Além da perda de um ente querido, uma família de Osório, no Litoral Norte, enfrenta uma situação delicada por um erro no Departamento Médico Legal (DML) de Porto Alegre. Após o falecimento de Jorge Antônio Nascimento e Silva, 52 anos, provavelmente por problema hepático, no domingo (17), o corpo teve de ser transferido para a Capital, por falta de médico-legista em Osório.
Familiares foram chamados para fazer reconhecimento da vítima no DML, procedimento que só foi possível nessa terça-feira (19), e se surpreenderam com a informação de que o corpo teria ferimentos causados por arma de fogo. Na verdade, no entanto, tratava-se do cadáver de outra pessoa. Para piorar, os parentes de Nascimento e Silva foram informados de que o corpo dele já foi sepultado, em Porto Alegre, como sendo de outra pessoa.
O Instituto-Geral de Perícias (IGP), que responde pelo DML, confirma o equívoco e informa que toda a assistência está sendo prestada aos familiares, além de ter instaurado um procedimento interno para apurar as responsabilidades.
A cozinheira Michele Silva, 33 anos, conta que o pai morava em uma casa no mesmo pátio da residência dela, mas aos fundos, e que, no domingo, foi levar o almoço para ele e o encontrou caído no chão da moradia. Vizinhos a ajudaram e o Samu foi acionado, mas Silva já havia falecido. A causa da morte, segundo Michele, foi uma hemorragia abdominal hepática. Ela diz que o pai estava desempregado, sofria de depressão e enfrentava problemas com o alcoolismo.
Transferência para a Capital
Michele diz que foi informada que não havia médico-legista disponível em Osório e, por isso, seria necessário transferir o corpo do pai para Porto Alegre, para a necropsia, que confirmaria a causa da morte. O acompanhamento de um familiar era necessário no DML da Capital. Para agilizar o processo, o irmão de Jorge Nascimento e Silva foi acionado, mas o reconhecimento por ele não foi aceito, já que ele não era filho do mesmo pai e da mesma mãe da vítima. Michele, então, foi ao local, mas conta que não conseguiu realizar o procedimento por falta de documentação exigida e também pela necessidade de pagar taxas, com as quais ela não conseguiu arcar prontamente. A situação, que envolveu deslocamentos entre Porto Alegre e o litoral, teve o desdobramento completamente inesperado nessa terça-feira.
Reconhecimento do corpo
Contatada por servidores do DML na Capital, a respeito do reconhecimento do pai, Michele ficou surpresa com o que ouviu.
— Me perguntaram se eu realmente teria condições de reconhecer o meu pai, devido aos vários disparos de arma de fogo, já que estava muito machucado. Mas eu disse: não, meu pai não levou tiro, não era o corpo dele. A moça viu que tinha algo errado, chamou outra e nos comunicaram que havia ocorrido um erro com papéis e pediram para que a gente esperasse. Aí fomos falar com o diretor e nos informaram que havia ocorrido a troca dos corpos. Meu pai havia sido levado por outra família e já havia até sido enterrado — explica Michele.
Ela retornou para Osório e foi orientada a voltar nesta quarta-feira (20) para o DML, para que, desta vez, o corpo do pai dela fosse entregue. Ela ainda não sabe como irá proceder, mas acredita que a situação, por ter se estendido por vários dias, a impedirá de velar o pai.
O que diz o DML
Em nota, o DML confirma o engano e diz que todas as providências estão sendo tomadas.
Leia na íntegra:
“O DML está providenciando todo o andamento jurídico necessário para entregar o corpo aos familiares, o que deve ser nesta quarta-feira. A família está recebendo o suporte necessário, e foi recebida pela direção do Departamento, que manifesta profundo pesar pelo engano. Um procedimento interno vai ser instaurado para apurar responsabilidades, com possíveis penalizações”.
IGP vai investigar o caso
Em coletiva de imprensa realizada na sede do DML na tarde desta quarta-feira, a diretora em exercício do IGP, Marguet Mittmann, afirmou que ocorreu uma série de erros do órgão. O corpo foi devolvido aos familiares por volta de 16h30min desta quarta-feira. Segundo ela, o IGP prestou apoio no translado do corpo até Osório.
A diretora ressaltou que a instituição não compactua com os erros ocorridos e garante que haverá uma apuração rígida com abertura de procedimento administrativo. Segundo ela, o caso já foi encaminhado à corregedoria do órgão. Ela explica que administrativamente podem ocorrer punições que vão de advertência até uma possível demissão.
— Vamos verificar se houve erros técnicos, erros humanos. Se houve envolvimento de outra instituição. Todos esses fatos que culminaram neste triste momento, vamos precisar de um certo tempo para fazer todas as averiguações dentro do DML — diz.
Segundo ela, imediatamente após a identificação do erro foram realizados todos os procedimentos necessários, começando pela petição ao Judiciário para a exumação do cadáver e devolução aos familiares.
A diretora explicou que o posto de Osório não estava funcionando devido à escala dos profissionais que revezam com a equipe de Porto Alegre em alguns dias. Ela afirma também que o outro corpo já foi encaminhado para a família.
— É a primeira vez que isso acontece aqui no DML. Temos um volume em torno de 300 necrópsias mensais. Infelizmente ocorreu esse equívoco, nós lamentamos muito, não gostaríamos que tivesse ocorrido. Foi um caso isolado.