O autor de uma chacina que resultou na morte de quatro pessoas da mesma família em janeiro deste ano, afirmou, em depoimento à polícia, que estava se incomodando com os vizinhos, teria sido provocado e, por isso, queria terminar com a "anarquia" no bairro. O crime aconteceu em 9 de janeiro em Triunfo, na Região Metropolitana.
GaúchaZH teve acesso ao depoimento em vídeo de Deoclides da Silva, 52 anos, e ao inquérito, que foi concluído com o indiciamento do homem — o Ministério Público ofereceu denúncia e o acusado se tornou réu recentemente por quatro homicídios qualificados, uma tentativa de homicídio e ato obsceno. No vídeo, com duração de 22 minutos, Silva explica que havia se incomodado com os vizinhos, principalmente os da frente de sua moradia e acabou golpeando quatro deles com um facão: Mirian Ribeiro Pereira, 52 anos, e os filhos Valéria Pereira Borges, 28; Valquiria Pereira Borges, 30; e João Paulo Pereira Borges, 21, morreram.
— A gente nunca se acertava. Não era sempre, era de tempos em tempos. As mulheres tinham umas palavras que abalavam meu psicológico. Teve uma, acho que a Valquíria. Ela pegou e me falou uma vez: "ninguém gosta de ti aqui na vila" — disse.
Aos investigadores, o homem contou que discutiu com os vizinhos em 11 de dezembro. Em ocorrência registrada por Mirian, a mulher explicou que Silva ameaçou que cortaria seu rosto.
Silva afirmou que a briga motivou a mudança de sua família para Cachoeirinha, na Região Metropolitana. Mas em 8 de janeiro, voltaram a Triunfo para pegar dois cachorros de grande porte que ficaram na residência.
Em depoimento à polícia, a mulher de Silva — que terá o nome preservado — contou que o casal foi até o centro da cidade para pagar algumas contas. Por volta das 11h, o réu deixou a mulher no carro e foi caminhando até a antiga casa, com a justificativa de dar banho no cachorro. Ao chegar à residência, Silva afirmou que começou a recolher as fezes dos cachorros e que passou a ser cuidado por uma das mulheres.
— Ela disse: "O que tu quer, vagabundo?" E aí começou a discussão e aí vieram tudo: mãe, filha, o guri. Daí eu pensei para mim: "Sabe de uma coisa? Vou me incomodar com essas mulheres aí. Vou terminar com a anarquia agora. E aí comecei a dar facada.
Segundo a denúncia do MP, as mulheres foram mortas na frente da casa e João Paulo no interior da residência. Ele e o irmão seguraram a porta da moradia para evitar que Silva ingressasse. Por uma fresta, conseguiu golpear o jovem. Dentro da casa, havia outras três pessoas — duas delas crianças, uma conseguiu escapar ao ser colocada dentro de uma máquina de lavar. No depoimento à polícia, o réu afirmou que não pretendia investir contra as crianças.
Ainda conforme a denúncia, depois dos assassinatos, o homem trancou sua casa e voltou para a rua, vindo a ameaçar a vizinha do lado. À polícia, Silva contou que escondeu o facão em uma ponte. Questionado se o objeto apresentava ainda sinais de sangue, o homem afirmou que o tinha limpado.
Também em depoimento à polícia, a mulher dele afirmou que Silva "sempre disse que iria matá-los, pois ficava muito brabo com a situação de animosidade entre os vizinhos".
"Me arrependo", disse autor
Antes da chacina, Silva praticou um ato obsceno ao "pegar as próprias genitálias, por cima da roupa", mostrando para as três vítimas mulheres, segundo afirmou um sobrevivente. Por último, o réu afirmou que se arrependia de ter matado quatro pessoas.
— Me arrependo, porque a consequência que vem para cima de mim é muito grande. Tem meu filho, minha esposa e agora está tudo complicado. Meu filho, que eu estava dando boa educação, agora não estou podendo mais. Minha esposa, a gente tinha uma convivência boa, a gente tinha uma discussão de vez em quando, mas não de se pegar no laço ou ficar de mal.
Homem foi preso três dias depois
A polícia pediu a prisão preventiva do homem no dia do crime. À época, o promotor Thomaz de la Rosa da Rosa, disse que "existem subsídios mais que suficientes" para atender à solicitação. Observou ainda que a ficha criminal de Silva — no qual consta outro ato obsceno — "demonstra o caráter desviado".
Em decisão no dia seguinte, a juíza Solange Moraes observou que "nada, absolutamente nada, justificava o comportamento, em tese, adotado por Deoclides. Embora seja certo que os ânimos entre os vizinhos fossem exaltados, havendo ofensas e discussões mútuas, havia diversas outras maneiras de lidar e resolver a situação de que Deoclides poderia lançar mão".
Em 12 de janeiro, Silva é preso e é levado para a Penitenciária Estadual de Canoas 4. Em 25 de janeiro, é denunciado pelo MP. Na mesma documentação, o promotor pede a apreensão de quatro veículos, devido à possibilidade de fuga. A denúncia é aceita pela justiça e Silva vira réu.
Contraponto
Segundo o promotor, Silva ainda não tem advogado constituído. Procurada pela reportagem, a Defensoria Pública informou que o réu ainda não foi citado, quando ele deve dizer se tem um advogado para defendê-lo ou se vai optar por um defensor público.