Três mulheres suspeitas de terem desviado R$ 1.172 milhão de uma empresa de zeladoria de Porto Alegre através de gastos em cartões corporativos são alvo de mandados de busca e apreensão cumpridos pela Polícia Civil na manhã desta sexta-feira. Em endereços na Capital e em Sapucaia do Sul, os investigadores recolhem computadores, aparelhos de celular e documentos.O trio, que teria atuado entre outubro 2013 e dezembro de 2016, usou o montante subtraído para compras pessoais em lojas de roupas e de materiais de construção, relojoarias e mercados.
A fraude era capitaneada pela mulher que detinha o cargo de coordenadora financeira da empresa de zeladoria, com atuação sobretudo no bairro Azenha. Ela era responsável por garantir o repasse de crédito para os cartões corporativos dos funcionários, que podiam ser de duas modalidades, uma somente para refeições e outro para gastos gerais. O uso era exclusivamente para compras, sem opção de saque.Como controlava o sistema com autonomia, operado a partir de plataforma virtual, a coordenadora percebeu a brecha e passou a fazer depósitos no seu próprio cartão de R$ 500 por semana. Ninguém percebeu os repasses acima do devido e ela aumentou a frequência e o montante das transferências. Em 2014, foram R$ 305 mil em próprio favor.
Leia mais:
Justiça determina internação de adolescente apontada por morte em escola
Morador de NH é preso por participar de quadrilha internacional de tráfico
Como o governo do RS pode tirar do papel a proposta de parceria com os municípios na segurança pública
Ela também começou a remeter indevidamente créditos para uma subordinada do seu setor e emitiu um cartão em benefício de uma prima que não tinha qualquer vínculo com a empresa.A comandante do esquema recebia salário de R$ 3,5 mil, mas se apropriou de R$ 736 mil via cartão corporativo. Somente entre 2014 e 2016, ela gastou mais de R$ 170 mil em lojas de roupa. No mesmo período, efetuou compras superiores a R$ 150 mil em um posto de combustível.
A investigação apontou que a suspeita é dona de uma empresa de transporte de passageiros e abastecia os seus ônibus com o dinheiro da especializada em zeladoria. No período da fraude, os negócios da mentora prosperaram: ela ampliou sua frota de quatro para dez coletivos. A mulher ainda comprou um terreno na praia e, com os créditos desviados, adquiriu material de construção e mobília. A subordinada da chefe do esquema, que recebia salário mensal de R$ 2,5 mil, obteve R$ 258,4 mil em dinheiro desviado pelo cartão. Já a prima, que sequer possui renda fixa, se beneficiou de R$ 129 mil.
Quando a empresa administradora dos cartões desconfiava dos altos repasses e ligava para confirmar, a pessoa de contato era a própria mentora dos desvios. Isso acabou prolongando a vida de altos gastos do trio, já que a mulher assegurava a normalidade das operações. Até que, em uma ocasião, o empreendedor lesado recebeu ligação da gestora para confirmar um crédito de R$ 10 mil na conta da subordinada. A partir disso, o empresário contratou auditoria que verificou um rombo milionário. As duas empregadas foram demitidas em janeiro de 2017 e o caso foi levado à Polícia Civil.
Os investigadores obtiveram quebras de sigilo e verificaram que computadores da sede da prejudicada e das residências das suspeitas foram usados para inserir os créditos via plataforma online. A administradora informou a lista de compras feitas pelas três e os policiais foram a todos os estabelecimentos, recolhendo cópias dos gastos que somaram mais de R$ 1 milhão.
O trio é investigado pela Delegacia de Repressão aos Crimes Informáticos (DRCI), atualmente comandada pelo delegado Arthur Raldi, que entende dispor de elementos suficientes para indiciar as envolvidas por estelionato e organização criminosa. Além da análise de equipamentos apreendidos, Raldi ainda pretende ouvir parentes das suspeitas que assinaram alguns dos comprovantes de compras. A hipótese é de que familiares também se beneficiaram da fraude, o que poderá levá-los a sofrer implicações.
Terminadas as últimas diligências, a Polícia Civil concluirá o inquérito e enviará os indiciamentos para a apreciação da Justiça. A ação contra as suspeitas foi batizada "Operação AMV", referência ao mecanismo utilizado para permitir que vagões de trens desviem o seu curso de uma linha férrea para outra.
O delegado Raldi diz que essa espécie de crime cibernético pode ser prevenida com a determinação de que mais de uma pessoa seja responsável por pagamentos de benefícios em empresas. Não é recomendável, avalia, confiar excessivamente em um funcionário com cargo de chefia e optar pela centralização absoluta. Raldi sugere auditorias permanentes em que possam ser identificados problemas.