Há três meses, uma visita de Felipe Morais da Silva, 33 anos, à Capital terminou de forma trágica. Morador de Farroupilha, na Serra, o farmacêutico foi assassinado a facadas durante uma briga na orla do Guaíba ao amanhecer de 16 de janeiro. Um ambulante foi indiciado pela Polícia Civil pelo crime, e o caso segue sob análise do Ministério Público.
A investigação realizada pela 6ª Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) concluiu que o ambulante cometeu homicídio doloso, ou seja, quando há intenção de matar. Segundo o delegado Newton Martins de Souza Filho, foram identificadas ao longo da apuração pelo menos 10 pessoas com envolvimento na briga que resultou no crime. No entanto, somente um dos envolvidos deve responder pelo assassinato.
— Os demais responderiam por lesão corporal, caso houvesse representação por parte dos agredidos. Estes têm seis meses a partir do fato para representar em juízo — explica o delegado.
Quando foi ouvido, acompanhado de advogado, o ambulante admitiu ter cometido o crime. No entanto, alegou que atingiu o farmacêutico com as facadas para se defender. O investigado relatou que estava trabalhando na Orla no fim daquela madrugada, quando tentou fazer com que a vítima e seus amigos parassem de perseguir outros dois homens, e acabou sendo agredido. Em sua versão, pegou uma faca e atingiu a vítima em legítima defesa.
A polícia entendeu, no entanto, que o crime não se deu nessa circunstância, pela desproporcionalidade entre a agressão e o crime, e indiciou o ambulante por homicídio doloso com a qualificadora de impossibilidade de defesa da vítima. Segundo o delegado, o farmacêutico estava de costas no momento em que foi atingido pelos golpes. Isso levou a investigação a concluir que ele não tinha como se defender do crime. O nome do ambulante não foi divulgado pela polícia, que afirma que não havia requisitos legais para pedir a prisão dele.
Além dos envolvidos na briga, a Polícia Civil também apurou a conduta dos policiais militares que estavam na Orla no momento da confusão. Isso porque, inicialmente, houve relato por parte dos amigos da vítima — um grupo de motociclistas do qual ele fazia parte — de que os PMs não teriam agido para impedir a briga e o crime. Conforme o delegado, após analisar imagens de câmeras de segurança e de vídeos gravados por populares, além de ouvir todos os depoimentos, não foi constatada nenhuma irregularidade.
— Os policiais militares acionaram reforço, em razão da dificuldade de enfrentamento, e chamaram o socorro médico — afirma Souza Filho.
O andamento do caso agora depende do entendimento do Ministério Público sobre o crime. O inquérito ainda está sob análise e o MP deve decidir nos próximos dias se denuncia ou não o ambulante pelo crime de homicídio doloso qualificado. Caso ele seja denunciado, caberá ao Judiciário aceitar ou não a denúncia, se entender que existem elementos para isso. Em contato com GZH, a 3ª Vara do Júri informou que ainda não houve denúncia, e que o processo se encontra momentaneamente sob sigilo, por isso não foram repassadas mais informações sobre o caso.
O crime
Felipe Morais da Silva era morador de Farroupilha, na Serra, mas estava em Porto Alegre para um encontro com amigos, e pediu para que fossem até a Orla naquela madrugada — ele não conhecia o local. Ali, segundo o que a polícia apurou, um homem teria esbarrado na namorada de um deles. Em razão disso, iniciou-se uma discussão e perseguição. Na sequência, os ambulantes teriam tentado intervir, o que teria resultado em novo desentendimento e na briga.
A vítima foi atingida por pelo menos três golpes de faca durante a confusão — o objeto não chegou a ser entregue à polícia. O Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) foi acionado e uma técnica em enfermagem que estava no local ajudou nos primeiros atendimentos, mas o farmacêutico não resistiu. Quando ouvidos pela polícia, os ambulantes relataram que permaneceram no local até a chegada do socorro. Nenhum deles possui antecedentes.
Silva, que estava com a namorada na Capital, morava na Serra com o filho de seis anos — o menino já havia perdido a mãe em acidente de carro há quatro anos. Além de farmacêutico, ele era praticante de artes marciais e chegou a representar o Brasil em campeonatos internacionais, na Colômbia, no Japão e no Chile, em disputas de kudô (arte marcial japonesa), nas quais acumulou vitórias. O corpo dele foi sepultado em Paraí, município da Serra, de onde era natural.