Há alguns anos, venho percebendo que vivemos uma era de descartes rápidos. Podemos observar isso nas fraldas, nos pratos e talheres, nas compras desenfreadas e nos relacionamentos. Isso me causa certo incômodo e me faz refletir sobre até quando iremos buscar algo sem nos darmos conta de que, talvez, aquilo que buscamos esteja muito mais perto do que imaginamos. Que a fórmula mágica pela qual corremos atrás, numa tentativa louca e sem sucesso, pode estar no simples ato de tirarmos a venda imaginária dos nossos olhos e enxergarmos o que há a nossa volta.
Lembro que, quando fazia faculdade, o mais comentado em sala de aula era a "atrocidade" materna de colocar seu rebento em um andador – uma espécie de cadeirinha com rodas com a qual a criança podia para zanzar pela casa sem precisar de auxílio. Ficava pensando que talvez fosse mais legal mesmo que os pais tivessem tempo e vontade suficientes para estimular seus filhotes a andarem, mas que talvez isso não fosse possível em tempo integral e que seria bem bom se eles não fossem condenados à guilhotina se vez ou outra fizessem uso do tal andador.
Esse foi apenas um exemplo bobo de coisas execradas pela humanidade após terem sido utilizadas em algum momento. Posso citar alguns bem modernos, como televisão, computador, celular, tablet. Ainda utilizamos, mas falta muito pouco para algum pseudovanguardista queimá-los em praça pública. Só que o descarte não para neles. Temos descartado saberes.
Há poucos dias, estava em uma reunião de educadores e me surpreendi quando vários deles ironizavam o uso da lousa para passar atividades aos educandos, ou gargalhavam quando se falava em registrar algo em cadernos, ou ainda debochavam da existência de tarefas para casa. Ressalto que eu estava em meio a educadores, pessoas que deveriam fazer uso de bom senso na compreensão de que nada é totalmente descartável. Se houver um pouco de vontade e o mínimo de sensibilidade, duvido que alguém não encontre algo bom nas práticas que já foram utilizadas. Tudo o que fazemos pode ser visto por meio de diferentes prismas – desde que aceitemos nos despir de preconceitos – e eles passam pela dualidade do bom e do mau.
Sim, entendo e estimulo a reflexão contínua acerca do que vivemos. Além disso, acredito piamente que qualquer coisa pode ser aperfeiçoada – de objetos a relacionamentos, passando por saberes –, mas aperfeiçoar significa fazer uso do que foi para construir algo melhor e mais eficiente.
É isso que desejo às crianças, às famílias, à humanidade: que aprendamos a ver o que existe, sem desmerecê-lo. Podemos criar sem jogar no lixo o que já foi importante em algum momento. Isso é capacidade de percepção e inteligência emocional – que certamente será o "carro chefe" da educação de ponta, num futuro bem próximo, sem que precisemos inutilizar o que foi usado no passado.