O maior surto de febre amarela desde que começaram os registros do Ministério da Saúde, há 37 anos, acendeu o alerta em secretarias da saúde de todo o país. Foram 79 mortes confirmadas desde o início de dezembro, com 1.214 casos notificados e 234 confirmados em cinco Estados – média de cinco novos pacientes e quase duas mortes por dia no país em janeiro. Mesmo sem registros de febre amarela desde 2009, o Rio Grande do Sul está em alerta devido ao grande número de casos suspeitos da doença no país.
Como a enfermidade não é contagiosa, ou seja, não há transmissão de pessoa para pessoa – somente pela picada de mosquitos infectados –, o risco não é de a doença se espalhar para o Sul, mas de algum paciente infectado viajar para outro Estado ou de uma pessoa contaminada em uma das áreas afetadas servir como "hospedeira" do vírus em uma nova região.
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Especialistas atentam para a importância de vacinar pessoas que vivem, trabalham ou estão viajando para áreas de risco. Os mais vulneráveis são residentes em zonas rurais e silvestres, especialmente aqueles que não se deslocam até as cidades para tomar a vacina.
– Estamos vacinando as populações mais expostas e orientando os médicos a notificarem casos suspeitos. O trabalho nunca para, mas está reforçado diante dos casos no Sudeste – diz Marilina Bercini, diretora do Centro Estadual de Vigilância em Saúde (CEVS) da Secretaria Estadual de Saúde.
Marilina lembra que o Rio Grande do Sul passou por situação semelhante à de alguns desses Estados há nove anos, quando registrou 21 casos da doença e nove mortes. Em 2017, o surto no país provocou uma corrida pela vacina: em Porto Alegre, o número de doses aplicadas em janeiro, conforme dados ainda parciais, aumentou oito vezes na comparação com o mesmo período do ano passado.
Segundo o Ministério da Saúde, não há necessidade de corrida aos postos de saúde, pois as doses são suficientes para atender às regiões com recomendação de vacinação.
No país, a maioria das mortes ocorreu em Minas Gerais, epicentro do surto, onde 69 pessoas morreram da doença, conforme boletim do Ministério da Saúde. Também na região Sudeste, o Espírito Santo – considerado fora da região de risco – registrou sete mortes por febre amarela, e São Paulo, três. Antes do surto atual, os 85 casos e 40 mortes registradas no ano 2000 lideravam os registros do governo. Em 2016, sete pessoas foram infectadas e cinco morreram.
Os casos confirmados até agora no Brasil são de febre amarela do tipo silvestre, transmitida para os humanos após uma epidemia em macacos – a transmissão do vírus se dá pelos mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes. A doença está nas regiões rurais, silvestres e de mata. Se já não estiverem imunizadas, pessoas que moram nesses locais ou vão viajar a algum lugar de risco devem ir a uma unidade de saúde e receber uma dose da vacina, distribuída de graça. A maioria dos infectados são homens com idades entre 40 e 60 anos que trabalham em áreas rurais, de acordo com um perfil elaborado pelo Ministério da Saúde.
Por enquanto, as secretarias de saúde dos Estados e o Ministério da Saúde dizem que não há registros da doença em zonas urbanas. Mas o que assusta os profissionais da saúde é justamente o risco de a doença "de ciclo urbano" voltar a ser registrada, saindo das áreas rurais, onde os doentes estão concentrados até agora, para chegar às cidades, e então ser transmitida para humanos pelo mosquito Aedes aegypti. Essa versão urbana não é detectada no país desde 1942, mas há o risco de reaparecer.
– Pode acontecer se não houver medidas de controle – diz o infectologista Claudio Stadnik, da Santa Casa de Misericórdia da Capital.
Segundo Stadnik, a doença urbana aconteceria se uma pessoa infectada em área rural viajasse a uma cidade e ali fosse também picada pelo Aedes aegypti (transmissor, ainda, da dengue, zika e chikungunya). O mosquito poderia transmitir a doença no centro urbano, provocando uma situação sanitária de difícil controle.
Já para a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), que bateu o recorde de produção de vacinas contra a febre amarela conta do surto, a doença será contida porque a chance de ela se propagar seria pequena.