"Vamos comer churros dos uruguaios?". E não tinha sono invencível diante do convite da mãe quando ela sussurrava ao meu ouvido para me arrancar da cama rumo à Redenção. Não chamávamos assim porque era feito de doce de leite dos vizinhos, mas porque realmente era vendido em um trailer de uma família de uruguaios - quando ainda não se chamava food truck. Aliás, quem sabe onde andariam eles?
Minha mãe, que tem os mesmos 80 anos que a Redenção completa hoje, nos fez herdar - eu e meus sete irmãos - a mesma paixão pelo parque. Foi ali que, nos anos 1940, ela atropelou uma criança menor que ela e não conseguiu mais subir numa bike, mas fazia questão de nos levar para andar naquelas magrelas antigas e enferrujadas que havia para alugar no espaço onde depois se instalou o Café do Lago. Mas antes de sair pedalando, disputava-se um espaço no cercado para jogar pão ou pipoca e ver aquele peixe enorme subir à superfície. Não fosse aquela fome de piranhas que eles apresentavam, eu desconfiaria que eram, isso sim, tratados a pipoca de Toddy, tal o tamanho daqueles bichos.
Tinha também os macacos. Minha mãe até hoje deve achar que eu gostava daquela parte. A verdade é que, na minha cabeça de criança, eu pensava que ninguém dava banho neles. E trancava o nariz nessa parte da "aventura".
O Araújo Vianna não era cercado, e uma das diversões minhas e do meu irmão Luciano era rolar grama abaixo, do topo até embaixo, várias vezes. Até embrulhar o churros.
Com aquele bando de cria da dona Marly e do seu João, nem sempre tinha dinheiro para todo mundo andar no trenzinho, então, era tipo o PASSEIO MAIS ESPERADO DE TODOS OS TEMPOS. E assim que é bom, né? Pedalinho, então... Para esse, elaborei um plano: aos cinco anos, pintei várias folhas em branco de aquarela e vendi na vizinhança. Da minha grana de artista (eufemismo para cara de pau que enfiou aqueles rabiscos goela abaixo das tias mais queridas da rua), fiz meu pai cansar as pernas de jogador de fim de semana em um daqueles barquinhos.
Falar nisso, é de uma das partidas de futebol de Johny a minha primeira lembrança do Ramiro Souto. Porque eu sempre andava atrás do pai, e uma criança de três anos perto da goleira não dá certo, né?
A bolada que me derrubou feito boliche não me afastou do Ramiro Souto. É meu lugar preferido para os treinos de tiro em velocidade. Minha história com o esporte e as corridas tem muito a ver com aquelas pistas e todo o entorno do parque. Antes da facilidade do GPS e dos aplicativos, eram aqueles 2,5 km da volta completa da Redenção que me davam a dimensão do esforço.
Hoje, muita coisa é só memória (dizem que o trenzinho vem de novo aí!). Outras tantas, só desejo: um parque mais seguro, mais iluminado, melhor aproveitado e cuidado. Para quando eu também tiver 80 anos, saber que as lembranças se multiplicaram por aí.