Autor de Estação Carandiru e Carcereiros, o médico Drauzio Varella avalia que o avanço da criminalidade no país tem relação com um processo de "desestruturação familiar". Entre as principais causas para isso, de acordo com ele, estão a submissão das crianças à violência e à falta de carinho, além da ausência de limites durante a adolescência.
– Na periferia de qualquer cidade brasileira, não tem homem em casa: (eles) fazem filhos e não têm nenhuma responsabilidade. Ficam as crianças com a mãe, dependente da avó, porque a avó também não tem mais marido: desapareceu, foi morto ou trocou ela por uma jovem – afirmou o médico em entrevista ao programa Timeline Gaúcha. – Você tem uma desestruturação familiar que é total.
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Drauzio afirma que, nestas condições, "é grande" o risco da população de baixa renda recorrer à venda de drogas como forma de sustento.
– Uma menina que tem três ou quatro filhos com 20 anos de idade vai sustentar essas crianças como? Lógico que ela pode ser uma menina trabalhadora que ache um jeito de se virar na vida, mas o risco de vender droga é grande – avalia. – Ou nós agimos, paramos de aceitar esse nível de diferenças sociais na população brasileira e oferecemos oportunidades para essas crianças, ou eu acho que a situação só vai piorar.
Na avaliação do médico, na época do massacre do Carandiru, em outubro de 1992, a situação dos presídios do país "era muito melhor" do que a atual, já que o número de presos era menor e o crime não era "tão organizado". Adotando uma "visão pessimista", Drauzio critica a intervenção policial como forma de resolver os problemas ligados ao consumo e ao tráfico de drogas:
– Nós insistimos nessa política suicida de fazer essa proibição das drogas e achar que, com a repressão policial, resolveríamos esse problema. As drogas existem e são distribuídas livremente, quase, nas cidades brasileiras porque a repressão policial não é eficiente.
Mesmo reconhecendo uma desestruturação da base familiar no Brasil, Drauzio afirma que desconhece as razões que levaram a este quadro. O médico pondera que o tema é uma "questão fundamental" para o debate sobre a violência no país.
– A criminalidade brasileira vem, basicamente, das áreas mais pobres das cidades: não é exclusiva, mas é aí que está concentrada. Violência urbana é uma doença contagiosa – avalia.