Sobram perguntas sem respostas entre os moradores do bairro Morada do Vale II, em Gravataí, na Região Metropolitana, sobre o ataque a tiros que deixou dois mortos e 33 feridos na madrugada de domingo (22). Certeza mesmo é de que o tiroteio mudou a rotina da comunidade, principalmente no entorno da Rua Eurico Lara, onde os disparos começaram. Nesta segunda-feira (23), em resposta à onda de violência, o secretário da Segurança Pública, Cezar Schirmer, enviou seis policiais civis para a investigação de homicídios e um número não informado de agentes do Batalhão de Operações Especiais (BOE) para patrulhamento ostensivo. O reforço atua a partir desta terça-feira.
No ataque da madrugada de domingo, houve revide — ainda não se sabe de onde — e o confronto se estendeu até uma festa de aniversário que acontecia na Rua Felipe Mate. Movimentada à noite, a área do ataque concentra lanchonetes e bares que servem como ponto de encontro de jovens.
— Era comum ver pessoas caminhando pela rua até tarde, ou sentadas junto às mesas dos estabelecimentos. Não sei como vai ser daqui para frente. Festa não tem mais como fazer — lamenta Ana Laura Menezes, 22 anos.
A operadora de caixa estava na festa que comemorava o aniversário de quatro jovens quando ouviu a gritaria e os estampidos dos fuzis e das pistolas. Ela não se feriu, mas Taís Pires da Silveira, 24 anos, e Gabriel Mallet de Ataíde, 21 anos, morreram no local.
As duas vítimas tinham ligação com a Escola Municipal de Ensino Fundamental Alberto Pasqualini, que fica a uma quadra do tiroteio. Taís era mãe de um aluno. Gabriel, filho de uma funcionária terceirizada da escola. Em condolência, a instituição com 1.066 estudantes manteve as portas fechadas ontem. Em um dos muros, letras brancas escritas sobre um fundo preto externavam o sentimento da comunidade escolar e avisava sobre o luto de um dia.
Durante o dia de ontem, pequenos grupos de pessoas se formavam e logo se dissipavam trazendo versões diferentes para o ataque. A tristeza também era visível no rosto dos moradores, a maioria amigo ou conhecido de alguma das vítimas.
— Hoje as ruas estão desertas, silenciosas. Estamos todos com medo — observou um jovem de 21 anos, que também estava na festa.
Com medo, moradora prefere não sair de sua casa à noite
Nesta segunda-feira enquanto o policiamento ostensivo não havia aparecido na cidade — a promessa de Schirmer é de que o reforço chegue nesta terça —, populares criticavam a ausência de agentes.
— Nunca tem polícia aqui. A Brigada a gente raramente vê. Somos melhores assistidos pela Guarda Municipal — disse um comerciante de 49 anos.
Moradora da Rua Eurico Lara, a aposentada Eny Maria Brignol Barcello, 72 anos, reclama da insegurança. Como autoproteção, faz tudo o que precisa antes de anoitecer por considerar arriscado sair depois das 20h. Ela afirma ser comum presenciar criminosos com armas longas.
— Tem sempre uns bolinhos de gente nas esquinas. Se falta gás ou remédio de noite, espero até o outro dia. Não dá para sair à rua — contou.
A aposentada teme que outros confrontos aconteçam nos próximos dias em decorrência do ataque. Mas a opinião dela não é unânime. Vizinhos confirmam a ausência dos órgãos de segurança, só que discordam da violência.
— É uma zona bem movimentada, mas não perigosa. O risco que se corre aqui é o mesmo que em outros lugares. Tenho estabelecimento há 10 anos e fui assaltado só uma vez — avalia um comerciante de 37 anos.
De acordo com o delegado Felipe Borba, da Delegacia de Homicídios de Gravataí, testemunhas e vítimas seguem sendo ouvidas. Uma das aniversariantes que chegou a ser baleada de raspão, depôs:
— Vamos ouvir mais vítimas, mas até para não contaminar o relato das que faltam, não adiantarei nenhuma versão.
Conforme o policial, não é possível afirmar quantas pessoas foram baleadas entre as 33 feridas — 11 seguem internadas, uma em estado grave. A polícia também não sabe precisar quantos tiros foram disparados. A principal linha de investigação continua sendo a ligação do crime com disputas entre facções.