Solange Lompa Truda (*)
Iniciamos o mês de setembro com o compromisso de acender o sinal amarelo, para falarmos sobre o suicídio. A proposta desta campanha, que começou em 2015, é de conscientizar o maior número de pessoas sobre questões que envolvem o suicídio e os transtornos mentais, apresentando formas de prevenção.
Mesmo sendo profissional de saúde mental, acho bastante delicado falar em suicídio, ao mesmo tempo em que é preciso informar e debater cada vez mais estas questões, em nossos dias atuais. Afinal, não sei se é conhecido por todos, mas o Brasil tem registrado grande número de mortes por suicídio, principalmente entre os jovens. Os últimos dados globais compilados pela Organização Mundial da Saúde (OMS) dão conta de 800 mil mortes no ano: uma morte a cada hora.
Dados como esse tornam ainda mais importante e urgente nossa reflexão sobre o sofrimento e a dor que culminam com a retirada da própria vida.
Não podemos deixar de lembrar aqui o quanto também sofrem e se culpam amigos e familiares, que se perguntam como não perceberam que havia algo errado e se penalizam porque não fizeram nada para impedir.
Então, precisamos, sim, falar sobre prevenção de suicídio. Podemos começar transmitindo o quanto a vida das pessoas que sofrem com ideação suicida importam; e o quanto sabemos que essa dor tem cura e que vai passar, desde que possamos buscar ajuda; e olhar para este momento sem julgamentos, mas com muito acolhimento e escuta.
Não podemos deixar de lembrar aqui o quanto também sofrem e se culpam amigos e familiares, que se perguntam como não perceberam que havia algo errado e se penalizam porque não fizeram nada para impedir. É preciso falar sobre isso, porque o suicídio traz muito sofrimento psíquico a todos os envolvidos.
A pessoa com comportamento suicida reúne características específicas que dão pistas de que ela está prestes a se matar. Informar aos familiares e amigos para estarem atentos e não subestimarem o sofrimento da doença alheia é fundamental na prevenção. Temos que entender que nem todas as pessoas conseguem falar sobre seus sentimentos e de suas feridas, daí a importância de nos tornarmos mais sensíveis e aptos, para identificar se algo não está bem com essa pessoa. Entendo que não é uma tarefa fácil, mas é preciso olhar para isso seriamente, sem preconceito, buscando alternativas especializadas para que a saúde mental seja restabelecida, e o desejo de vida, resgatado.
O suicídio pode afetar pessoas de todas as faixas etárias, em qualquer momento do seu ciclo de vida, e sabemos o quanto é complexo e multifatorial. Envolve causas variadas e costuma estar relacionado a transtornos psíquicos de ansiedade, humor e personalidade, como a depressão, bipolaridade e abuso de drogas. Outros fatores, como dificuldades financeiras, perdas afetivas e conflitos familiares ou no trabalho, também podem gerar transtornos mentais, com sintomas depressivos e comportamentos suicidas, mas precisamos considerar a estrutura psíquica de cada pessoa, levando em conta seu repertório de vida.
Muitas vezes, a ideia do suicídio não é expressada de forma direta
Quero lembrar R.M.S. Cassorla, em seu livro Estudos sobre o Suicídio: Psicanálise e Saúde Mental, que nos diz: “O comportamento suicida inclui, sempre, um pedido de ajuda”. O suicídio é uma saída encontrada pelo indivíduo para lidar com sua dor intolerável, insuportável, e que, se for compartilhada, pode ser aliviada e prevenida. Em nossa experiência profissional, alguns pacientes mencionaram a ideia de suicidar-se. Muitas vezes, essa ideia não é exposta de forma direta. Na maioria das vezes, a ideia de suicidar-se é acompanhada de outros indícios do perigo. Algumas frases como: “O mundo não faz mais sentido”, “Antes eu sentia alegria, hoje não vejo mais propósito em nada”, “Eu queria poder dormir e nunca mais acordar”, “Eu queria sumir, não aguento mais viver desse jeito”. São falas que nos apontam a desesperança e angústia, como um fator de muita dor psíquica e risco preditivo, uma vez que o indivíduo busca na morte o alívio como única saída para fugir daquilo que lhe está angustiando.
Na verdade, a pessoa busca, de fato, matar a dor que sente, e não a si mesmo. Então, acredito que a prevenção inicia quando falamos sobre o assunto de maneira clara, verdadeira e honesta para aliviar a dor e abrir novos caminhos possíveis de ajuda.
As manifestações suicidas não podem ser tratadas como ameaças ou interpretadas como chantagens emocionais, porque elas são avisos de alerta para um risco real. E sabemos que toda prevenção passa pela educação, gerando novos comportamentos e mudanças de hábitos. Só encarando a necessidade de falar sem medos sobre o assunto e compartilhando informações conseguiremos alcançar resultados mais positivos.
Assim aconteceu, por exemplo, com doenças sexualmente transmissíveis e também com o câncer: a prevenção só se tornou bem sucedida quando passamos a conhecer e falar mais sobre o problema.
Com a prevenção do suicídio, não será diferente — e exigirá o esforço de todos: família, amigos, colegas de trabalho, educadores, profissionais de saúde e políticas de saúde pública, com estratégias capazes de englobar um trabalho a nível individual e social.
O suicídio pode (e deve) ser prevenido! E de setembro a setembro, ano após ano. Fica o convite e o desejo de que, neste 10 de setembro, que oficialmente é o Dia Mundial de Prevenção ao Suicídio, nossas reflexões contribuam para reconhecermos os sinais, oferecermos ajuda profissional, acreditarmos que a recuperação é possível, que a saúde mental é prioridade e, principalmente, que “a vida é a melhor escolha”.
(*) Psicóloga
Procure ajuda
Caso você esteja enfrentando alguma situação de sofrimento intenso ou pensando em cometer suicídio, pode buscar ajuda para superar este momento de dor. Lembre-se de que o desamparo e a desesperança são condições que podem ser modificadas e que outras pessoas já enfrentaram circunstâncias semelhantes.Se não estiver confortável em falar sobre o que sente com alguém de seu círculo próximo, o Centro de Valorização da Vida (CVV) presta serviço voluntário e gratuito de apoio emocional e prevenção do suicídio para todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo e anonimato.
O CVV (cvv.org.br) conta com mais de 4 mil voluntários e atende mais de 3 milhões de pessoas anualmente. O serviço funciona 24 horas por dia (inclusive aos feriados), pelo telefone 188, e também atende por e-mail, chat e pessoalmente. São mais de 120 postos de atendimento em todo o Brasil (confira os endereços neste link).
Você também pode buscar atendimento na Unidade Básica de Saúde mais próxima de sua casa, pelo Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), no telefone 192, ou em um dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) do Estado. A lista com os endereços dos CAPS do Rio Grande do Sul está neste link.