Logo após a data do Dia das Crianças, comemoro o meu aniversário de casamento. Para celebrar, meu marido e eu sempre procuramos fazer uma curta viagem. Ano passado, passamos três dias em Belém do Pará onde, por um acaso do destino, participei de um evento religioso único no calendário brasileiro: o Círio das Crianças. A energia foi tão grande que fiz uma promessa: ano que vem, perto do dia 12 de outubro, vou contar sobre essa experiência na minha coluna.
Para quem não sabe (eu não tinha nem ideia!), o Círio de Nazaré é uma das maiores manifestações religiosas do mundo. Trata-se de um evento católico que, no Pará, é mais festejado do que o Natal. Acontece há mais de dois séculos e leva cerca de 2 milhões de romeiros em uma caminhada de fé em homenagem à Nossa Senhora de Nazaré, mãe de Jesus. O último cortejo, e de menor percurso, é o das crianças que ocorre em um domingo de outubro encerrando a festa.
Quero deixar claro que não fomos a Belém para rezar.
Fomos para cometer o pecado da luxúria e o da gula. Nos nossos planos estavam namorar em um bom hotel e, de quebra, conhecer a envolvente cozinha amazônica, tão brasileira, tão genuína. Provamos maniçoba, peixe filhote, castanha, açaí com farinha e peixe, pato no tucupi, tacacá, jambu, pirarucu e nos declaramos apaixonados tanto pelo suco de cupuaçu quanto pelo sorvete da Cairu. Percorremos com uma guia o Mercado Ver-O-Peso e alguns pontos turísticos da capital do Pará como o Theatro da Paz, símbolo da riqueza dos tempos do Ciclo da Borracha. Almoçamos no restaurante do celebrado chef paraense Thiago Castanho e fomos apreciar o pôr do sol onde casais namoram ao entardecer: na Estação das Docas, invejável porto revitalizado (olha mais um pecado aí!) como Porto Alegre um dia sonhou e nunca realizou.
E estava tudo tão bom na viagem que resolvemos compensar tantos pecados prestigiando, na manhã de domingo, o Círio das Crianças na suntuosa Basílica de Nazaré, erguida no local onde foi encontrada a imagem de Nossa Senhora que deu origem à romaria. Meu marido foi à missa. Eu, curiosa, resolvi seguir o cortejo.
Havia inúmeros balões colorindo o céu, uma festa alegre e repleta de simbologias. No entanto, o que mais chamou a minha atenção naquela multidão de pequenos peregrinos foi a imensidão branca. Crianças de todas as idades se vestem de anjo, usando trajes brancos com asas e auréola. Pais e avós carregam seus filhos nos braços, inclusive os recém-nascidos. Uma cena tão doce, simples e sensível que acabei percorrendo toda a caminhada de quase três quilômetros ora hipnotizada, ora às lágrimas.
Impossível ficar incólume a essa corrente de amor. Não é apenas uma demonstração de fé ou pagamento de promessa. É, também, uma caminhada de devoção aos filhos. Ser mãe ou pai, independentemente de qual seja a sua religião, é se sentir agradecido e abençoado pelos anjos que nos cercam diariamente. Não é à toa que o tempo passa voando ao lado deles. Bora aproveitar intensamente o fim de semana e o feriado de Nossa Senhora Aparecida.