Um caso que parecia entrar para a galeria dos crimes insolúveis ganhou um novo rumo nesta sexta-feira com a prisão preventiva de três agentes penitenciários por envolvimento no assassinato de um colega. O crime aconteceu em 2008. Durante esse período, o caso revoltou a categoria pela brutalidade e pela falta de pistas do matador.
Paranaguá Leal Rodrigues, 55 anos, Daniel Tadeu Medeiros Collar, 47 anos, e Luís Antônio Rodrigues Fernandes, 51 anos, passaram para o outro lado das grades por ordem da 1ª Vara do Júri de Porto Alegre. Os três agentes e o segurança Luís Mario Rodrigues, 54 anos, também preso, são suspeitos de participação na morte do agente penitenciário William Mansur Tadrous de Souza, 39 anos, em junho de 2008.
Os três agentes penitenciários foram presos na manhã desta sexta-feira em suas casas na Capital, por equipes do Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic). O segurança não foi localizado, mas horas depois se apresentou ao Deic. Paranaguá e Collar estavam afastados das funções desde abril de 2012 por responder a um outro processo criminal e Fernandes estava cedido à Polícia Civil havia cerca de quatros anos, trabalhando no setor de investigações da 1ª Delegacia da Polícia Civil na Capital. A prisão de Fernandes causou surpresa na repartição.
— Colegas choraram quando souberam. Ele é uma pessoa do bem, dedicado, um excelente funcionário. Não acredito na participação dele nesse caso. Era amigo da vítima. Inclusive, cobrava da Delegacia de Homicídios a elucidação do caso — lamentou o delegado Paulo César Jardim.
Segundo denúncia do Ministério Público (MP), assinada pela promotora Lúcia Helena de Lima Callegari, o crime foi praticado para silenciar William, que saberia do envolvimento de colegas em crimes de roubo e corrupção.
A vítima sofreu uma emboscada quase em frente ao apartamento que vivia no bairro Cristo Redentor, na zona norte da Capital. Alvejado na cabeça, William morreu três dias depois. O caso foi investigado pela Delegacia de Homicídios, mas o inquérito acabou concluído sem apontar a autores.
Revoltados, amigos e parentes procuraram o Ministério Público, levantando suspeitas de que colegas estaria envolvidos no crime. Eles estavam intrigados com uma afirmação de William, dias antes de morrer:
— Pior que os presos são alguns colegas.
A promotora de Justiça Lúcia Helena de Lima Callegari começou a remexer no caso há cerca de três meses. E solicitou cópias de uma investigação do MP de 2008 que resultou em um processo na 1ª Vara Criminal do Foro Regional do Partenon (ainda em andamento) contra cinco agentes penitenciários — entre ele Paranaguá Leal Rodrigues e Daniel Tadeu Medeiros Collar.
Na época, lotados no Instituto Penal Padre Pio Buck, na Capital, eles foram denunciados por soltar presos para cometer roubos, em troca de pagamento em dinheiro. Os cinco foram acusados de crimes como formação de quadrilha, falsidade ideológica, corrupção passiva e peculato, em parceria com os apenados e com uma advogada.
William era uma pessoa do bem e tinha descoberto crimes cometidos pelos colegas.
LÚCIA HELENA CALLEGARI
Promotora
Os documentos chegaram às mãos da promotora anexados a 20 CDs com centenas de horas de gravações de interceptações telefônicas, somando 39 volumes de papéis. Foi analisando grampos e depoimentos de pessoas ligadas a William que a promotora reuniu elementos para denunciar os quatro homens pela morte do agente penitenciário.
— William era uma pessoa do bem e tinha descoberto crimes cometidos pelos colegas — afirmou a promotora.
A denúncia do MP
Os argumentos baseados em depoimentos e escutas telefônicas:
— O agente penitenciário William Mansur Tadrous de Souza trabalhava no Instituto Penal Irmão Miguel Dario, na Capital, e fazia bico como segurança de uma empresa particular sob a coordenação de Paranaguá Leal Rodrigues e do segurança Luís Mario Rodrigues.
— William e colegas teriam descoberto o envolvimento de Paranaguá e os denunciados em roubos. Os dois colegas foram misteriosamente assaltados e William pagou com a vida.
— No dia do crime, 14 de junho de 2008, William deveria ir para casa pela manhã, após cumprir uma jornada de 24 horas no Instituto Miguel Dario. Mas teria sido convencido por Rodrigues a substituí-lo no posto de segurança particular por 12 horas. Para o MP, seria uma forma de monitorar os passos de William. Só eles saberiam a mudança da rotina da vítima naquele dia.
— Após William ser baleado e internado em estado grave, Paranaguá foi para o hospital e falou ao telefone com Rodrigues. Perguntado como estava a vítima, Paranaguá teria respondido: "está indo, está encaminhando... com morte cerebral".
— Sabendo que estava com telefone grampeado, Paranaguá evitaria falar sobre o motivo do crime pelo celular, mas simularia empenho para elucidação e levantaria desconfianças contra outros agentes para confundir a investigação e se eximir de suspeitas.
— Conversa interceptada entre dois agentes na qual eles afirmaria que Paranaguá é o autor do crime.
— Conversa entre Paranaguá e um ex-PM que admite ter matado duas pessoas. Paranaguá afirmaria que "tem umas caminhadas acontecendo e quero ver se tu me dá uma mão". O ex-PM teria respondido que sua função é apenas matar.
A vítima
— Nascido em Santa Vitória do Palmar, na fronteira com o Uruguai, William Mansur Tadrous de Souza, 39 anos, primogênito — e único filho homem — de um zelador de prédio e de uma dona de casa, vivia desde a infância na zona norte de Porto Alegre.
— Trabalhou desde os 16 anos em escritórios de empresa de material de construção, financeira e banco, até ingressar na Susepe, em 1993. Foi agente em cadeias e albergues em Caxias do Sul, Osório, Gravataí e Porto Alegre. Solteiro e sem filhos, vivia com os pais, mas tinha alugado um apartamento que pretendia comprar.
CONTRAPONTOS
O que diz o advogado Ricardo Breier, defensor de Luís Antônio Rodrigues Fernandes:
Ainda não posso me pronunciar sobre o caso porque tive acesso aos autos apenas no final da tarde desta sexta-feira. Vou analisar as provas colhidas pela investigação durante o final de semana.
O que diz o advogado dos demais acusados:
ZH tentou contato com o advogado, mas ele não atendeu aos telefonemas.