Páscoa tem a ver com vida nova, mudança, olhar para si e para o outro, enxergar-se no outro e enxergar o outro em si. É difícil, dá trabalho, exige uma sensibilidade e um posicionamento com os quais não estamos acostumados. E, como quase tudo aquilo que não é habitual, nos causa desconforto. Mas isso é apenas um sintoma de que algo dentro da gente está se desacomodando para que, logo adiante, acomode uma novidade.
Aproveitando todo o significado e apelo desta data, tenho me inquietado com alguns costumes que vamos adquirindo ao longo da vida sem nos questionarmos. Vamos vivendo dia após dia, repetindo ações e pensamentos de forma automática e, muitas vezes, sem sentido. Trabalhamos para adquirir mais do que o necessário, damos aos nossos filhos muito mais do que tivemos e mais do que eles precisam, perpetuamos a errônea ideia de que é preciso ter para ser e quase nunca nos damos conta de que, na maioria das vezes, o essencial não custa um centavo sequer.
De forma alguma é apologia à pobreza ou demagogia. Encarem como um convite para o autoquestionamento. Para pensarmos, por exemplo, no quanto de responsabilidade temos (ao sermos pais e mães) de criar uma vida (com todas as implicações econômicas, orgânicas, sociais e emocionais que isso tem) e, por meio dela, deixarmos nossa herança para o mundo. Porque é nossa responsabilidade criar estratégias para preparar as crianças para serem adultos seguros, lúcidos, sensíveis, solidários, altruístas, responsáveis, colaborativos e empáticos.
Se hoje vivemos em uma sociedade desigual, egoísta, superficial, onde as leis são subjetivas, onde vence quem tem mais poder (e isso geralmente é sinônimo de dinheiro), onde a máxima "cada um por si" impera, é porque algo lá atrás falhou. Todos esses adultos que hoje convivem conosco foram crianças um dia. E foi lá na infância que deixaram de aprender o que realmente faria a diferença em suas vidas.
Quem de nós já ensinou às crianças que agir implica responsabilidades; que ter sentimentos ruins não nos torna alguém desprezível, mas sim o que fazemos com esses sentimentos; que muitas coisas em nosso entorno muda quando modificamos a nós mesmos; que o outro sente exatamente como nós (o que às vezes muda é a forma com que ele expressa isso); que absolutamente tudo o que fazemos terá consequências; que jamais podemos tentar mudar o outro; que quando alguém nos exige mudança, precisamos nos perguntar se isso é realmente o que desejamos; que opiniões são muito pessoais e por isso precisam ser respeitadas; que qualquer coisa que custe a nossa paz é cara demais; que a decepção nada tem a ver com o outro, mas com a nossa expectativa exagerada sobre ele; que nem sempre as pessoas vão gostar da gente e que isso não deve ser um problema; que se alguém não corresponde às nossas exigências, não significa que não esteja dando o melhor que pode; que silenciar é preciso; que reagir, na maioria das vezes, é uma péssima decisão; que se colocar no lugar do outro é a solução para quase todos os males do mundo? Não se faz uma sociedade diferente repetindo erros. Portanto, renovemo-nos!