Aquela sensação que carregar uma criança pequena no colo traz – de proximidade, afeto, carinho e preocupação – costuma perder espaço conforme ela cresce, aprende a andar e a falar. Mas retomar, de uma forma parecida, essa iniciativa ao longo do desenvolvimento infantil pode melhorar a relação entre pais e filhos e trazer muitos benefícios para a criança no futuro.
É esse o objetivo de uma técnica que orienta os pais a se abaixarem sempre que têm uma conversa a travar com o filho. Conhecida por nomes variados, como escuta ativa, empática ou compassiva, a ideia prega o conceito de que se aproximar dos pequenos e, mais que apenas ouvi-los, realmente escutá-los, faz com eles sintam-se mais queridos e, principalmente, mais seguros.
Para pedagogos, psicólogos e psicoterapeutas que estudam a infância, o método traz diversos benefícios, como evitar que o adulto seja visto apenas como uma figura autoritária e, a criança, como alguém a ser tão somente moldado, sem oportunidades para se fazer ouvir.
– O adulto, quando se coloca no nível da criança, torna-se uma figura mais clara, mais afetiva, menos ameaçadora. Isso é importante porque todo o desenvolvimento da criança gira em torno da confiança – explica Hericka Zogbi, coordenadora do curso de Psicologia no UniRitter.
A influência da atitude pode ser facilmente verificada no comportamento. Se o pai quer dar uma ordem para a criança que jogou um brinquedo no chão, tem diferença gritar a ordem lá da cozinha ou ir até ela, abaixar-se e pedir que junte o brinquedo. O efeito tende a ser outro porque o adulto, quando se abaixa, faz um investimento: demonstra que o filho é importante, que quer entendê-lo – ainda que seja para dar uma reprimenda. Isso é percebido pelos pequenos, e a consequência é que a criança se sente mais confiante, não só no trato com os pais, mas também consigo mesma.
– Uma criança não precisa de grandes presentes, de fotos no Facebook. Precisa dessa comunicação muito clara e transparente por parte daqueles que cuidam. É isso que vai fazer dela um adulto mais seguro, mais capaz – conclui a psicóloga.
Não basta se abaixar
Para que tenham o efeito desejado, os pais devem entender que não basta simplesmente ficar na altura da criança.
É preciso olhar nos olhos, ouvir o que ela tem a dizer, responder às dúvidas com atenção, passar as instruções em uma linguagem acessível. Mais que uma técnica, a escuta ativa deve se tornar um hábito.
E isso serve para todos os momentos, desde os de brincadeira até aqueles em que é preciso engrossar a voz. Afinal, o pai não é só um amigo com quem possa se divertir e compartilhar os temores. É também alguém que a criança precisa, ao longo do mesmo processo, aprender a ouvir, respeitar e obedecer.
– Os pais precisam ter uma regularidade, é desejável que mantenham uma coerência. Até porque a criança adora rotinas, isso organiza o mundo dela. Se a forma de escutá-la variar muito de acordo com a situação, isso vai acabar deixando a criança mais insegura – define a psicanalista e professora da Feevale Marianne Stolzmann Mendes Ribeiro.
Escutar é também entender o que a criança sente, e não só o que diz. Passa por transmitir serenidade para que ela possa descrever o que sente, mas abrindo espaço também para que o adulto perceba quando o filho está escondendo algo.
Abaixar-se, manter contato visual e ouvidos abertos é muito diferente de outra forma de escuta, a seletiva, tão frequente no trato com as crianças – e mesmo entre adultos –, em que apenas o que é interessante ao interlocutor acaba sendo absorvido. Ao tratar os filhos de maneira mais próxima, os pais também passam a lição de que é dessa maneira, com preocupação e atenção, que elas devem tratar as pessoas com quem se importam ao longo da vida.
Como fazer
Os pais devem se colocar na altura dos filhos pequenos quando lhes fizerem uma pergunta ou tiverem que responder algo. Não basta estabelecer contato visual: é preciso estar atento e escutar o que a criança diz e se mostrar disposto a entendê-la.
Quando fazer
Se a família decide aplicar a técnica, deve adotar a mesma postura sempre, seja dando uma lição de moral ou tentando explicar por que o céu é azul. Vale se abaixar para brincar e para abraçar tanto quanto para chamar atenção da criança ou colocá-la de castigo.
Para que serve
Os pais aprendem a escutar melhor os filhos, criando um vínculo de confiança capaz de fazê-los entender melhor por que os pequenos estão chorando ou fazendo birra, por exemplo. Serve também para que o adulto não se dirija ao filho em uma posição superior, evitando se estabelecer como uma figura autoritária.
Técnica real
Pais famosos optaram por aplicar a técnica da escuta ativa na criação dos filhos. Entre eles, está o príncipe William, da Inglaterra: em boa parte dos eventos de que participa com a família real, ele aparece de cócoras quando está falando com seu filho, o príncipe George, de três anos. Uma das últimas vezes em que se abaixou em público lhe rendeu uma puxada de orelha da avó, a rainha Elizabeth II. Em junho, durante desfile da Força Aérea Real britânica, a monarca disparou ao único membro da família real que não estava em pé: “Stand up, William” (Fique de pé, William), pouco se importando com a escuta ativa do príncipe.