deles, que estava doente. Não pensei que era uma pessoa do mal — lamenta.
Registro na polícia
A vítima registrou boletim de ocorrência junto ao 9º Batalhão de Polícia Militar (9º BPM). O caso será encaminhado para a 17ª Delegacia de Polícia Civil de Porto Alegre, que é responsável pela área onde ocorreu o crime, e deve ser investigado como furto qualificado mediante fraude.
De acordo com a Brigada Militar, apesar de a Redenção possuir 26 câmeras de monitoramento, operadas pelo Posto Avançado da Guarda Municipal, nenhuma delas flagrou a ação. Responsável pelo batalhão, o tenente-coronel Fábio da Silva Schmitt afirma que somente este caso foi registrado.
— Atuamos na Redenção com uso de bicicletas e motocicletas, sete dias por semana. Esse tipo de crime é de difícil flagrante, mas, mesmo assim, é muito importante que a população faça o registro. É baseado nos registros que a Brigada Militar distribui seu efetivo, seus agentes e viaturas — explica Schmitt.
Saiu sem pagar e furtou celular
A segunda vítima registrou um boletim de ocorrência online. Proprietária de uma carrocinha estabelecida há 20 anos na esquina da Avenida José Bonifácio com a Rua Vieira de Castro, Olga de Fátima Braga da Silva, 57 anos, alega ter sido vítima do mesmo golpista duas vezes.
Da primeira vez ele pediu três cachorros-quentes. Enquanto a vítima preparava o terceiro, ele foi embora sem pagar. Olga explica que muitos feirantes que participam do brique da Redenção acabam pagando depois, que é uma prática comum, especialmente aos finais de semana. Na segunda vez, ele pediu três quentões. Enquanto Olga servia a bebida, ele furtou o celular dela, que estava dentro da carrocinha.
Segundo ela, o prejuízo foi de R$ 1,7 mil do telefone furtado e R$ 180 que o suspeito conseguiu movimentar por meio de um aplicativo bancário instalado no celular.
— Confiamos nos nossos clientes, temos um senso de coletividade nesse lugar. Ele é muito gentil, bem-vestido, usa camisa polo. Enquanto conversa, te olha no olho, mas é tudo enganação. Tu vira as costas, ele te rouba. A sensação é de muita raiva. Eu estava trabalhando, ele chegou na mão grande, pegou meu celular e levou. Se adonou do que era meu, do que eu estava trabalhando para pagar. É horrível — conta Olga.
Classificado como furto simples, o caso também será investigado pela 17ª Delegacia de Polícia Civil de Porto Alegre.
— Teve uma equipe hoje (nesta segunda-feira) no local, verificando a questão de câmeras de vigilância, e não existe imagens para essa ocorrência. Só o que nós temos é um furto de celular de uma carrocinha que funciona nos finais de semana. Sem a possibilidade de recuperação dessas imagens, tentaremos uma outra coisa — explica o delegado Daniel Ordahi, titular da 17ª DP.
Produção: Maria Stolting