"L., que barulho é esse? Tá usando algum equipamento diferente? Por favor, desliga. O barulho está muito forte", dizia a mensagem, às 22h de segunda-feira, enviada pelo WhatsApp por um construtor de 36 anos. Era direcionada à moradora da casa da frente, na vizinhança do Presídio Central.
Foi quando chegou em casa na manhã desta quarta-feira que ele percebeu de onde vinha o barulho. Realmente não era um problema da vizinha. Vinha debaixo da casa dela. Eram os homens contratados por uma facção criminosa para abrir um túnel desde uma das casas da Rua Jorge Luiz Domingos, no bairro Aparício Borges, até um dos pavilhões do Presídio Central.
– Eu estava voltando de uma obra com uns funcionários, todos sujos de terra, e a polícia já foi parando eles. Me apavorei, aí tive que explicar que a gente não estava no tal do túnel – conta o construtor, que prefere não ter o nome divulgado.
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Ele participou das construções e boa parte das casas daquela rua. E estranhava a movimentação na casa recém vendida por uma vizinha.
– Estavam há três meses trabalhando nisso aí e a obra nunca aparecia. Muito estranho isso – diz.
Duas casas ao lado de onde o túnel iniciava, outra moradora, de 29 anos, sentia no piso da casa a vibração que vinha do solo.
– A minha mãe, outra noite, veio pedir para eu desligar algum dos ventiladores. O barulho não deixava ninguém dormir de madrugada. Agora que eu fui ver que eles tinham aquele monte de ventiladores lá embaixo – comenta.
A vizinhança da casa escolhida pelos criminosos para tramar a ousada fuga tem nos seus arredores moradores que são policiais militares, agentes penitenciários e trabalhadores da construção civil.
– Com esse monte de pedreiros morando aqui na volta, nem estranhei quando ouvia umas batidas de ferro à noite. Às vezes é a hora que sobra para fazer serviços em casa, né – lembra outro morador de 35 anos.
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Outro vizinho, de 31 anos, logo estranhou a suposta obra que se desenvolvia ali ao lado.
– Ele compraram à vista a casa da vizinha que morava aqui há mais de 20 anos. Nunca teve muro nem nada e, de um dia para o outro, botaram um portão alto, de ferro e todo fechado. Eram pessoas estranhas aqui, que chegavam cedo e às vezes passavam a madrugada trabalhando – relata o morador.
Segundo testemunhas, dois homens sempre ficavam próximos do portão, como se controlassem a movimentação da rua. Uma caminhonete, apreendida durante a ação do Denarc na manhã desta quarta, também era usada pelo grupo para transportar materiais de construção e a terra retirada do túnel.
Técnicos do Instituto Geral de Perícias (IGP) constataram que o túnel chegou a 47 metros de extensão. Restavam, estimam os peritos, cerca de 60 metros para que chegassem ao objetivo dentro do presídio. O buraco para dar início ao túnel fica no meio da casa comprada pelo bando, e tem início a 3,75 metros do chão. Partia em linha reta até a cadeia, passando por baixo das casas no caminho – a primeira delas, ironicamente, habitada por um policial militar.