— A gente ficou em choque, como ele veio parar aqui, onde estava? O jeito que estava. Não estava machucado. A gente não sabia o que tinha acontecido.
Esse é o relato do pai que encontrou o filho morto em um terreno baldio, na região central de Igrejinha. O representante comercial, Jair da Silva Hoffmann, 39 anos, foi acordado por jovens gritando no portão de casa, numa manhã do sábado, dia 8 de setembro do ano passado:
— Tio, tio, acharam um corpo, acho que é o Timóteo!
O corpo era do filho de Jair, Timóteo Lucas Hoffman, 16 anos. Mas ninguém sabia o que havia acontecido. O rapaz havia dito para os pais, na noite anterior, que iria dormir na avó, que fica ruas próximas da casa da família, no loteamento Rothmann, em Igrejinha, no Vale do Paranhana, mas não foi para lá. Acabou indo para uma festa, na casa de conhecidos, próximo ao local no qual foi encontrado morto.
A Polícia Civil de Igrejinha começou a refazer os passos de Timóteo e a interrogar quem estava na festa. Nos primeiros relatos, as pessoas diziam que o rapaz teria consumido um entorpecente antes de chegar na casa onde o encontro estava acontecendo.
— Perguntei (para o amigo): o que vocês consumiram? E respondia: "a gente só bebeu". Daí, falei: não. Agora é a hora de falar a verdade, porque a casa caiu. Não adianta. Vai ter de falar a verdade! Dai ele falou: "foi LSD. Eu também usei e fiquei mal.
MARILENA NUNES
madrasta de Timóteo
— Era uma reunião de amigos que se conheciam, uns há mais tempo, outros há poucos dias. E resolveram fazer um evento social na casa de um deles. E, no caminho para esse encontro, um deles relata que adquiriram um determinado tipo de entorpecente — explica o delegado regional Heliomar Franco.
O caso mobilizou o Departamento de Perícias Laboratoriais do Instituto-Geral de Perícias. Os testes iniciais para consumo de drogas, venenos e remédios deram negativo. Em dezembro, novo exame foi realizado para pesquisar o consumo de LSD — também sem indicar nada. Naquele momento, a causa da morte não foi definida.
Confirmação
Os resultados dessas análises e as características do óbito desafiavam a perita Fernanda Rafaela Jardim, responsável pelo caso. A suspeita era de que se tratava de droga sintética — substâncias com estrutura e efeitos farmacológicos semelhantes às drogas controladas, mas que têm variações para evitar serem classificadas como ilegais ou detectadas em análises laboratoriais.
Os laudos iniciais não traziam informações sobre uso de entorpecentes. Isso chamou a atenção da polícia, porque os relatos deixavam claro que esse menino havia consumido LSD
HELIOMAR FRANCO
Delegado regional
— Não existe um equipamento que vai me dar direto que é tal substância que nem o CSI (seriado de TV sobre investigações criminais). Se não temos o padrão de referência, que pode ser adquirido comercialmente, temos de produzir esse padrão para poder fazer laudo conclusivo da substância que ele consumiu — explica o químico Marcos José Souza Carpes, do IGP.
Depois de diversas análises e métodos próprios de identificação de substâncias criados pelos peritos no Estado, o IGP identificou o que Timóteo ingeriu: a 25E-NBOH, a droga nova que pode matar no primeiro uso e que é vendida como se fosse LSD, mas por preço mais barato.
— O problema dessas drogas sintéticas novas é que não se sabe ainda quais os efeitos no organismo das vítimas, dos usuários, mas o que se sabe é que a dose letal é muito baixa. Então, o risco de a pessoa que está utilizando é muito grande porque a fabricação é feita de forma artesanal, clandestina. É uma substância muito tóxica. O nosso corpo não tem como transformar, metabolizar, em composto menos agressivo. Ele vai se expor como se fosse veneno. É um veneno e a pessoa vai a óbito — conclui a farmacêutica Maria Cristina Frank, perita criminal do IGP, que identificou a droga no corpo de Timóteo.
Essa foi a primeira vez que um laudo pericial confirma a morte por uso de drogas sintéticas.
O entorpecente
Em 7 de setembro de 2018, quando Timóteo Lucas Hoffman, 16 anos, ingeriu 25E-NBOH, a substância não era considerada droga ilícita.
A substância só passou a ser proibida oficialmente três meses depois, quando foi publicada em portaria 344/98 da Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde — Anvisa, que define as drogas que causam riscos e passam a ser criminalizadas.
Além da 25E-NBOH, outras três novas substâncias ilícitas foram proibidas pela Anvisa, as substâncias 25B-NBOH, 25C-NBOH, e 25H-NBOH. Essas drogas apresentam estruturas moleculares e efeitos parecidos com as outras drogas sintéticas conhecidas, como o próprio LSD.