A Polícia Civil divulgou nesta terça-feira (13) áudios de conversas entre executores e mandantes sobre forma de pagamento, local e como proceder para entregar dinheiro. Um ex-namorado e uma ex-namorada do garoto de programa de Passo Fundo torturado e executado pagaram R$ 8 mil pelo crime no ano passado.
O corpo de Fernando Chaves Gomes, de 21 anos, natural de Passo Fundo, foi encontrado com mais de cem perfurações, no dia 16 de dezembro do ano passado, na Estrada Martim Félix Berta, no bairro Mario Quintana, em Porto Alegre. A vítima, que atuava como garoto de programa, foi torturada e executada com golpes de faca. Tudo foi gravado e enviado para os dois mandantes do crime, que teriam encomendado o assassinato por ciúme. Uma mulher de 23 anos, moradora de Parobé, que foi presa na última quarta-feira (7), e um empresário de 34 anos, de São Paulo, encontrado morto na semana passada no dia em que policiais gaúchos iriam prendê-lo.
Nos diálogos interceptados pela polícia, a mulher combina com um dos executores a forma de pagamento:
— Seguinte, assim que eu conseguir pegar toda a grana em mãos, que ainda tem uma quantia em banco, que não tá comigo, eu vou entrar em contato contigo aqui, vou te passar o carro, cor, placas, e daí tu fica no aguardo, que logo chego e te entrego.
Após o adiamento da entrega, um dos criminosos demonstra inquietação.
— Me trazendo o dinheiro, eu vou poder trabalhar. É só isso que eu preciso, entendeu? Confiança eu já botei em vocês, botando a minha cara. Agora é a confiança que vocês vão ter de largar o dinheiro pra mim, e essa confiança eu não vou poder quebrar.
Ouça a íntegra dos áudios:
Crime planejado
Conforme a polícia, o planejamento do crime teria começado em setembro do ano passado. A suspeita é de que a ex-namorada de Gomes tenha iniciado contatos com presidiários e, a partir daí, financiada pelo empresário paulista, contratado uma facção criminosa para executar o rapaz. A estimativa da polícia é de que tenham pago R$ 8 mil pela morte.
Uma semana antes do homicídio, uma adolescente de 16 anos serviu como uma espécie de isca para a execução. Ela foi até Passo Fundo acompanhada por um homem para fazerem um programa com a vítima. Até então, Gomes achava que a adolescente tinha ido sozinha. Dias depois, ela fez novo contato. Era um pedido para que Gomes fosse até Porto Alegre para outro programa com ela e uma amiga. Pagaram adiantado uma parte do valor.
A investigação apurou que tudo não passava de uma armação para atrair a vítima. O garoto de programa chegou à Capital por volta das 23h do dia 15 de dezembro e foi encontrado morto por volta das 6h do dia 16.
Investigação
O crime passou a ser solucionado a partir da identificação da vítima e da obtenção de imagens de câmeras de segurança. Um dos executores, identificado, foi preso e um homem que participou da logística para atrair a vítima acabou revelando a história durante depoimento.
A partir disso, os investigadores da 5ª Delegacia de Homicídios passaram a apurar a rotina de Gomes e chegaram ao envolvimento do ex-namorado e da ex-namorada dele.
— Ao que tudo indica, o empresário de São Paulo estava inconformado com o final do relacionamento, acrescido a uma dívida que a vítima tinha com ele. Fez contatos com familiares do garoto de programa no interior do Estado e chegou à ex-namorada — afirma a delegada Luciana Smith, responsável pela investigação.
A mulher, que não teve o nome divulgado pela polícia, prestou depoimento como testemunha antes de ser presa. Ela confirmou que ficou surpresa ao saber que Fernando Gomes havia mantido um relacionamento com um homem em São Paulo e, para amigas, falou em vingança.
— Depois de presa, ela negou qualquer participação no crime. Mostrou-se fria e sem arrependimento — diz a delegada.
Dois executores, de 21 e 19 anos, estão presos. Eles também não tiveram seus nomes divulgados. Foi apontado ainda o envolvimento de dois adolescentes, incluindo a menina usada para atrair o garoto de programa, mas o caso deles foi encaminhado para o Departamento Estadual da Criança e do Adolescente (Deca).
Tortura
A delegada diz que, dentro do apartamento cedido para os criminosos executarem a vítima, o jovem foi amarrado e torturado com golpes de faca. Tudo foi gravado em vídeo. Gomes implorou para não ser morto depois de mencionar os nomes dos dois possíveis mandantes do crime. A perícia comprovou a presença de sangue da vítima dentro do apartamento.
Gomes sofreu dezenas de facadas antes de ser enrolado em um lençol e ter o corpo transportado no porta-malas de um carro até cerca de três quadras do edifício, onde foi abandonado e, pela última vez, torturado.
— Eles perceberam que o homem ainda não estava morto e o espancaram até a morte. Foram muitos requintes de crueldade — afirma o diretor do Departamento de Homicídios, delegado Paulo Grillo.
A polícia apurou que as imagens foram enviadas para os dois mandantes. Após elucidar o caso, agentes foram para São Paulo prender o empresário. Ao chegarem à cidade, a polícia local informou que ele cometeu suicídio ao pular do 13º andar de um hotel.
Temendo que os demais suspeitos pudessem fugir, a polícia prendeu os outros executores em Porto Alegre e a outra mandante do crime em Parobé. Todos foram indiciados por homicídio triplamente qualificado — por motivo torpe, meio cruel e por ter dificultado a defesa da vítima —, formação de quadrilha e corrupção de menores.
O celular de Gomes foi furtado e repassado para uma revenda no bairro Mario Quintana. A polícia chegou até o aparelho e um homem foi indiciado por furto.