Dez meses depois da morte do colombiano Eduardo de la Hoz, mestrando da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), durante briga de condomínio em Porto Alegre, o autor dos disparos, o bombeiro Tiago Lamadril Borges, compareceu nesta terça-feira (10) à primeira audiência de instrução do caso, na 2ª Vara do Júri do Foro Central da Capital. O soldado, vizinho do estudante, é acusado de homicídio duplamente qualificado e pode ser levado à júri popular.
A vida e a morte de Eduardo foram temas de reportagem de GaúchaZH em outubro de 2017. Natural de Barranquilla, cidade de 2 milhões de habitantes no norte da Colômbia, o mestrando desenvolvia, na Capital, desde 2015, pesquisa sobre redes de poder no Departamento de História da UFRGS, onde era bolsista.
O crime ocorreu em 16 de fevereiro de 2017, quando o jovem de 29 anos questionou o subsíndico do prédio onde morava, na Avenida Cristóvão Colombo, ao perceber que sua bicicleta não estava na garagem. Houve discussão com o aposentado Cláudio Roberto Bohrer Brandão, 74 anos. Também morador do edifício, Borges teria confundido o colombiano com um ladrão e, armado, deu ordem de prisão.
Segundo a versão da defesa do bombeiro, Eduardo não teria atendido. Borges disparou dois tiros que atingiram o estudante na região abdominal, perfuraram intestino, esôfago, pulmão, coluna vertebral, fêmur e bacia.
O jovem ficou internado no Hospital Cristo Redentor por sete meses (dois deles em coma) até morrer em 24 de setembro. Borges, que responde ao processo em liberdade e continua trabalhando na Estação Floresta do Corpo de Bombeiros, foi denunciado pelo Ministério Público Estadual (MP-RS) por tentativa de homicídio em 14 de julho. Com a morte de Eduardo, a acusação passou a ser homicídio duplamente qualificado — motivo fútil e recurso que dificultou a defesa da vítima porque ela estava desarmada e contida.
Caio Bonamigo Borigon, 26 anos, e Diego da Luz, 26, que dividiam apartamento com o colombiano, testemunharam nesta terça-feira.
— Eduardo se queixava de que era vítima de racismo no prédio — contou Caio.
Hector de la Hoz, irmão de Eduardo que mora em Florianópolis, detalhou na audiência as condições de vida do jovem em Porto Alegre, seu comportamento e linha de estudos na UFRGS.
— Meu depoimento tem valor para a juíza no sentido de entender o que ele estava fazendo aqui. Expliquei que Eduardo era estudante e permanecia a maior parte do tempo em casa. Estamos confiantes de que será feita justiça — explicou.
A mãe de Eduardo, a advogada e assistente social María del Carmen, mora na Colômbia. Por telefone, ela afirmou a GaúchaZH:
— Acredito no Brasil e em sua Justiça, creio que haverá um bom juízo.
Acompanharam como testemunhas de acusação o subsíndico e a mulher. A advogada de Tiago, Tais Martins Lopes, explica que a defesa se baseia na afirmação de que Eduardo não obedeceu a voz de comando e de não se movimentar até a chegada da Brigada Militar. O bombeiro não falou diante da juíza Vanessa Gastal de Magalhães. Nova audiência foi marcada para 10 de outubro, quando serão ouvidas as testemunhas de defesa.