Traficantes de drogas agiam com características de milícias em conjuntos habitacionais do bairro Restinga, na zona sul de Porto Alegre. Conforme a Polícia Civil, os criminosos obrigavam os moradores a comprar gás de um posto clandestino montado por eles.
Para coibir esse tipo de crime, a 16ª Delegacia de Polícia desencadeou no final da madrugada desta quinta-feira (6) a Operação Reintegro, nos condomínios Camila, Ana Paula e São Guilherme.
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Foram cumpridos 96 mandados de busca e apreensão, com o objetivo de retomar apartamentos invadidos por traficantes, após expulsarem os proprietários, que haviam sido contemplados com o programa Minha Casa, Minha Vida. De posse dos imóveis, os invasores realizavam uma série de crimes, como tráfico de drogas, roubos, ameaças e extorsões.
– É uma gama de denúncias que recebemos, muitas delas anônimas. Principalmente de casos de pessoas que simplesmente tiveram de abandonar suas casas, suas vidas, deixar tudo para trás e ir embora – disse a delegada Shana Hartz, que comandou a operação.
Em um condomínio, os criminosos haviam transformado um dos imóveis invadidos em um depósito de gás. Os moradores estavam sendo obrigados a consumir o produto deste posto clandestino. Para garantir essa exclusividade, além de ameaçar os compradores, eles proibiram os revendedores legalizados de ingressar no conjunto habitacional.
Outro tipo de extorsão era feito por meio do serviço de correspondências. Os traficantes exigiam que todas as entregas fossem feitas a eles e, depois, cobravam taxas dos verdadeiros destinatários.
– Se os valores exigidos não fossem pagos, as entregas não chegavam às pessoas. Eles (os criminosos) montaram uma rede de serviços paralelos e extorsões – explica a delegada.
Durante a operação no condomínio Ana Paula, o Samu foi acionado para atender um homem que alega ter caído do quarto andar de um dos prédios. De acordo com o inspetor Dionel Gabana, ele pediu socorro quando já estava caído e afirmou que fumava na janela e se assustou com o barulho dos policiais.
O homem, cuja identificação não foi revelada, recebeu atendimento no local e foram constatadas fraturas nas pernas, nos braços e nas costas. Ele foi encaminhado ao Hospital de Pronto Socorro (HPS). Não há registros policiais contra ele.
Retomada de imóveis
Com o cumprimento dos mandados de busca e apreensão, a polícia busca resgatar, para a Caixa Econômica Federal, imóveis que haviam sido tomados pelos traficantes.
– Vamos agora fazer um trabalho de recadastramento dos moradores, para vermos quais foram invadidos. Caso o mutuário contemplado no Minha Casa Minha Vida não esteja morando no local, vamos apurar o motivo disso. Se foi expulso, se houve venda do imóvel – adianta Shana.
De acordo com a delegada, as ações da polícia vão municiar uma força-tarefa formada pela Defensoria Pública, Ministério Público, Demhab e Caixa Econômica Federal que faz um levantamento da situação dos imóveis.
– Os moradores que foram expulsos não pretendem voltar para a mesma casa ou apartamento. Mas querem que seus nomes sejam retirados das listas de contemplados para que possam participar de outros programas sociais habitacionais – diz a delegada.
Shana explica que, para evitar que o tráfico volte a tomar apartamentos dos moradores, a polícia realizará operações semelhantes esporadicamente.
– Essa ação de hoje foi um pouco diferente das anteriores, nas quais não se obteve muita efetividade, porque, quando a polícia saiu, foi retomado o status quo anterior. Não há como estar 100% do tempo presente, mas de tempo em tempo vamos cumprir outros mandados de busca e apreensão e verificar a situação.
Invasão precoce
Durante as investigações, dois casos em especial chamaram a atenção da delegada Shana Hartz. Um deles foi o de uma mulher que, contemplada pelo programa social, pegou a chave e foi para o imóvel. Quando chegou, foi atendida por uma criança, que a indagou sobre o que queria ali. Constatando de imediato que o apartamento já havia sido invadido, virou as costas e foi embora desolada.
– Ela nem chegou a tomar posse – conta a delegada.
Em outro caso, uma moradora, mesmo tendo recebido ordem de expulsão, resistiu. Os traficantes, então, invadiram o apartamento mesmo ela estando ali, danificaram móveis e outros objetos, rasparam a cabeça da moradora e expressamente a mandaram sair. Desta vez, ela obedeceu.