Décadas de experiência como bancário não permitiram que um aposentado desconfiasse que falava com golpistas e não com a central de segurança do banco. O morador da Grande Porto Alegre foi vítima de uma fraude por telefone, que resultou num prejuízo de R$ 50 mil. É o chamado golpe do 0800, da falsa central telefônica ou mesmo da mão fantasma.
Nesta quarta-feira (30), a Polícia Civil do RS desencadeou em São Paulo uma operação que tem como alvo suspeitos de integrarem um grupo criminoso responsável por movimentar pelo menos R$ 4 milhões nesse tipo de estelionato.
Um dos casos investigados pela Polícia Civil, que resultou na Operação Linha Cruzada, é o do aposentado. Há pouco mais de dois meses, ele recebeu um contato de SMS pedindo para que preenchesse dados para acumular pontos em compras. O bancário preencheu dados simples como nome e CPF. No dia seguinte, recebeu um telefonema, da falsa central de segurança do banco, que resultou no prejuízo de mais de R$ 50 mil.
— Atendi porque dizia ali que era a central do meu banco, senão eu não teria atendido. Aquele número é falso. Se puderem, te deixam na miséria, te deixam sem nada. Não estão nem aí. É uma coisa apavorante. Não se contentam em tirar R$ 10, 20, querem tirar tudo. Se veem mais, querem tirar tudo — relata.
O golpista relatou ao aposentado que havia sido constatada uma tentativa de saque de uma aplicação mantida por ele. O atendente pediu que ele entrasse no aplicativo do banco e verificasse a situação, e foi isso que ele fez.
— Olha e não tem movimentação nenhuma. Está tudo bem. Então ele diz que agora vão tentar bloquear a movimentação. É tudo muito profissional, até no falar deles, o vocabulário que eles utilizam. Tu não está nem imaginando que pode ser um golpe — recorda.
Logo depois, solicitaram que baixasse o módulo de segurança do banco. Mas tratava-se de um aplicativo que passou a rodar no celular e impedir que ele acessasse a conta.
— Aí eles passam a acessar tua conta, e tu está ali vendo e não pode fazer nada — conta.
Os estelionatários passaram a fazer transferências para outras contas, retirando os valores que estavam em uma aplicação. O bancário desligou o telefone e logo depois recebeu uma nova ligação, pedindo para que ele acessasse a conta por um computador. Mais uma vez, pediram para que ele baixasse outro aplicativo, de controle remoto do computador. Como havia antivírus baixado, ele não conseguiu acessar, e a senha acabou bloqueada.
— A pessoa fala exatamente com o padrão de uma central de atendimento, quando uma instituição te liga oferecendo cartão ou outro serviço. E jamais eles pedem pra fornecer senha, nem nada, porque eles não precisam. Quando baixam esse falso módulo de segurança, conseguem captar tua conta e tua senha, tudo mais — diz.
O golpista pediu ainda que a vítima fosse até uma agência para desbloquear a senha no terminal eletrônico. O sistema, no entanto, não aceitou o desbloqueio e, em razão disso, o cliente resolveu falar com um atendente. Foi neste momento que ele descobriu que se tratava de golpe. Depois disso, descobriu que havia duas transferências, e fez o boletim de ocorrência na Polícia Civil.
— Fica aquela ansiedade, sem dormir, fica preocupado e até depressivo. Daqui a pouco, vai precisar desse dinheiro amanhã e aí, o que que faço?
No dia seguinte, recebeu uma nova ligação, pedindo para continuar com a operação. Mas dessa vez o aposentado disse que só falaria com gerente e desligou o telefone.
— Trabalha anos a fio, junta algum dinheiro. É um valor que está guardando, para algum gasto futuro que vai ter, e daqui a pouco eles te levam tudo, do nada. Fica muito inseguro com isso. E o nível de profissionalismo é impressionante. Eles não pediram dado nenhum, pediram par abaixar o programa. E quando baixa, eles conseguem pegar tudo — explica.
Após o golpe, o aposentado passou a não atender mais números desconhecidos e diz que ficou desconfiado de tudo. Além disso, lida com os sentimentos de culpa, por ter perdido um valor que pretendia usar para os estudos dos filhos e cuidados médicos de um familiar, e a incerteza se conseguirá reaver esses valores, por meio do banco.
— A gente está sempre com medo. A verdade é essa. Está sempre cuidando tudo, desconfiando de tudo, acaba entrando quase que numa depressão. Desconfia de tudo e de todos, não confia em mais ninguém. Até pedir desculpa para esposa e minha família. Jamais pensa que vai cair numa coisa dessas. Não existe mágica, o dinheiro não cai do céu. Fica com total sentimento de culpa — desabafa.
Como funciona o golpe
- A vítima recebe um SMS informando que há uma transferência da sua conta ou compra no cartão de crédito e caso deseje contestar deve entrar em contato pelo número de 0800 indicado na mensagem.
- Em alguns casos, o contato é feito diretamente pelo golpista, que já afirma ser funcionária da área de segurança do banco. Usa várias abordagens para enganar o cliente: informa que a conta foi invadida, clonada, que há movimentações suspeitas, entre outras artimanhas.
- As vítimas acreditam que, de fato, estão falando com sua instituição financeira em razão do número de 0800 e da simulação. Na falsa central, a vítima ouve um atendimento eletrônico e, em seguida, o falso atendente cita o nome do banco.
- O criminoso solicita então que a vítima verifique a conta bancária e pede que ela em seguida instale alguns programas no celular e baixe um aplicativo, para manter a segurança da sua conta. Um desses aplicativos permite o acesso remoto, por meio do qual golpista passa a ter controle do celular da vítima.
- Após, ele afirma que fará a proteção do telefone e passa a utilizar o aplicativo bancário para fazer transferências para outras contas. Quando a vítima se dá conta, o dinheiro já foi pulverizado para outras contas.
Fique atento
- Se receber esse tipo de contato por ligação ou SMS, desconfie na hora
- Os bancos não realizam esse tipo de contato, solicitando aos clientes para baixarem aplicativos
- Desligue o telefone, se for uma chamada, e entre em contato com o banco por meio dos canais oficiais e de um outro telefone
- Caso seja vítima, entre em contato com seu banco imediatamente e registre o fato na Polícia Civil. É possível fazer isso diretamente em uma delegacia ou pela Delegacia Online
Fonte: Polícia Civil e Febraban