Deixar o sedentarismo de lado, ganhar saúde, melhorar o condicionamento físico e, quem sabe, até perder uns quilinhos. Tudo isso em menos de 10 minutos de esforço empenhado durante alguns dias da semana. Parece milagre? Pois é o que promete uma tendência que tem ganhado academias mundo afora: os treinos muito curtos e, em compensação, muito intensos.
A proposta encontra alguns respaldos científicos, apesar de ainda causar divergência entre os especialistas. Um exemplo é o estudo do Human Performance Institut, de Orlando, nos Estados Unidos. Publicado em 2013 na revista científica Health & Fitness Journal, do American College of Sports Medicine, o artigo teve grande repercussão. O trabalho propõe um programa com média de sete minutos de duração, que pode ser repetido duas ou três vezes ao dia.
A ideia de Brett Klika e Chris Jordan, autores do estudo, é mesclar exercícios aeróbios e de resistência – usando apenas o peso do corpo – em um curto intervalo de tempo e com recuperação mínima. No programa, é sugerido um circuito com 12 atividades – que vão dos tradicionais polichinelo e apoio até agachamento e pranchas que trabalham todo o core (músculos que formam o centro de força do corpo, como os abdominais e os lombares) – que devem ser realizadas em 30 segundos com descanso de 10 entre elas, totalizando pouco mais de sete minutos.
"Esse tipo de programa oferece uma boa opção para ajudar pessoas ocupadas a melhorar sua saúde. A praticidade e acessibilidade torna esse programa uma opção viável para as massas", defendem os especialistas no artigo.
A publicação do estudo gerou uma série de aplicativos para celular baseados no treinamento. Além de mostrar os exercícios, os apps trazem um cronômetro que indica o tempo que se deve ficar em cada um deles, facilitando a prática.
Divulgada em junho do ano passado, uma pesquisa do Ministério do Esporte apontou que 45,9% dos brasileiros são sedentários. Para 27,2% deles, a falta de tempo é o principal motivo para não se exercitar. De olho nesse "efeito colateral" da rotina corrida, pesquisadores apostam suas fichas em estudos para reduzir o tempo das pessoas dentro das academias sem ocasionar prejuízo nos resultados.
Mas a ideia não é exatamente nova. Em 1996, o japonês Izumi Tabata testou um protocolo de quatro minutos em bicicletas estacionárias. No estudo, eram feitos 20 segundos em intensidade máxima, com intervalos de 10 segundos. A série era repetida oito vezes.
– Quatro minutos de exercícios já foram capazes de melhorar o sistema cardiovascular e alterar as enzimas responsáveis pela redução de gordura tanto quanto em exercícios de alta duração – explica o profissional de Educação Física Vinícius Possebon.
Possebon conquistou mais de 35 mil alunos em todo o Brasil com uma proposta de treino curto e intenso. Criador de um programa chamado Queima de 48 Horas, o gaúcho oferece aulas online com duração de cinco a 15 minutos – que devem se realizadas de três a cinco vezes por semana, de acordo com as condições físicas do aluno. Com base na modalidade High Intensity Interval Training (HIIT), ou Treinamento Intervalado de Alta Intensidade, na tradução livre, a promessa do preparador físico é mobilizar o organismo para que ele utilize a gordura acumulada como fonte de energia por até 48 horas depois do fim do treino, podendo aumentar esse tempo no caso de sedentários.
– Quando fiz uma revisão de artigos científicos para o meu trabalho de conclusão na faculdade, descobri que o exercício aeróbio de longa duração, realizado normalmente em 40 a 60 minutos com uma frequência cardíaca de 60% a 80% do máximo, não era nem de longe a melhor maneira de emagrecer. Muitos estudos comparavam grupos que faziam este tipo de exercício e dieta com outro que só fazia dieta. As pesquisas mostraram que as pessoas que realizaram somente a dieta emagreceram tanto quanto aquelas que também fizeram atividades. O que isso quer dizer? Que o efeito potencializador do exercício aeróbio não é comprovado fisiologicamente – argumenta.
Risco de lesão pode aumentar
Apesar de tentadora, a ideia de apostar em quatro, 10 ou 20 minutos de atividades três vezes por semana não parece a melhor saída para o coordenador do curso de especialização em Fisiologia do Exercício Aplicada à Atividade Física da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Christiano Francisco dos Santos. Para ele, treinos de curta duração são menos eficientes.
