O Ministério Público (MP) denunciou nesta terça-feira (17) a mãe e a madrasta do menino Miguel dos Santos Rodrigues, sete anos. No dia 29 de julho, Yasmin Vaz dos Santos Rodrigues, 26 anos, confessou ter matado o filho e jogado o corpo dele nas águas do Rio Tramandaí, em Imbé, no Litoral Norte. Ela e a companheira, Bruna Nathiele Porto da Rosa, 23, estão detidas.
O MP entendeu que as duas cometeram os crimes de homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, recurso que dificultou a defesa da vítima e meio cruel), tortura e ocultação de cadáver. Os detalhes foram divulgados nesta manhã, em coletiva à imprensa, em Porto Alegre. As defesas negam que elas tenham cometido os crimes.
— A conduta praticada foi por motivo torpe, porque aquela criança se tornou um entrave, um empecilho para o relacionamento. Isso desencadeou que elas tomassem essa atitude. O meio cruel, a cadeia sucessiva de atos, elas intensificaram seu sofrimento até o óbito, fazendo com que a criança estivesse completamente desnutrida, com abalo emocional extremo. E também constatamos que foi cometido com superioridade de força, contra uma criança subnutrida, debilitada, não podendo clamar por socorro e, não contente ainda, dão a ela um medicamento, dificultando qualquer socorro possível — afirmou o promotor Tarouco Pinto.
Durante a apuração, foram obtidas imagens de câmeras que mostram Yasmin transportando a mala onde estaria o corpo de Miguel. Também foram descobertas pela polícia pesquisas realizadas na internet em que a mãe teria tentado saber se o mar é capaz de apagar impressões digitais. Embora o corpo do menino não tenha sido encontrado, essas são consideradas provas de que ele foi arremessado nas águas.
— Foram encontradas várias câmeras que demonstram percurso. Elas passam pela primeira câmera carregando a mala. Todos os outros pontos de câmeras mostram elas no percurso. E a primeira câmera, que mostra passando, mostra voltando, inclusive abraçadas, se dirigindo à pousada — disse Tarouco.
Ainda sobre as torturas, físicas e psicológicas, a investigação descobriu na pousada onde o garoto vivia novas evidências de que ele era vítima desse tipo de crime. Segundo a polícia, Miguel era obrigado a copiar frases com insultos, onde escrevia "eu sou um idiota", "não mereço a mamãe que eu tenho", "eu sou ruim", "eu não presto" e "a minha mamãe é maravilhosa e eu sou péssimo". Uma corrente, na qual foi localizado material genético do menino, também foi apreendida. A investigação aponta que ela era usada para manter o garoto trancado em um armário.
Outra evidência descoberta ao longo da apuração foi uma camiseta infantil, com sangue humano. A análise do Instituto-Geral de Perícias (IGP) concluiu que o DNA é compatível com o de um filho de Yasmin — Miguel era o único dela. Para a apuração, isso indica que o menino era vítima de agressões.
— Todos esses elementos demonstram que, nesse período, essa criança era submetida por essas pessoas, que deveriam zelar por ele, a todos esses atos de tortura — disse o promotor. — Embora não tenhamos análise do cadáver, temos o conjunto de provas que, somadas, concluem que houve um homicídio — acrescentou.
Em um primeiro depoimento, Yasmin confessou o crime, mas atualmente a defesa diz que ela se declara inocente. Bruna detalhou à polícia como teria acontecido o assassinato do enteado, no entanto, alega que não teve participação na morte da criança. As duas mantinham um relacionamento há cerca de um ano e meio.
— A sociedade gaúcha sofre uma vez mais com um fato grave, triste. E se questiona como é possível a prática de atos tão brutais e que vitimaram esse menino de apenas sete anos de idade (…) No caso que estamos tratando, o caso Miguel, nos ressentimos. O fato nos choca, revolta e causa indignação. Cometido longe dos olhares de amigos, de coleguinhas de escolas. Longe inclusive do olhar de vizinhos, o que impediu a todos nós de ouvir os gritos impotentes e inaudíveis dessa indefesa vítima — declarou o subprocurador-geral de Justiça para Assuntos Institucionais, Júlio Cesar de Melo.
O caso
No dia 29 de julho, Yasmin procurou a Polícia Civil em Tramandaí com intuito de registrar o desaparecimento do filho. A mulher acabou confessando ter espancado o menino, dopado-o com antidepressivo e jogado o corpo dele no Rio Tramandaí. Ela foi presa em flagrante, e a madrasta acabou sendo detida dias depois, após a polícia encontrar vídeos nos quais ela aparecia ameaçando o menino.
A investigação concluiu que além do homicídio, Miguel já havia sido vítima de tortura. O garoto, segundo a polícia, era mantido trancado em um guarda-roupas e em uma peça escura de cerca de um metro quadrado.
O corpo da criança não foi localizado até o momento, e os bombeiros seguem em buscas no Litoral Norte.
Contrapontos
O que diz a defesa de Yasmin
O advogado Jean Severo, que integra a equipe de defesa de Yasmin, diz que a cliente se declara inocente. Ainda conforme Severo, ela só deve falar novamente sobre o caso ao Judiciário. A mulher não deve se manifestar à Polícia Civil, nem participar da reprodução simulada dos fatos.
— Ela se declara inocente. Que ela foi coagida na delegacia a falar aquilo. Ela não vai participar de nenhuma simulação do caso (reprodução simulada dos fatos) e de nenhum outro interrogatório. Ela só vai falar o que realmente aconteceu na frente do magistrado.
A Polícia Civil nega que qualquer uma das duas tenha sido coagida e diz que estavam acompanhadas de advogados.
O que diz a defesa de Bruna
As advogadas Fernanda Ferreira e Helena Von Wurmb encaminharam nota à reportagem nesta terça-feira:
"Quanto às provas produzidas até o presente momento fica claro que nenhuma serve a comprovar nenhum envolvimento da Bruna no homicídio do Miguel. Assim como elas afirmam, reafirmamos, a Bruna não teve nenhum envolvimento na morte do menino. Seguimos aguardando o resultado da perícia médica da Bruna para maiores posicionamentos, visto que até o momento ela se encontra em tratamento e impossibilitada de sair do Instituto Médico Psiquiatra."