A possível relação do zika vírus com a síndrome de Guillain-Barré, uma rara doença neurológica, está preocupando autoridades de saúde. A síndrome atinge o sistema nervoso, provocando febre, dificuldade de respirar, dores e dormência - em casos mais graves, pode causar paralisia e levar à morte. Provocada, na maior parte dos casos, por infecções virais, a síndrome parece estar se tornando mais frequente no Brasil em meio às doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti.
A associação entre o zika e distúrbios neurológicos está entre os motivos para a Organização Mundial da Saúde (OMS) ter decretado estado de emergência internacional no dia 1º. A organização pediu aos países afetados pelo surto que organizem sistemas de vigilância para detectar e combater o aumento incomum dos casos.
Pelo menos seis Estados (Pernambuco, Piauí, Sergipe, Rio Grande do Norte, Maranhão e Bahia), segundo levantamento do G1, contabilizaram elevação significativa da síndrome em 2015, mas, como a Guillain-Barré não é uma doença de notificação compulsória no Brasil, não há dados oficiais.
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No Rio de Janeiro, dois jovens estão internados em estado grave no Hospital Universitário Antônio Pedro, da Universidade Federal Fluminense (UFF), em Niterói, após desenvolver uma forma severa da síndrome. Em janeiro, o hospital atendeu outros 10 casos menos graves. Neste ano, foram 16 pacientes com Guillain-Barré. A média era de cinco casos por ano.
Conforme o neurologista Osvaldo Nascimento, que supervisiona os atendimentos no hospital, todos os pacientes tiveram zika. Duas semanas depois de serem infectados, eles teriam começado a apresentar sintomas de comprometimento do sistema nervoso.
- Há uma diferença entre os pacientes que atendemos após a infecção pelo vírus e aqueles afetados pelo Guillain-Barré clássico: temos observado mais alterações no sistema nervoso central, e os efeitos são mais agressivos. É o que nos parece nesses casos, todos aparentemente associados ao zika - afirma o neurologista, que é professor na UFF.
Nascimento explica que os casos de Guillain-Barré costumam atingir de um a quatro por 100 mil pessoas. O aumento nesse número, avalia, pode estar associado à epidemia de zika. Segundo o professor, médicos de outros hospitais do Rio de Janeiro também estão relatando aumento no número de casos de Guillain-Barré.
Para o infectologista Alexandre Schwarzbold, professor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), ainda não há informações suficientes para deixar evidente a relação entre a síndrome e o zika, mas o aumento de casos registrados em alguns Estados causa preocupação. A síndrome não distingue entre crianças, grávidas, idosos: pode afetar qualquer um, em maior ou menor grau.
- Ainda é preciso, assim como na microcefalia, deixar claro se há uma relação de causa e efeito com o zika. Isso é necessário até para separar os casos e sabermos quais foram causados dentro do esperado e quais foram motivados pelo vírus - diz Schwarzbold, que também é membro da Sociedade Brasileira de Infectologia.
Segundo os especialistas, a síndrome começa após uma infecção e se manifesta por dormência e fraqueza das pernas, que vai subindo e pode até chegar à cabeça. Uma das dificuldades em se diagnosticar rapidamente a Guillain-Barré - e comprovar sua associação com o vírus - é o fato dela aparecer até 20 dias após o episódio de zika.
Histórico
- Em janeiro, a Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), órgão ligado à Organização Mundial da Saúde (OMS), emitiu alerta epidemiológico devido ao aumento de ocorrência de síndrome de Guillain-Barré em áreas onde circula o vírus zika. Segundo a Opas, em julho do ano passado, pelo menos 26 pacientes com histórico de sintomas compatíveis com a infecção por zika tiveram diagnóstico de Guillain Barré na Bahia.
- No Brasil, o surto de zika coincidiu com o aumento do registro de síndromes neurológicas, principalmente no Nordeste. Segundo a Organização Panamericana de Saúde, até julho de 2015 foram registrados 76 casos - 42 de Guillain-Barré. Segundo a OMS, situações semelhantes em outros países das américas estão em investigação.
- Na Polinésia Francesa, onde houve surto de zika entre 2013 e 2014, 74 pacientes apresentaram síndromes neurológicas ou autoimunes logo após terem manifestado sintomas compatíveis com a infecção pelo vírus. Desses, 42 foram classificados como Guillain-Barré. Em El Salvador, também houve um aumento incomum de casos recentemente. Entre 1º de dezembro de 2015 e 6 de janeiro de 2016, foram registrados 46 casos da síndrome, quando antes o país tinha média de 14 casos por mês.
* Zero Hora, com agências