– Em cinco minutos, a pessoa não consegue nem aquecer as articulações. Nunca li um trabalho que diga que, em menos de 30 minutos de exercício resistido, o EPOC seja maior que em práticas de 40 minutos. Isso é extremamente agressivo. Cada vez mais as pessoas querem fazer menos e ter resultados maiores e mais rápidos. Desta forma, estou vendo um aumento no número de lesões. A intensidade cobra um preço do teu corpo – alerta.
Para Possebon, mesmo usando protocolos de apenas quatro minutos, uma pessoa já consegue obter melhora nos indicadores cardiovasculares em três semanas. O coordenador fitness da academia BodyTech de Porto Alegre, Diego Rouxinol, também considera quatro minutos tempo suficiente para tirar o rótulo de sedentário de um indivíduo, mas ressalta que é preciso seguir corretamente os programas:
– Se seguir corretamente, o que não é fácil, pois é extenuante, e fazer dieta, até é possível emagrecer.
Ajuda a emagrecer?
Praticar somente quatro minutos de atividades três vezes na semana vai contra a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS), que indica realizar 150 minutos de exercícios semanalmente para obter resultados de saúde expressivos como melhora de perfil de colesterol, redução de diabetes e hipertensão e prevenção de doenças cardiovasculares.
– A recomendação continua sendo de pelo menos 30 minutos de uma atividade aeróbica realizada de cinco a sete dias por semana. O que quebrou o paradigma nos últimos tempos é que esse exercício, que achávamos que deveria ser continuado, pode, eventualmente, ser trocado por períodos menores de oito a 10 minutos, de três a quatro vezes por dia – pondera a chefe do Serviço de Cardiologia do Hospital Moinhos de Vento, Carisi Anne Polanczyk.
Outro ponto controverso em relação aos exercícios curtos e intensos é se eles seriam capazes de ajudar na perda de peso. As pesquisas realizadas até então comprovaram que esse tipo de treino traz benefícios para o sistema cardiorrespiratório, mas ainda não há conclusões sobre sua eficácia quando o assunto é a balança.
– Na minha opinião, seria muito precipitado prescrever um treino de alta intensidade em um período tão curto (referindo-se a um treino de quatro minutos) para uma pessoa que quer emagrecer. O que os grandes estudos comprovam é que a dieta é a principal intervenção para a perda de peso. Algumas pesquisas vêm sugerindo que o treinamento de alta intensidade promove adaptações no corpo não só durante o exercício, mas após seu término, o que poderia proporcionar o emagrecimento mesmo sem fazer dieta. No entanto, elas são poucas e sem uma grande amostra. Não é algo muito consistente e precisa ser mais testado. O que acontece é melhora na saúde cardiovascular, o que diminui os fatores de risco e o risco de morte por doenças desse gênero – avalia.
Realizados em grande parte das vezes utilizando somente o peso corporal, outro ponto a ser considerado por quem pretende investir na prática é que, apesar de melhorar o tônus muscular, sozinha a prática não é capaz de promover a hipertrofia, ou aumento no tamanho dos músculos – sendo necessário recorrer a um treino clássico de musculação para obter esse tipo de resultado.
Cabe na agenda
Apontadas como tendência entre os profissionais de Educação Física, estas práticas curtas e intensas ganham ainda mais espaço nas academias, apesar de muitas delas poderem ser feitas em casa. Em Porto Alegre, a academia BodyTech oferece duas modalidades que cumprem estes requisitos. Uma delas é a 20 Minutes Workout, que, como o próprio nome diz, dura 20 minutos e é dividida em quatro blocos que variam os estímulos de 50 ou 30 segundos. Praticante da aula desde novembro passado, a advogada Clarice Ferreira, de 53 anos, é só elogios à atividade:
– Ela não é monótona e tem resultado rápido. Quando a gente pensa que vai entrar em óbito, acabou a aula – diverte-se.
Desde que passou a frequentar as aulas, Clarice percebeu uma melhora na flexibilidade, na agilidade e no condicionamento físico.
– Isso te traz um gás para o dia inteiro. A gente sobe escada, caminha e cansa menos – garante.
*Zero Hora